A decisão do Copom de manter a Selic em 15% ao ano já era amplamente esperada por gestores e estrategistas. Mais do que o nível atual da taxa, o que pesa nas decisões de alocação é o recado do Banco Central de que os juros devem permanecer elevados por um período prolongado.

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Nesse cenário, o consenso entre os especialistas é de cautela. A renda fixa segue dominante nas carteiras, enquanto ativos de mais risco só devem voltar a ganhar mais espaço na alocação quando houver sinais mais claros de queda na inflação e na taxa longa de juros.

Gustavo Harada, head de alocação da Blackbird, diz que não fez mudanças estruturais na composição dos portfólios dos clientes nesse momento. “Já esperávamos a manutenção da Selic. O comunicado indica um cenário de bastante cautela, por conta da incerteza nas tarifas e no cenário local. Com isso, a gente manteve a mesma estrutura e mesmo percentual de alocação”, diz.

Na mesma linha, Rafael Espinoso, estrategista da Tivio, lembra que o primeiro semestre foi de poucas alterações. “Com a taxa em alta, é natural manter posições mais conservadoras. A renda fixa tem sido a preferência. Reduzimos a parcela no crédito privado desde o ano passado, por conta da redução dos spreads e do impacto dos juros altos na saúde financeira das empresas”, explica.

“A manutenção da taxa de juros em 15% pelo Copom tende a provocar poucos ajustes na alocação dos grandes investidores”, sinaliza Marcel Andrade, head de Investments Solutions da SulAmérica Investimentos. Além de a decisão não ter surpreendido, ele lembra que “ainda se trata de uma taxa nominal bastante elevada, acompanhada de um juro real igualmente alto. Estamos falando de uma Selic a 15% com uma inflação em torno de 5,20%, o que representa quase 10% de juro real”.

Selic em alta, renda fixa no centro

Tanto para a Blackbird quanto para a Tivio, os ativos atrelados ao CDI são os de maior peso na alocação dos perfis mais conservadores. A diversificação de indexadores, no entanto, ainda é tida como importante.

Para a Blackbird, a ordem de preferência é por títulos pós-fixados, seguidos pelos indexados à inflação e, por fim, os prefixados. Nos perfis moderado e agressivo, há uma migração gradual para papéis ligados à inflação, especialmente.

Espinoso, da Tivio, chama a atenção também para os prazos. “Estamos com alocação neutra em todas as classes. A única em que estamos ‘over’ [sobrealocados] é em títulos atrelados à inflação de 5 até no máximo 7 anos”, diz.

Já nos prefixados, a preferência é pelos títulos de vencimento mais curto. “O prefixado de até dois anos é mais ligado à política monetária, pode capturar o início da queda da Selic. Já a parte longa é muito influenciada pelo fiscal, e aí o cenário continua desafiador.”

Ambos também evitam papéis longos com marcação a mercado. “Mesmo para quem investe em crédito privado ou Tesouro IPCA+ de prazos maiores, não vejo oportunidade de saída rápida no curto prazo. Estamos olhando para um horizonte de dois a três anos”, diz Harada.

“Os títulos indexados à inflação, como as NTN-Bs (Tesouro IPCA+), já apresentam taxas bastante atrativas, com remunerações de IPCA mais 7,5% ou mais em prazos de 10 a 15 anos. Para o investidor com perfil de longo prazo, que pode carregar o papel até o vencimento e não se preocupa com a volatilidade da marcação a mercado, essa é uma oportunidade interessante”, diz Andrade, da SulAmérica.

Bolsa precisa de gatilho

Na renda variável, os dois especialistas veem descontos relevantes na bolsa brasileira, mas acreditam que o momento ainda não é o ideal para ampliar posições. Apesar dos “múltiplos baixos, descrédito e subalocação de investidores locais e estrangeiros”, Espinoso diz preferir esperar uma redução nas taxas longas de juros, o que para ele pode ser um gatilho para uma valorização mais contundente das ações.

Já a Blackbird mantém posições defensivas, com preferência por setores como bancos, saneamento e seguradoras. “O P/L [indicador preço / lucro] da bolsa brasileira está abaixo da média histórica. A bolsa local está mais descontada, com oportunidade de ganho mais expressivo”, diz Harada.