21/02/2007 - 8:00
DINHEIRO ? O que são as Leis da Simplicidade?
John Maeda ? Eu as definiria como a jornada de uma pessoa para entender a beleza da simplicidade, mas também a beleza da complexidade.
DINHEIRO ? Como elas surgiram?
Maeda ? Decidi encontrar um conjunto de ?leis? da simplicidade quando comecei a escrever num blog (www.lawsofsimplicity.com) minhas idéias sobre simplicidade. Com o tempo, cheguei às dez leis publicadas no livro. Não é pecado transgredi-las, mas elas podem ser úteis na própria busca pela simplicidade ? e sanidade ? no design, na tecnologia, nos negócios e na vida.
DINHEIRO ? Mesmo sendo um cientista da computação, o sr. também se incomodava com tantas novidades?
Maeda ? Cheguei num ponto da minha vida em que eu estava simplesmente cansado de tecnologia. Estava à frente de um teclado desde que tinha 12 anos de idade e queria algo melhor para mim. Minha carreira inteira esteve relacionada a fazer programas simples de computador que criavam gráficos bastante complexos. Eu estava ficando velho e achei que seria divertido ter amigos, aí fiz um consórcio de pessoas interessantes discutindo um tema que nos incomoda.
“O frenesi pela tecnologia acontece principalmente com os jovens”
DINHEIRO ? Esse cansaço diante da avalanche de novidades atinge a todos hoje em dia?
Maeda ? O frenesi pela tecnologia acontece principalmente entre os jovens e está tremendamente relacionado a status social. Seria fantástico comprar uma Ferrari ou um Porsche todos os meses para mostrar seu poder de consumo, mas, como é muito caro, os jovens compram um celular ou um aparelho novo qualquer a cada semana. Quando se é um pouco mais velho, no entanto, talvez você tenha uma vida para viver, uma família para cuidar ou outras coisas mais interessantes para fazer. Se você está ocupado com sua vida, você simplesmente não quer mais saber qual é o tipo do carro que está dirigindo. Por isso, a maioria das pessoas está cansada de todas essas coisas novas que é forçada a comprar. Você pode comprar um telefone e, mesmo que não queira, pouco depois você é forçado a comprar um novo. É injusto.
DINHEIRO ? As empresas já perceberam que os consumidores estão cansados de tantas novidades? Como os celulares que a cada dia têm mais funções e novos padrões de TV, DVD e tudo mais?
Maeda ? Sim, mas não é fácil mudar. Digamos que tenho uma padaria que fabrica bolos de casamento e é tremendamente bem-sucedida. Ano após ano, eu os desenho mais bonitos, mais complexos, mais altos e sofisticados. Mas se o cliente disser ?eu não quero um bolo de casamento, eu quero um copo d?água?, será muito difícil atendê-lo porque as empresas não mudam tão rápido. Os consumidores, sim, transformam seus desejos de uma hora para outra. Só que, em vez de adequar seus produtos ao que eles querem, as companhias fazem o que fazem: continuam produzindo bolos enormes, mas gastam muito mais em publicidade.
“Para se tornar um sucesso, o MP3 tinha de ser simples, como o iPod”
DINHEIRO ? Foi fácil trazer empresas para o consórcio?
Maeda ? Muito. Todas sabem que bolos de casamento não vendem mais tão bem. Elas prefeririam fazer biscoitos, mas toda a cadeia de produção está voltada a fazer bolos de casamento. Não é algo fácil de mudar.
DINHEIRO ? Em outras palavras, elas estão buscando simplicidade porque simplicidade vende?
Maeda ? Muito, porque há uma enorme demanda. As pessoas sempre querem o que não têm. Temos tanta complexidade hoje em todos os produtos que as pessoas querem o oposto. Se tudo ficar muito simples, no entanto, o consumidor vai voltar a querer complexidade. Foi o que aconteceu com os relógios de pulso digitais. Por algum tempo, eles eram bastante simples e todos os usavam. Depois, deixaram de comprá-los porque todo mundo tinha. Foi quando Casio lançou o G-Shock, que era um relógio digital decorado, extravagante e todos o queriam porque era diferente.
DINHEIRO ? É como se fosse um pêndulo?
Maeda ? Exatamente. Queremos simplicidade porque o mundo é complexo. Quando se tornar simples de novo, vamos querer complexidade.
DINHEIRO ? As empresas se preocupam muito com os aspectos negativos da simplicidade?
Maeda ? Sim, elas se preocupam se o produto venderá se for considerado muito naif ou tão simples que não crie impacto. O livro se ocupa muito sobre o encontrar o ponto certo de equilíbrio entre simplicidade e complexidade. Para ser mais específico, entretanto, simplicidade vende quando se quer criar um paradigma: um novo produto ou uma nova categoria, como aconteceu no caso dos tocadores de MP3. Ninguém sabia o que eram, só que eram diferentes de um tocador de CDs. Para se tornar um sucesso, tinha de ser simples. Mas, uma vez que todos o tenham, é necessário fazê-lo mais complexo porque as pessoas logo ficarão cansadas dele. É exatamente o caso da Apple, que continua colocando mais e mais novidades no iPod.
DINHEIRO ? Tecnologia ajuda ou atrapalha?
Maeda ? Depende do uso. Quando eu estava na escola de artes, algumas vezes comecei a procurar, sem querer, a tecla ?desfazer? para corrigir erros nos desenhos. Percebi então que a tecnologia estava me moldando muito mais do que o contrário. Uma vez, fiquei esperando dias por um refil para a impressora de etiquetas, quando me ocorreu que eu poderia apenas escrever sobre a pasta com uma caneta. Em outra ocasião, tivemos uma dúvida sobre uma palavra e meu primeiro instinto foi ir ao dictionary.com. Quando consegui ligar o computador, alguém em casa já tinha visto o significado num dicionário de verdade. O efeito incapacitante da tecnologia pode ser hilário, mas tecnologia e vida só se tornam complexas se permitimos.
DINHEIRO ? Qual é o objetivo do Simplicity Consortium?
Maeda ? Temos dez sócios corporativos, entre eles Lego, Toshiba e Time. Projetamos, criamos tecnologias e protótipos orientados pelos princípios da simplicidade para tentar criar produtos que sejam sucesso de mercado.
DINHEIRO ? Quais produtos foram criados no laboratório?
Maeda ? Trabalhamos num porta-retrato para a Samsung que reproduz fotos digitais transmitidas em rede, de qualquer computador. Ele tem poucos botões e é bastante fácil de usar. Também ajudamos a associação AARP, que cuida do interesse dos americanos com mais de 50 anos, a definir os padrões de aparelhos para pessoas que têm mais idade. É um trabalho de longo prazo e que deve ter bastante impacto, já que cada vez mais vivemos mais tempo.
DINHEIRO ? O sr. escreveu o livro sob o formato dos princípios da simplicidade. É curto e tem ?A Única Lei?, para quem não quer perder tempo lendo todos os capítulos. Alguém que lesse ?A Única? seria capaz de entender tudo o que a teoria abrange?
Maeda ? Sim. As pessoas reclamam que fiz muitas leis. Não sou Deus, mas são apenas dez e apontam caminhos. Além disso, também há as soluções.
DINHEIRO ? Simplicidade não é algo muito complexo para se teorizar?
Maeda ? Claro. Mas é exatamente por isso que, em vez de escrever um livro gigantesco, fiz um bem curtinho, aberto para interpretações variadas.
DINHEIRO ? A Philips acaba de lançar no Brasil o ?Prêmio Philips de Simplicidade? para divulgar idéias que facilitem o dia-a-dia das pessoas. Estamos em algum tipo de corrida do ouro pela simplicidade?
Maeda ? Exatamente, porque não a temos. Nos Estados Unidos, o Citibank tem um cartão de crédito de ?simplicidade?, a Ford possui o programa ?Keep it simple pricing? e a Lexmark quer ?descomplicar? a vida do consumidor. É um fato. Se as pessoas tivessem diamantes por toda a sua casa, não dariam a menor importância. Há muitos diamantes no mundo, mas eles estão escondidos em algum lugar, como a simplicidade.
DINHEIRO ? As Leis da Simplicidade funcionam apenas para os negócios?
Maeda ? Embora o tema tenha começado no terreno do design, da tecnologia e da área de negócios, descobri que o público reverbera o tópico a tudo. Recebo e-mails de todos os tipos, de diferentes tipos de pessoas. O Clube das Esposas de Militares falou sobre como usaram as leis para melhorar a própria vida. A Associação das Estradas da Flórida, sobre como melhoraram as vias. Já os fabricantes de vinho melhoraram sua produção. Uma das forças do livro é que ele é bastante aberto.
DINHEIRO ? Os princípios do livro se aplicam a todas as culturas?
Maeda ? Provavelmente não, mas o bom de se ter dez leis é que não é necessário gostar de todas elas.
DINHEIRO ? Qual é a mais importante?
Maeda ? A minha favorita é a terceira lei, que fala sobre tempo. Tempo é o que há de mais precioso. Quando era mais novo, eu tinha um chefe que me falava sobre como ele odiava ter de molhar os dedos para virar as páginas depois de ter ficado velho porque seus dedos tinham ficado secos. Hoje eu também odeio isso, mas ao mesmo tempo adoro envelhecer. Tudo é mais bonito, tudo é mais precioso. É uma troca da juventude pelo prazer de apreciar a vida.
DINHEIRO ? O sr. usa os princípios da simplicidade no seu trabalho como artista?
Maeda ? O tempo todo. Uso simplicidade e complexidade para mostrar as diferentes maneiras de ver o mundo.