Nos últimos anos, os programas de fidelidade ganharam proporções nunca vistas no País. Despesas em supermercados, por exemplo, podem se transformar em passagens aéreas. Compra de livros dá direito a combustíveis. Aluguel de carro gera pontos para aquisição de medicamentos. As possibilidades são praticamente infinitas. Entre os maiores programas desse mercado, o Smiles, criado pela extinta Varig e controlado atualmente pela Gol, era o único que relutava em mergulhar de cabeça no varejo. O plano era preservar seu negócio principal do programa: o acúmulo de milhas em voos e a troca de pontos por passagens aéreas. 

 

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Bom relacionamento: Andrade, do Smiles, vai procurar as empresas

que já são parceiras no acúmulo de milhas em suas lojas online

 

A estratégia, no entanto, começará a mudar a partir deste ano. Trilhando o caminho dos rivais Multiplus, da TAM, e Dotz, empresa paulista controlada pela família Chade, o Smiles mira as grandes redes supermercadistas, lojas de departamentos e eletroeletrônicos, além de operadoras de telecomunicações. No mercado de telefonia, apenas a Oi tem ligação com a Multiplus. Mas, na área de varejo, Walmart e Lojas Americanas podem ser as primeiras a participar do programa de fidelidade do Smiles, pois já mantêm uma atuação conjunta com suas lojas virtuais. 

 

“Vamos priorizar os varejistas com os quais já temos relacionamento, mas essa não é uma regra para fechar um acordo”, diz Leonel Andrade, CEO do Smiles e ex-executivo do Citibank. O fato é que a ampliação no número de parceiros para a conquista de pontuação pelos consumidores ajudaria a decolar o programa no mercado, que hoje é liderado pela Multiplus, com receitas de R$ 470,9 milhões, no terceiro trimestre de 2013, e 11,9 milhões de associados (veja o quadro ao final da reportagem). Embora tenha decidido replicar o modelo bem-sucedido da principal concorrente, o Smiles terá um plano mais centralizado, sem pulverizar-se com a participação de muitas empresas. 

 

“Queremos os líderes”, afirma Andrade, que assumiu a empresa às vésperas da abertura de capital na Bolsa de Valores, em de abril de 2013. Um passo importante para a aproximação com o varejo foi dado em outubro do ano passado, com a aquisição de 25% da Netpoints Fidelidade, de São Paulo, por R$ 25 milhões. A empresa reúne varejistas de pequeno a grande porte em um programa de pontuação, como a Lojas Marisa e a rede supermercadista paulistana D’Avó. O objetivo é fazer da Netpoints, que conta com mais de três milhões de participantes, o principal canal do Smiles para atingir os consumidores das classes C e D. 

 

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Prioridade nos assentos: programa vai fazer acordo com outras aéreas, como a Alitalia

 

Segundo Andrade, a principal vantagem para a aquisição foi a ferramenta de relacionamento com clientes que a companhia buscava. “Eles têm um sistema muito forte e boas parcerias”, diz. Nos próximos cinco anos, o Smiles terá a preferência na aquisição de mais 25% do capital da Netpoints, com direito de assumir o controle. O negócio aguarda aprovação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). O investimento do Smiles na aquisição da Netpoints permitiu um maior acesso à informação sobre o perfil das faixas de clientes da classe média emergente, de acordo com Henrique Navarro, analista do banco Santander. “Eles passaram a ter uma gama de informações sobre os consumidores que nem mesmo o próprio varejo tem”, diz Navarro. Além da Netpoints, o Smiles já vinha conquistando parceiros ao longo de 2013 no varejo. 

 

O maior deles é a BR Distribuidora, da Petrobras. Houve, também, acordo para acúmulo de pontos com as redes de drogarias São Paulo e Pacheco, além da Polishop, no segmento de eletrodomésticos. A ofensiva sobre o varejo não será, porém, a única iniciativa estratégica do Smiles. A empresa pretende ampliar o número de companhias aéreas nas quais o consumidor poderá usar a sua milhagem para viajar. Embora não revele os potenciais parceiros, Andrade antecipa que a próxima a entrar no leque de opções é a italiana Alitalia. Fontes do mercado garantem que há outras quatro grandes companhias de aviação em negociação. “Apesar da aposta no varejo, o foco continuará sendo as passagens aéreas”, diz. 

 

“É onde o consumidor reconhece a maior vantagem por sua fidelidade, pois ele quer voar e não comprar televisão.” A estratégia de manter o foco em passagens não deve ser subestimada. O Smiles é mais rentável do que seu principal concorrente, de acordo com o analista da XP Investimentos, Thiago Souza. Enquanto o programa da Gol garantiu 40% de margem de lucro de sua operação no terceiro trimestre de 2013, a Multiplus apresentou 15,3%. Por esses e outros resultados, a empresa apresentou alta de 58,5% no valor de suas ações desde que abriu capital. No mesmo período, a Multiplus amargou uma queda de 10,9%. Apesar do bom desempenho, a rede atual de parceiros pode não ser suficiente para manter sua reputação aos olhos dos investidores, o que faz a busca por novos parceiros um plano decisivo para o Smiles e seus acionistas continuarem sorrindo.

 

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