05/01/2001 - 8:00
DINHEIRO ? Como será a Internet dos próximos anos?
IVAN MOURA CAMPOS ? A primeira coisa que vai acontecer, com a disponibilidade de uma banda mais larga, é tornar tudo o que já fazemos na Internet muito, muito melhor mesmo. Teremos, por exemplo, conversas telefônicas com imagem via Internet de alta qualidade. O conteúdo virá de maneira uniforme: imagem, voz e e-mail. Isso vai viabilizar uma série de novas atividades como educação just in time, na hora e local onde se quiser, e o surgimento da telemedicina, que transmitirá diagnósticos pela rede sem precisar movimentar o paciente. E, por último, mas não menos importante, os avanços no comércio eletrônico serão surpreendentes.
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DINHEIRO ? E no Brasil? DINHEIRO ? Mas ainda existem muitos problemas… DINHEIRO ? Como tornar a Internet mais acessível? DINHEIRO ? Num País com tantos problemas sociais como o Brasil, o sr. acredita que as pessoas dariam prioridade à compra desse computador? DINHEIRO ? É comum se dizer que o Brasil já perdeu, por falta de visão estratégica, vários bondes para o desenvolvimento. O exemplo mais citado é o da indústria de hardware, nos anos 80. Isso se repetirá com a Nova Economia? |
DINHEIRO ? Mas vários erros foram cometidos nesse processo.
CAMPOS ? É verdade. Foi o caso de querer tratar a informática como assunto de segurança nacional. Quando os militares entraram, esse mercado foi para o brejo porque virou uma coisa estatal e perdeu a agilidade necessária.
DINHEIRO ? Hoje a indústria nacional de software é considerada de ponta. O que fazer para expandir esse nicho já conquistado?
CAMPOS ? Uma outra volta na espiral do Softex (o programa de estímulo à indústria de software). Naquela época, o desafio era fazer com que as indústrias brasileiras de software produzissem ferramentas em Windows. Agora, é fabricar produtos para a Web. Para isso, temos que aproveitar as janelas de oportunidade que a gente tem aqui no Brasil. Uma delas é a universalização de acesso.
DINHEIRO ? Para isso é necessário disponibilizar novos financiamentos, não?
CAMPOS ? Claro, e condições de produção que sejam vantajosas também. Mas não é só isso. É preciso que empresários reflitam um pouco e tenham uma mentalidade de correr mais riscos. Está faltando ousadia e também elevar a nossa auto-estima tecnológica. É só as pessoas irem lá fora para ver o que nós já fizemos em termos de tecnologia digital.
DINHEIRO ? Por que o sr. diz que subestimamos o nosso potencial?
CAMPOS ? Em termos de tecnologia de operação da planta de telefonia não devemos nada a ninguém. O mesmo acontece com a digitalização do sistema bancário nacional, que dá de 10 a zero na dos norte-americanos. Além disso, pouca gente sabe, nós temos até máquinas de busca brasileira que estão ganhando concorrências internacionais na Espanha, Portugal, Chile e logo estarão entrando até no mercado norte-americano.
DINHEIRO ? Qual deve ser a estratégia para se estimular o crescimento tecnológico?
CAMPOS ? Governo e setor privado devem tentar detectar nichos prospectivos de tecnologia para o Brasil. Aproveitar esses setores, como automação bancária, conteúdo em tevê digital, segurança, máquinas de busca, entre outros em que já temos excelência, para investir. Não dá mais para querer concorrer em tudo. Veja o exemplo da Finlândia, que só atacou em comunicações móveis e se tornou um dos players dominantes no mundo com a Nokia.
DINHEIRO ? Mas ainda produzimos muito pouco aqui no País, tanto que temos sérios problemas de balança comercial…
CAMPOS ? Parte da culpa disso é Manaus. A Zona Franca é um modelo industrial complicado. Está longe dos mercados consumidores e tem incentivos demais. Da última vez que olhei, a renúncia fiscal era de algo entre R$ 5 a R$ 6 mil por emprego gerado. Televisor digital, telefone celular e computador não têm nada a ver com a região. Muito mais interessante seria estimular ali uma indústria de fitoquímicos, de fármacos. Mas vai falar isso para a bancada amazônica lá no Congresso.
DINHEIRO ? Numa escala de zero a 10, qual nota o sr. daria para o empenho do governo brasileiro no campo tecnológico?
CAMPOS ? Alta, de 8 a 9. Trabalhei muito tempo no governo e posso dizer que nunca foi tão fácil conversar sobre essas questões. Prova disso é que foi iniciativa do governo o projeto do Programa Brasileiro da Sociedade de Informação, que é uma coisa que está sendo copiada no mundo inteiro. Os europeus estão encantados e os americanos também. E, agora, tem uma comissão permanente no governo tratando disso.
DINHEIRO ? O que mais deve acontecer com o comércio na Internet?
CAMPOS ? A Internet vai acabar com os intermediários. Isso quer dizer que o industrial ou o comerciante que não comprar dos seus fornecedores pela Internet estará fora do negócio. Sem intermediários, os preços vão cair e ficarão bem mais acessíveis para todos.
DINHEIRO ? Que orientação o sr. daria para uma empresa tradicional que quer utilizar melhor a Internet?
CAMPOS ? Focalizar primeiro no business to business. Oitenta por cento das transações da Internet no futuro serão business to business e 20% de business to consumer. Além disso, é preciso ter em mente que existem coisas muito boas para se vender na Internet, como software, disco, livro. Outras coisas não vendem na rede de jeito nenhum, como roupa e sapato. Não tem cabimento comprar sapato pela Internet.
DINHEIRO ? Nos últimos meses, a Nasdaq tem sido alvo de muitas turbulências. É um sinal de que acabou a era da aventura na Internet?
CAMPOS ? Antes das quedas, havia um modelo de negócio movido a entusiasmo. Um grupo de jovens do Vale do Silício juntava-se numa garagem, concebia uma idéia e chegava para um investidor de risco e falava: olha aqui uma idéia da pesada, nós vamos ganhar muito dinheiro. O investidor colocava, então, US$ 50 milhões nas mãos deles. Os jovens viviam com dinheiro dos investidores, mas sem preocupação com o fluxo de caixa. Durante um bom tempo a Nasdaq valorizou as ações dessas empresas, cujo modelo de negócio era mais baseado na entrada periódica de capital novo do que propriamente dos lucros. Chegou o dia em que se deu conta que não havia uma fonte real de entrada de recursos e a bolsa tremeu. Por isso, na Nova Economia os investidores serão muito mais rigorosos com a viabilidade financeira.
DINHEIRO ? E qual o modelo que está em descrédito?
CAMPOS ? O que está mais em descrédito são os sites. O sujeito monta um portal para vender um monte de coisas e a única fonte de renda são os banners de publicidade. Isso não dá mais.
DINHEIRO ? Qual o modelo do futuro?
CAMPOS ? O segredo do sucesso nessa Nova Economia é tentar se posicionar como um fabricante de pás e enxadas e não ser mais um à procura do ouro. Como o volume de informações na rede será cada vez maior, o segredo será descobrir formas de encontrar isso. Ou seja, ferramentas de busca, como a Oracle, de Larry Ellison, faz, e eu, agora, também estou fazendo. A outra forma é ter um pé na economia tradicional, como a Amazon.com.