Organizações sociais que integram a delegação do Brasil na Semana do Clima, em Nova York, avaliam de forma positiva a liderança brasileira a caminho da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), em novembro. O evento já é considerado o de maior engajamento na história, mesmo ocorrendo em um momento crítico para o multilateralismo.

“Nova York está lotada. Delegações de todo mundo, sociedade civil, muitas empresas, muitos representantes do setor financeiro, realmente buscando esse debate no sentido de fazer acontecer [as ações climáticas]. Se o cenário global não é um cenário de segurança, os outros atores que não são governos estão procurando fazer a parte de cada um deles”, disse Karen Oliveira, conciliadora da Coalizão Brasil e diretora de Políticas Públicas da The Nature Conservancy Brazil.

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Na avaliação do líder em mudanças climáticas da WWF-Brasil, Alexandre Prado, esses reflexos positivos nos ambientes que promovem o debate global sobre o enfrentamento à crise climática são uma tradição na diplomacia brasileira, capaz de construir pontes entre países em posições divergentes. 

“Não é à toa que a Eco92 aconteceu no Rio de Janeiro, e que as convenções [da ONU sobre Mudança do Clima, Biodiversidade e Desertificação] foram resultado da articulação feita pelo governo brasileiro, pelo Itamaraty”, lembra.

A menos de 2 meses do início da COP30, a Semana do Clima e a Pré-COP, que ocorrerá em outubro, em Brasília, são considerados os termômetros das negociações e avanços das ações que ocorrerão na conferência de Belém.

Com uma intensa agenda dividida entre a 80ª Assembleia Geral das Nações Unidas e os eventos paralelos da Semana do Clima, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez questão de deixar clara a relevância do tema na agenda de governo, com orientações no discurso de abertura da assembleia geral, a participação em um diálogo exclusivo para apresentar à comunidade internacional uma ferramenta de financiamento climático, a condução de uma agenda de mobilização de Estados-membros para ação climática e a apresentação de novas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), ao lado do secretário-geral da ONU, António Guterres.

Desafio

“As NDCs são, basicamente, a receita de bolo dentro dos países para cumprir o grande objetivo do Acordo de Paris, que é limitar o aquecimento global um grau e meio até o final do século. E para isso acontecer, a gente precisa alcançar a neutralidade em carbono até 2050”, destaca o diretor de Políticas Públicas da Conservação Internacional (CI-Brasil), Gustavo Souza.

Na análise de Souza, o desafio da presidência brasileira da COP em garantir a renovação de, pelo menos, 120 NDCs entre os principais países emissores e signatários da Convenção do Clima, vai muito além da entrega das ambições, consolidada até o momento por 47 países. 

“É um tema complicado, justamente porque grande parte dos países ainda não enviaram as NDCs, e as que foram enviadas, muitas não têm um nível maior de ambição, o que é contrário às regras do Acordo de Paris, do mecanismo de catraca, que determina que uma nova NDC deve ser mais ambiciosa que a anterior. E a gente não tem visto isso de maneira geral”, explica.

Combustível fóssil

Na avaliação de grande parte dos analistas climáticos, a atuação do Brasil no atual cenário do multilateralismo climático pode ser determinante para os impactos da crise global na vida das populações. 

“O papel da presidência brasileira [da COP30} é guiar esse processo global, mas também lidar com suas próprias contradições internas. O relatório sobre o gap fóssil [Relatório sobre a Lacuna de Produção], lançado ontem [segunda-feira] aqui em Nova York, mostra o Brasil como o país com a maior taxa de intenção de expandir produção de petróleo, entre os 20 maiores produtores”, alerta Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa.

Natalie considera, no entanto, um acerto a criação de mecanismos financeiros, como Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês) e os mercados de carbono, para valorizar a conservação de ecossistemas e dar sustentabilidade à floresta de pé. 

“O diagnóstico e os instrumentos são interessantes, mas falta aplicar essa mesma criatividade e inovação à transição para longe nos combustíveis fósseis”, reforça.

Mesmo diante dos desafios, os representantes da sociedade civil avaliam que a capacidade de mobilização global para a COP30 em busca de soluções para a crise pode trazer avanços, a exemplo de outras agendas, como a da Convenção de Viena e do Protocolo de Montreal, que recentemente anunciaram a recuperação contínua da camada de ozônio.

“Não existem processos perfeitos em nenhum lugar do mundo. E agora, dadas as críticas, que são ótimas e estão bem-vindas, o multilateralismo ainda é o único meio possível da gente conseguir manter um planeta habitável para as próximas gerações. Não existe outro”, defende Alexandre Prado, da WWF Brasil.