Em depoimento coercitivo à Polícia Federal, na Operação Lava Jato, em  4 de março, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva explicou como  foram feitas as nomeações para as diretorias da Petrobras. Segundo o  petista, ‘cada ministro e cada líder do partido coalizado, participa da  montagem do segundo escalão do governo’.

“Houve troca de diretorias da Petrobras no início do seu mandato?”, questionou o delegado durante o interrogatório.

“Houve,  era tudo tucano, porra. Só tinha tucano, eu fui obrigado a tirar. Tinha  um que era tido como um Deus da Petrobras, aí eu tirei, foi trabalhar  com o Eike Batista, é o que o afundou o Eike.”

Para a  força-tarefa da Lava Jato, a maior estatal do País foi vítima de uma  esquema de corrupção e propinas entre 2004 e 2014. Os ex-diretores da  Petrobras Paulo Roberto Costa (Abastecimento), Renato Duque (Serviços),  Nestor Cerveró e Jorge Zelada (ambos da área Internacional) e o  ex-gerente executivo Pedro Barusco foram condenados por corrupção e  lavagem de dinheiro na investigação. Segundo as investigações, as  maiores empreiteiras do País reuniram-se em cartel e se apossaram de  contratos bilionários da companhia.

Em um trecho do  depoimento, o delegado quis saber de Lula se ele ‘tinha conhecimento da  divisão das diretorias da Petrobras por partidos políticos’.

“Não  é divisão por partido político, gente, principalmente um leigo, um  burocrata que não entende de política é que trata a questão da política  como se fosse uma coisa secundária. Política é uma coisa muito séria e  muito responsável, fora da política não existe saída pra nenhum país do  mundo. Então quando um presidente no Brasil, nos Estados Unidos, na  Suécia ou na Finlândia, ganha uma eleição no sistema de coalizão, ele é  obrigado a governar num sistema de coalizão. Não é de partido político  não, é fazer com que as pessoas que ajudaram a ganhar as eleições  participem do governo. É assim que funciona. É assim que o Janot montou a  equipe dele, assim é todo mundo da equipe. Quando você é eleito para um  cargo, você monta em função das pessoas que você conhece. Você não vai  colocar o inimigo, que trabalha contra os interesses do teu programa de  governo, para dirigir uma empresa”, respondeu Lula.

“E o senhor Renato Duque, como é que foi a indicação dele?”, perguntou o delegado.

“Do mesmo jeito, querido. Do mesmo jeito”, respondeu Lula.

“Como é que chegou o nome ao senhor, por qual partido?”, quis saber a PF.

“Veja,  todos os nomes chegam pela Casa Civil, porque era isso que eu estou te  falando, discute-se com o partido que vai indicar, discute-se com a  liderança do partido, vai pra Casa Civil, faz a triagem através do GSI e  esse nome vem pra você. Aí você pega o nome manda para o Conselho  Administrativo da Petrobras, ela indica ou não”, disse o petista.

“Foi assim com o Jorge Zelada também?”, questionou o delegado.

“Com todos eles”, afirmou o ex-presidente.

“Certo. Nestor Cerveró?”, perguntou a PF.

“Com todos eles”, disse Lula.

O petista também foi questionado pela Polícia Federal sobre a maneira como eram feitas as nomeações dos diretores da Petrobras.

“Eu  vou repetir o que eu já falei, não apenas o diretor da Petrobras,  qualquer diretor ou qualquer pessoa que vai trabalhar no Governo  Federal, quando você ganha uma eleição, eu vou explicar, quando você  ganha uma eleição, sozinho, são as pessoas do partido majoritário que  escolhem. Escolhem o Delegado Geral da Polícia Federal, escolhem o  Superintendente se quiser escolher o Superintendente, escolhem o  Procurador Geral da República. Tudo isso é o presidente que faz. Quando  você trabalha num regime de coalizão, você sai de uma coalizão e você  coloca ministros de vários partidos pra governar. Cada ministro e cada  líder do partido coalizado participa da montagem do segundo escalão do  governo. Então quem indica os diretores são as pessoas da área do  ministério, são as pessoas das lideranças dos partidos que compõem o  governo que vão indicando, essas pessoas passam pela Casa Civil, tem uma  investigação GSI, pode falar assim?”, disse Lula, provavelmente  referindo-se ao Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da  República.

“Certo”, respondeu o delegado.

“GSI,  sabe? E se a pessoa não tiver prontuário, se a pessoa não tiver  capivara, cada pessoa indica. Eu já fui perguntado, já me perguntaram de  Paulo Roberto, já me perguntaram do Duque, já me perguntaram? Essas  pessoas são funcionários de 30 anos da Petrobras. São pessoas de  carreira, que nunca a Polícia Federal levantou a suspeita, nunca o  Ministério Público levantou suspeita, nunca a imprensa levantou  suspeita, nunca a oposição sindical levantou suspeita, nunca nenhum dos  86 mil funcionários levantaram suspeita. Porque lamentavelmente as  pessoas não nascem com carimbo na testa, ‘eu sou filho da puta’ ou não,  ’eu sou ladrão’ ou não, você fica sabendo depois. Quantos caras vão no  casamento da filha, entra com a filhinha toda bonitinha pra entregar  virgem a um canalha que 3 meses depois dá uma surra na filha dele?  Então, meu filho, essas pessoas são gente de carreira, gente que estão  lá, que já tinha ocupado cargos importantes na Petrobras. Então, é assim  que são indicadas as pessoas. Já vem lá o nome, vem dois nomes, três  nomes, quatro nomes, esse aqui indicado pelo partido tal, Ministério é  tal, o líder é tal. “Esse cara aqui é mais qualificado. “É qualificado?  Vamos indicar.”

Em seguida, o delegado perguntou se a palavra final era do presidente.

“Hein?”, disse Lula.

“Enquanto o senhor era o presidente a palavra final era sua?”, questionou o delegado.

“Não, a palavra final era do conselho da Petrobras”, afirmou o petista.

O delegado, então, quer saber se o conselho era político.

“Não,  o conselho é o conselho da Petrobras, é o conselho que nomeia, isso é  como embaixador, é como Ministro da Suprema Corte. Ou seja, o presidente  indica e é referendado pelo Senado ou não. Passa ou não”, respondeu o  ex-presidente.

“Era o senhor que indicava os presidentes da Petrobras?”, perguntou o delegado. “Os diretores da Petrobras e o presidente?”

“O  presidente da Petrobras foi escolha pessoal minha, o Gabrielli, e  primeiro foi o José Eduardo Dutra, escolha pessoal minha. Não teve  interferência política, era minha”, disse Lula, referindo-se aos  ex-presidentes da estatal José Sérgio Gabrielli e José Eduardo Dutra.

“Certo. E os diretores?”, quis saber o delegado.

“Os diretores, eu acabei de dizer pra você”, respondeu Lula.

“Sim, por isso que eu perguntei ao senhor se a palavra final era sua”, disse o delegado.

“A palavra de mandar para o conselho é minha”, afirmou o ex-presidente.