Ficou decepcionado quem esperava que os seis principais candidatos à Presidência do Brasil discutissem propostas para o futuro do país no debate de três horas de duração realizado neste domingo (28/08). A discussão foi desconexa, confusa e, sobretudo, estressante, em parte devido ao formato escolhido e à técnica.

A começar pela iluminação num tom azul frio em todo o estúdio, o que deu a impressão de que os candidatos, alinhados lado a lado de maneira estéril, estavam flutuando no espaço sideral – especialmente aqueles usando terno também azul. Um pouco mais de calor e um posicionamento em meio-círculo teriam contribuído para uma atmosfera mais agradável. Da mesma maneira, teria sido bom melhorar a qualidade acústica – o som era metálico e havia muitos ruídos de fundo.

O maior ponto fraco do debate, no entanto, foi que não se discutiram temas em blocos. Pelo contrário, a discussão foi desordenada o tempo todo: passava da política para mulheres pelo direito ao armamento até o agronegócio, a gestão da pandemia e a fome. Nenhum tema foi debatido por mais de alguns minutos; os candidatos apresentaram argumentos decorados e não houve espontaneidade em quase nenhum momento.

Pesquisa BTG/FSB mostra Lula com 43%; Bolsonaro tem 36%, Ciro, 9%, e Tebet, 4%

Essa estrutura se mostrou cansativa também porque os candidatos argumentaram partindo de posicionamentos completamente diversos. De um lado, os políticos alfa Lula e Bolsonaro, que sabem que vão decidir o pleito entre si. Do outro, os adversários Ciro Gomes e Simone Tebet, para os quais está claro que não têm chance, mas que participam do processo mesmo assim – Ciro, porque já é tradição para ele ficar em terceiro lugar nas eleições presidenciais; e Tebet, para se posicionar para tarefas futuras. E também houve os candidatos que transitam debaixo do radar, Soraya Thronicke e Felipe d’Avila, que queriam principalmente lembrar que existem.

Se, mesmo assim, algo dessa longa noite fica na memória, são as sete constatações seguintes.

Vamos começar com Lula. Seu programa para o futuro parece se chamar “Em frente rumo ao passado”. Toda vez que ele teve a chance de falar sobre seus planos de governo a partir de 2023, falou de sua posse em 2003. Nem de longe Lula esteve tão seguro como durante sua entrevista ao Jornal Nacional na semana passada. Parecia cansado, e a presença de espírito e a eloquência só apareciam quando era provocado – por exemplo, ao lembrar Soraya Thronicke de que ela também tem jardineiro, motorista e empregada (Thronicke não rebateu). Ou quando prometeu a Bolsonaro: “Em um decreto só eu vou apagar todos os seus sigilos”. Lula é um gigante, mas durante o debate, ficou longamente adormecido.

Segunda constatação: Bolsonaro não tem muito mais a oferecer do que Deus, família, pátria e liberdade. E grosserias, é claro, comentadas por todos em seguida. Dessa vez, o alvo foi a jornalista Vera Magalhães. Como sempre, os adversários de Bolsonaro ficaram indignados, mas seus seguidores o consideram genuíno e autêntico.

Bolsonaro se vangloria de ter aumentado os auxílios federais para os pobres – fato é notável principalmente porque ele costumava xingar os pobres e porque queria eliminar políticas de transferência de renda. O presidente parecia irritado, insatisfeito. Mas seus eleitores também votariam num toco de madeira se Bolsonaro subisse nele.

Terceira: Ciro Gomes se diverte. Não tem nada a perder, então aproveita. Como sempre, falou das dívidas dos brasileiros, que ele quer reestruturar, além de protagonizar uma escaramuça com seu inimigo preferido, Lula, por causa de sua viagem a Paris após as eleições de 2018. Ciro se mostrou forte quando apontou que foi justamente o PT que fortaleceu o setor privado na área da educação. Ciro é inteligente e arrogante. Pena que ele não tem mais influência sobre a política brasileira – também por causa do fator graça.

Quarta: Simone Tebet foi a vencedora da noite, mas não da eleição. Apareceu segura de si, coerente, eloquente e bateu muito melhor em Bolsonaro do que Lula. Mostrou-se especialmente forte quando se tratou de reivindicar direitos das mulheres. Apresentou-se como mãe da nação – e, se continuar assim, vai fazer concorrência a Ciro pela terceira posição na disputa.

Quinta: o melhor momento de Soraya Thronicke foi quando ela disse a Bolsonaro: “Quando vejo o que aconteceu com a Vera, eu realmente fico extremamente chateada. Quando homens são tchutchucas com outros homens, mas vêm para cima da gente sendo tigrão. Eu fico extremamente incomodada, fico brava.” Agora todos esperam que ela cumpra sua promessa: “Podem ter certeza que, do jeito que está, eu vou começar a entregar muita coisa aqui.” Mesmo assim, Thronicke foi uma grata surpresa por ter trazido, junto a Tebet e às muitas jornalistas fazendo perguntas, uma certa seriedade, sobriedade e despretensão ao debate.

Sexta: Felipe d’Avila é o típico candidato monotemático. Quer eliminar impostos e também o Estado por completo para que o setor privado determine nossas vidas. Infelizmente, ninguém perguntou a ele por que, então, ele quer se tornar presidente.

Sétima constatação: praticamente não se falou de rachadinha e de orçamento secreto, não se falou de racismo e de negros e indígenas. Talvez porque houve zero pessoas negras e indígenas presentes no debate.

Philipp Lichterbeck é correspondente e colunista da DW Brasil. O texto reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.