Enquanto os EUA se retiram da diplomacia climática, país asiático que é o maior emissor de gases de efeito estufa do mundo se apresenta como uma potência planetária em energias renováveis ​​e finanças verdes.Quando Donald Trump tomou posse como presidente dos EUA, assinou rapidamente uma ordem executiva que deu início ao processo de retirada do país do Acordo de Paris , o pacto global que visa limitar o aquecimento global e desacelerar as mudanças climáticas.

Desde então, o governo americano reverteu importantes medidas climáticas nacionais e internacionais, cortando programas de energia limpa e eliminando regulamentações sobre emissões.

As ações de Trump representam um claro retrocesso em relação ao engajamento climático internacional anterior dos EUA. A maior economia do mundo desempenhou um papel fundamental na intermediação do histórico Acordo de Paris sobre o clima durante o governo de Barack Obama , enquanto Joe Biden aprovou um ambicioso pacote legislativo para impulsionar a energia verde e reduzir as emissões no país.

Mas a mudança de postura dos EUA em relação à ação climática abriu caminho para que outros países preenchessem essa lacuna. E a atenção tem se voltado cada vez mais para a China, o maior emissor de gases de efeito estufa do mundo.

O gigante asiático pode não parecer um candidato óbvio para assumir a liderança climática. Para atender à sua crescente demanda por energia, o país ainda constrói usinas termelétricas a carvão, que são altamente poluentes. Mas a superpotência também emergiu como uma gigante da energia limpa .

“A China está produzindo a maioria dos produtos de tecnologia limpa que o mundo precisa para descarbonizar”, diz Li Shuo, diretor do China Climate Hub no think tank Asia Society Policy Institute (ASPI), com sede nos EUA.

“Simplificar demais Pequim como um país atrasado em questões climáticas pode significar perceber tarde demais que as empresas chinesas já ultrapassaram em muito suas contrapartes ocidentais no setor de tecnologia limpa”, afirma.

Domínio do mercado de energia limpa

A China agora produz mais de 85% dos painéis solares do mundo e domina os mercados de veículos elétricos (VE) e armazenamento de energia. Somente em 2024, investiu 625 bilhões de dólares (R$ 3,3 trilhões) em tecnologia limpa – o maior valor entre todas as nações.

“Há cerca de 20 anos, a China percebeu que a tecnologia limpa era estratégica e que poderia usar a expertise e o poderio industrial que estava acumulando para investir fortemente nesses setores e obter uma vantagem estratégica”, ressalta Chris Aylett, pesquisador do Environment and Society Centre do think tank Chatham House, com sede em Londres.

A estratégia deu certo. As indústrias de energia limpa contribuíram com aproximadamente um quarto do crescimento do PIB da China no ano passado, e esse número pode dobrar na próxima década.

Isso se deve em parte à aceleração da transição global para energias limpas, que impulsiona a demanda por tecnologia e equipamentos, afirmou Muyi Yang, analista sênior de energia para a Ásia do think tank global de energia Ember.

“A China pode, de fato, atender a essa demanda fornecendo tecnologia acessível e mais inovadora”, frisa, acrescentando que isso não apenas impulsiona a própria transição da China, mas também facilita a mudança em todo o mundo.

Influência no Sul Global

A capacidade doméstica de energias renováveis ​​da China cresceu, com a energia eólica e solar cobrindo 84% da nova demanda de eletricidade somente em 2024. Seu impacto é particularmente visível nos países do Sul Global, cujas importações de painéis solares da China aumentaram 32% no mesmo ano, ultrapassando as remessas para o Norte Global.

Os países que importam tecnologia limpa da segunda maior economia do mundo incluem grandes mercados emergentes como Brasil, México e Paquistão, com rápido crescimento também sendo observado no Sudeste Asiático e em toda a África.

Aylett sublinha que, embora essas importações de energia verde ajudem os países a atingir as metas climáticas, considerações “mais práticas” provavelmente estão impulsionando a tendência. “É ótimo para a segurança energética”, afirma, acrescentando que os países provavelmente estão pensando: “Não queremos importar petróleo e gás. É volátil, não sabemos de onde vem e não podemos ter certeza sobre os fornecedores.”

De forma geral, o aumento nas exportações chinesas de tecnologia de energias renováveis ​​teve efeitos mensuráveis, ajudando a reduzir as emissões globais de carbono em 1% em 2024.

Superando metas “pouco ambiciosas”

Mas nem tudo são flores. Observadores criticaram as metas de redução de emissões da China por serem pouco ambiciosas. As emissões globais atingiram níveis recordes este ano, com eventos climáticos extremos se intensificando em todo o mundo. Cientistas alertam que, no início da década de 2030, o mundo provavelmente ultrapassará o limite de 1,5 grau Celsius, o que pode desencadear danos climáticos irreversíveis.

No âmbito do Acordo de Paris, os países se comprometeram a limitar o aumento da temperatura global a bem menos de 2 °C e a intensificar esforços para manter o aquecimento abaixo de 1,5 °C. Para se manterem no caminho certo, os países são obrigados a apresentar novas metas de redução de emissões a cada cinco anos.

Mas as metas recentemente apresentadas pela China, que prometem reduzir as emissões totais de gases de efeito estufa em 7% a 10%, estão muito aquém do necessário para impedir níveis catastróficos de aquecimento global.

No entanto, o país tem um histórico de prometer menos e entregar mais do que o necessário em relação às suas metas climáticas. “Os números podem parecer pouco ambiciosos, mas se você olhar além deles, poderá ver todas as mudanças que constituem a ação necessária para atingir essas metas”, dstaca Aylett.

Em 2020, o presidente chinês, Xi Jinping, prometeu que o país atingiria o pico de emissões até o final da década – uma meta que especialistas acreditam já ter sido alcançada, ou estar perto de ser alcançada, cinco anos antes do prazo.

Isso, juntamente com o cumprimento de sua primeira meta absoluta de redução de emissões de gases de efeito estufa, é um bom passo adiante, diz Yang.

“Esses são todos sinais positivos de que a transição no maior consumidor de energia do mundo está se acelerando e se aprofundando, em vez de desacelerar, e isso é uma ótima notícia para o resto do mundo”, comemora.

Liderando a diplomacia climática

Ainda assim, apesar de seu progresso, Pequim ainda não assumiu a liderança na diplomacia climática global. Embora a implantação de energias renováveis ​​e o financiamento de tecnologias limpas no exterior “constituam uma espécie de liderança”, Aylett ressalta que há uma “relutância” em assumir oficialmente esse papel.

“Não sei se esse é um conceito com o qual eles se sintam particularmente confortáveis”, acrescentou.

Em vez disso, Yang, da Ember, descreveu os esforços climáticos da China como focados principalmente em acelerar sua própria transição e em uma abordagem de “liderar pelo exemplo”.

Oficialmente, a China continua incentivando o engajamento dos EUA em questões climáticas. Na cúpula climática COP30 em Belém, o chefe da delegação chinesa, Li Gao, expressou a esperança de que Washington retorne às negociações climáticas. “Combater as mudanças climáticas exige o envolvimento de todos os países. Esperamos, e acreditamos, que um dia os Estados Unidos retornarão às negociações”, diz Gao.