A Caixa ameaça reduzir o crédito para habitação e infraestrutura, caso o Tribunal de Contas da União (TCU) não dê sua bênção para a operação que pretende reforçar o capital do banco com R$ 15 bilhões do FGTS. Enquanto espera a resposta positiva do Tribunal em fevereiro, o presidente da Caixa, Gilberto Occhi, diz que a transação será lucrativa para o cotista do FGTS que receberá mais juros. Sobre a saúde financeira da instituição, diz que o banco está sólido. “Essa empresa é uma monstruosidade de segurança, é indestrutível”. A seguir, trechos da entrevista.

A Caixa está em meio a uma grande polêmica sobre a necessidade de capital. Qual é o tamanho dessa necessidade?

Eu sempre afirmei que a Caixa não precisaria de capital em 2016, 2017 e 2018. Em 2019, temos mais um degrau de Basileia (regra internacional que exige mais capital dos bancos) e estamos trabalhando. Usamos como cenário o déficit fiscal em 2018 e talvez 2019, o que exige melhorar a eficiência, os resultados e a utilização do capital. Esse é o nosso mantra.

De onde vem essa necessidade de capital em 2019?

De 2012 a 2014, mais de R$ 120 bilhões foram aplicados em habitação. Caso tenhamos interesse de continuar investindo fortemente em nome do governo e do FGTS, vamos ter de discutir essa relação. A pergunta que eu faço sempre é: “por que os demais bancos não investem no FGTS?”.

É a falta de concorrência que gera essa necessidade?

A Caixa tem 80% de todo o crédito com recursos do FGTS. A partir do momento em que o Conselho Curador aprova R$ 325 bilhões para os próximos quatro anos e temos 80% disso, alguém tem de discutir como a Caixa pode continuar consumindo capital com esse spread máximo de 2,5% ao ano (remuneração máxima que o banco ganha ao emprestar o dinheiro do fundo). Caso contrário, adotaremos as mesmas medidas que os demais: usar o capital para operações mais rentáveis, o que não faz sentido para um banco público.

O que acontece se a Caixa priorizar operações mais lucrativas?

Isso pode se transformar em um grande prejuízo global para a economia porque famílias ficarão desassistidas de moradia, de saneamento, de infraestrutura. O FGTS tem capacidade de gerar 6,5 milhões de empregos entre 2018 e 2021 e três milhões de moradias.

O TCU está encurralado?

Não vou dizer encurralado, mas é uma situação que precisa ser discutida em todos os setores. Não podemos colocar isso como um problema da Caixa e do TCU. É uma discussão que envolve governo, área econômica, setor empresarial e a população. O que queremos é propor uma operação segura.

O senhor cita falta de concorrência no crédito com FGTS, mas alguns bancos cobram a abertura na gestão. Isso é possível?

No passado, todos os bancos faziam a gestão do fundo. Era uma bagunça, não tinha segurança nem controle. Foi um risco enorme para o trabalhador. É bom lembrar que todo o lucro é do FGTS. Não é da Caixa. Eu recebo um porcentual dos saldos. É uma tarifa que recebo, mas o risco fica com a Caixa e isso consome o capital.

Mas o FGTS dá lucro…

Não é uma questão de remuneração. É uma questão de consumo do capital. Eu tenho R$ 1 bilhão em capital e os demais bancos também. Para onde eu vou direcionar esse recurso? Para uma operação com spread de 2,5% ao ano, como do FGTS, ou para o cheque especial e o cartão de crédito?

É preciso aumentar o juro para atrair os bancos privados?

Não. A proposta é pegar parte do patrimônio do fundo e aplicar em um título perpétuo.

Como seria essa operação?

A Caixa tem dívidas com o FGTS a vencer no futuro. O que nós faremos é pegar uma dívida de R$ 15 bilhões que vai vencer a partir de 15 anos e trazer a valor presente. Depois, pegar recursos da tesouraria da Caixa e liquidar essa dívida em dinheiro. Esse dinheiro fica disponível para o fundo comprar os títulos perpétuos da Caixa no valor de R$ 15 bilhões. Em 15 anos, quando minha dívida começaria a vencer, eu já paguei (aos cotistas todo o valor) com a remuneração. O FGTS não está botando dinheiro novo e não estou pegando o dinheiro do trabalhador. Não tem desvio de finalidade.

A criatividade em operações financeiras resultou no impeachment de Dilma Rousseff. Não seria melhor ter uma operação clássica na Caixa?

Com o Tesouro, seria melhor a forma tradicional. Ele é o dono do banco. Mas nós não podemos contar com essa situação, porque vivemos um período de déficits recorrentes.

Mas por que não captar no mercado como os demais bancos?

Por que não fazer com o próprio FGTS e permitir que o lucro fique no Brasil com o fundo, com o trabalhador? Eu pagaria a mesma taxa se fosse ao exterior captar com investidores internacionais.

A conversa com o FGTS começa com R$ 15 bilhões e segue adiante como foi com o BNDES?

Não. O projeto de lei estabelece que o limite é R$ 15 bilhões e o prazo é 2018. Em 31 de dezembro, vence a lei e não teremos mais essa possibilidade. Se tivermos de fazer outra iniciativa, será uma outra lei.

Caso o TCU não dê aval para a operação com o FGTS, a Caixa não trabalha com um plano B?

Trabalhamos com todos os planos. Temos a emissão externa, venda da carteira (de crédito para outros bancos), redução de despesa… Além disso, posso agregar o lucro e distribuir o mínimo de dividendos.

O Conselho Curador do FGTS só vai discutir a operação depois do aval do TCU?

Com certeza. É um compromisso que assumi com o TCU.

E como está o cronograma?

Eu já estive no Tribunal em duas oportunidades. Já estive com alguns ministros, principalmente com o ministro Benjamin Zymler, que é o responsável pelo FGTS, e determinou uma oitiva entre a Caixa e o Conselho Curador. Nós já entregamos as respostas e o Conselho Curador também. O TCU está em recesso e deve voltar na segunda-feira (15).

E quando vem a resposta?

Estamos esperando. Vamos esperar a ministra do Trabalho tomar posse, já que ela é presidente do Conselho Curador.

A decisão do banco de não acatar a sugestão do MP de substituir vice-presidentes não atrapalha a eventual busca por sócios?

Os maiores nomes do mundo no setor de loterias querem ser sócios da Caixa. Essa empresa é uma monstruosidade de segurança, é indestrutível. Passamos por alguns governos que quase quebraram e a empresa sobreviveu por 157 anos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.