03/01/2022 - 8:49
Chega a ser impressionante que um componente tão crucial para indústrias de diferentes segmentos tenha sua produção global concentrada em menos de meia dúzia de players. Mas é assim que acontece quando o assunto é semicondutor. A pandemia levou o setor a uma crise de abastecimento. Por um lado, houve interrupção das cadeias de produção, por causa de lockdowns provocados em 2020-2021. Isso derrubou a oferta. Por outro lado, o confinamento fez explodir o comportamento por soluções remotas e digitais, aumentando a demanda. A lacuna entre encomenda e entrega chegou ao recorde de 22 semanas.
É nesse contexto que o ano de 2022 começa. Se não houver grandes alterações relacionados a variantes da Covid (com mais lockdowns), a previsão é que somente em meados do ano a situação comece a se normalizar, embora haja especialistas que prevejam um novo normal apenas em 2023. Isso se torna logística e geopoliticamente complexo quando se mergulha na indústria de semicondutores. Podemos dividir esse universo entre dois grandes blocos. No primeiro, as chamadas Fabless. São empresas (geralmente americanas) que desenvolvem hardware sem verticalizar a linha de produção de semicondutores – que fica na mão das chamadas Foundries (geralmente asiáticas). Um pouco como separar a produção do ovo da produção da galinha.
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Isso ocorreu porque produzir semicondutores na Ásia se mostrou mais em conta que nos Estados Unidos. O problema foi a concentração. E todo mercado concentrado faz de qualquer segmento consumidor um refém potencial. Esse é o epicentro dessa crise. Semicondutores são essenciais nas novas tecnologias, como Inteligência Artificial, Internet das Coisas, computação em nuvem, veículos autônomos e todo o repertório de soluções 5G. Mas estão igualmente em aparelhos cotidianos, como nosso smartphone ou máquina de lavar roupa. Por isso essa dependência quando desequilibrada provoca estragos globais.
De acordo com a consultoria TrendForce, 87% do mercado global de Foundry (as fundições) está concentrado em três países (Taiwan, Coreia do Sul e China). No caso de empresas, falamos de 90% na mão de cinco delas (TSMC, Samsung, UMC, Global Foundries e Smic). Concentração de produção de um lado mais vastidão de segmentos consumidores de outro lado significa pulverizar o poder de reequilibrar a forças. Um exemplo: outra consultoria, a Bain & Company, estima que toda a indústria automotiva represente apenas 8% das receitas do universo de semicondutores. Traduzindo, isoladamente uma montadora tem peso quase insignificante na hora de exigir remessas de suprimentos.
Concentrações de produção de itens tão essenciais como semicondutores são questões que cada vez mais escaparão do cenário puramente econômico para fazer parte da pauta diplomática e estratégica dos países. Geopolítica é o nome deste jogo.