DINHEIRO ? Qual sua opinião sobre o projeto de desenvolvimento proposto pelo presidente eleito?
BLAIRO MAGGI ? Só conheço até agora as promessas de campanha de aumentar as exportações industriais e agrícolas para gerar mais emprego. Mas a verdade é que ninguém sabe ainda exatamente a linha que vai ser seguida pelo futuro governo na macroeconomia, na política industrial, ou na agrícola. O que se conhece são os planos de governo, elaborados técnicos que tentam chegar à perfeição teórica. A realidade começa agora.

DINHEIRO ? Quer dizer que o País e os mercados só poderão conhecer os rumos do próximo governo só depois da posse?
MAGGI ? Não, o governo de transição precisa mostrar logo suas cartas. Ainda está dentro do prazo anunciado, início de dezembro, mas não pode demorar mais do que isso. O País não conseguirá esperar ainda mais. Deveria ter sido antes, com a nomeação da própria equipe de transição. O melhor teria sido que Lula tivesse nomeado os futuros ministros para compor a equipe de transição, como estou fazendo com o meu secretariado no Mato Grosso. Nos próximos dias, quando começarem a ser anunciados os futuros ministros, teremos os primeiros indícios realmente claros do verdadeiro rumo do futuro governo.

 

 

DINHEIRO ? O que muda no quadro atual de promessas e intenções?
MAGGI ? O perfil dos ministros já aponta o caminho que será perseguido em cada área. Por isso é essencial que Lula apresente logo, pelo menos, quem vai conduzir a economia. No Desenvolvimento, importa saber se o ministro será um empresário ou um político, se alguém preocupado com a proteção interna às indústrias ou com competitividade externa. Na Agricultura isso fica muito claro. Os planos de crescimento econômico, de aumento das exportações ou mesmo o cumprimento das metas prometidas ao FMI só podem dar certo se for nomeado para a Agricultura alguém com os olhos voltados para a abertura de novos mercados. Pois é este setor o único que está produzindo superávit comercial e segurando nossa balança de pagamentos. Enfim, daqui a alguns dias já será possível prever se o projeto de desenvolvimento vai dar certo ou errado, se o Brasil vai avançar o retroceder.

DINHEIRO ? Como o sr. avalia a idéia de o ex-governador Leonel Brizola ir para a Agricultura?
MAGGI ? Seria uma lástima! O Brizola é um grande líder político, mas o Brasil precisa andar para frente. O Brizola não tem mais idade para colocar a mala nas costas e sair pelo mundo abrindo mercados. O Brasil tem tecnologia suficiente para produzir excessos de alimentos e não precisa de ministério ensinando como se deve produzir. Precisa, sim, fomentar mercados. Estou defendendo, dentro da coligação política da qual faço parte, alguém com o perfil do atual ministro Pratini de Morais. O Ciro Gomes seria excelente. Ele não é da área, como o Pratini também não era, mas tem o conhecimento técnico, a força política e a cabeça globalizada.

DINHEIRO ? Há indícios de que o próximo governo vá apresentar uma política industrial forte e coerente?
MAGGI ? Ainda não. Mas o caminho é conhecido por todos: fazer uma reforma tributária urgente para desonerar a produção e
os salários e, para compensar, cobrar mais sobre o consumo. Também é preciso aumentar a competitividade com programas de incentivo à modernização tecnológica e de fomento à pesquisa. Produzir não é problema, temos condições fazer muito e bem. O problema é vender e nesse sentido o governo precisa ser o grande parceiro da iniciativa privada para abrir mercados. É aumentar o consumo interno e reduzir o protecionismo externo. Quanto ao
resto, os setores produtivos se viram.

DINHEIRO ? Mas há também uma série de pautas setoriais de reivindicações da indústria a ser debatida.
MAGGI ? O que o setor industrial espera do governo é que a política de abertura de mercados seja permanente. E essa política tem duas mãos. Já abrimos há uma década nossos mercados para as importações. Agora precisamos de programas permanentes e eficientes de incentivo à modernização do parque industrial. Um exemplo concreto é o atual programa de modernização da frota de tratores e máquinas agrícolas. O Banco do Brasil vem operando com juros de 8% a 10% ao ano, o que permitiu que metade da frota brasileira de tratores fosse renovada. O governo Lula precisa prosseguir com as políticas que estão dando certo.

 

 

DINHEIRO ? O senhor esteve recentemente com o presidente
eleito para discutir sobre políticas
de desenvolvimento regional. Pode detalhar o teor dessa conversa?
MAGGI ? Ele me disse que pretende fazer política conversando com os governadores, não quer tomar nenhuma decisão importante, especialmente na economia, sem antes dar conhecimento a todos. O presidente acha que nós, governadores, devemos trabalhar em bloco, que se fizermos as reivindicações por grupo de Estados, por região, vai facilitar muito a vida dele e aumentar as chances de que sejamos atendidos. Ele também me pediu para fazer contato com as lideranças do agronegócio brasileiro a fim de levantar as políticas que estão dando certo para mantê-las, bem como as que precisam ser melhoradas. Entendo que essa disposição de dialogar é uma garantia que não haverá surpresas nas ações que serão implementadas. Estou convicto de que Lula realizará o melhor governo possível, fazendo o que está fazendo, conversar.

DINHEIRO ? A renegociação das dívidas dos Estados é um dos pontos que mais preocupam os analistas econômicos e os técnicos do FMI. Quais os compromissos que o presidente Lula está assumindo com os governadores sobre essa questão?
MAGGI ? Esse é o tema mais importante para nós, os novos governadores. Vamos ter que conversar muito com o governo federal até encontrar uma solução. Algumas dívidas estão muito altas. No Mato Grosso, estamos pagando 22% da receita líquida, quando a legislação em vigor rege que seja de 12%. Lula me prometeu equalizar esse problema, dar um jeito para que todos os Estados paguem até 12% das receitas.

DINHEIRO ? O Brasil está preparado para enfrentar o protecionismo dos Estados Unidos e da União Européia nas negociações da Organização Mundial do Comércio e da Alca?
MAGGI ? O Brasil abriu sua economia de forma irresponsável de
uma hora para outra. Nossas salvaguardas foram mínimas e a
moeda de troca é pouca. Recentemente o Brasil entrou com demanda junto a OMC no algodão contra Estados Unidos e açúcar contra a União Européia, pensa entrar com soja, frango, sucos e outros produtos fortemente subsidiados. Se não estamos preparados, temos que aprender. O que não podemos é ser prejudicados e não reclamar. Respeito se conquista lutando, adotando o conceito do ?toma lá dá cá?. Com os Estados Unidos, precisamos deixar claro que não tem negociação com a Alca se os produtos agrícolas não entrarem na pauta.

DINHEIRO ? Como o sr. avalia os projetos sociais apresentados pelo próximo governo, como o Fome Zero?
MAGGI ? O programa de combate à fome é necessário e emergencial. No meu Estado existem 43 mil famílias que não possuem nenhuma renda. Vivem em condições subumanas. Em hipótese alguma podemos ficar de braços cruzados diante da possibilidade concreta de surgir uma sub-raça em nosso quintal pela deficiência de ingestão de proteína. Os governadores podem fazer sua parte. Vou contribuir isentando o ICMS sobre arroz, feijão e carne para todos e, ao mesmo tempo, criar um Cupom Alimento para ser distribuído. Acredito que a agricultura brasileira já está fazendo a sua parte. Comida barata os produtores vêm colocando na mesa do povo há muito tempo, o que falta é renda para comprar.

DINHEIRO ? O Movimento dos Sem-Terra é uma ameaça?
MAGGI ? Esse é outro ponto que Lula precisa atacar de frente, a reforma agrária. Ele tem que chamar o MST e perguntar quantas famílias eles têm para assentar. ?Me passa a relação?, ele tem que exigir. Depois, dar terras e dizer: ?Agora vocês parem de invadir e vamos trabalhar?. Mas só a terra não resolve o problema. Os casos de sucesso na política de assentamento atual são raros. De nada adianta dar a terra se junto não vai um pacote de ajuda técnica, organização da produção e apoio voltado ao mercado. O problema dos sem-terra é obter renda que lhe permita dar uma vida digna às famílias. A sociedade precisa entender que este segmento econômico tem que ser subsidiado.

DINHEIRO ? O sr. está defendendo a criação de subsídios?
MAGGI ? Só para os pequenos. A sociedade tem que encarar
que o pequeno produtor precisa receber subsídios em qualquer
país do mundo, caso contrário, não consegue competir nessa economia de escala global. Além de juros bancários subsidiados,
ele tem que receber renda extra sobre tudo o que conseguir produzir. Como nesses programas sociais urbanos, que concedem benefícios para quem mantém os filhos na escola, como o Bolsa-Escola. Mas sou contra novos subsídios para a agricultura empresarial, como a minha. Os grandes produtores não precisam de subsídios e, se vier, virá para atrapalhar. O que a agricultura de exportação precisa é de infra-estrutura. Mais energia, comunicações, estradas, portos e ferrovias.

DINHEIRO ? Isso está na agenda do governo?
MAGGI ? Lembro que o único setor que gera superávit comercial
é o agrícola e, por essa razão, ele passa a ser de interesse para todos os demais. Com R$ 5 bilhões é possível fazer todos os investimentos em transportes necessários no Centro-Oeste para
sair da atual produção de 100 milhões de toneladas de alimentos para 150 milhões de toneladas. Isso vai gerar para o País US$ 3 bilhões de riqueza extra ao ano. Ou seja, é um investimento que
se paga já no segundo ano.

DINHEIRO ? O que os Estados precisam do governo federal
para crescer?
MAGGI ? Na região Centro-Oeste, só estradas. Mais nada. Só precisamos de 3 mil quilômetros de estradas. Quanto ao resto, é só deixar o povo trabalhar. O Mato Grosso tem potencial para crescer 10% ao ano nos próximos anos. Se eu conseguir, vou gerar pelo menos 200 mil novos empregos na minha gestão. Estou convidando empreendedores de todo o País para se instalar no Estado, principalmente nas áreas de implementos agrícolas, agroquímicos, fertilizantes, armazenagem, suinocultura, avicultura, fiação e tecelagem e transportes. Mas não pretendo dar nenhum incentivo fiscal. Basta chegar e começar a trabalhar que vai dar certo.