08/03/2019 - 8:41
Assim como outros sobreviventes do Holocausto, que deixaram a França e se mudaram para Israel, Samy Gryn acompanha com dor o ressurgimento do antissemitismo no país onde nasceu.
“A situação na França me lembra os anos 1930. Estou realmente preocupado”, diz Gryn, de 78 anos, um dos poucos sobreviventes de uma famosa captura de judeus em Paris, durante a ocupação nazista.
Os atos antissemitas aumentaram 74% na França em 2018, segundo cifras oficiais.
“O país parece enfrentar um ressurgimento do antissemitismo, inédito desde a Segunda Guerra Mundial”, destacou o presidente Emmanuel Macron.
A tendência se manteve em 2019, com a profanação de um cemitério judaico no nordeste do país, suásticas pintadas em vários pontos da capital e insultos como as vaias ao acadêmico judeu Alain Finkielkraut na rua por manifestantes do movimento dos “coletes amarelos”.
Gryn tinha dois anos quando foi capturado com a mãe e a irmã na prisão de milhares de judeus do Velódromo de Inverno, em julho de 1942, pelas autoridades francesas, que seguiam ordens dos alemães.
Os capturados foram deportados para campos de concentração e só algumas dezenas voltaram.
Seu pai, de quem não tem lembranças, nem fotografias, morreu na câmara de gás em Auschwitz, na Polônia ocupada.
Gryn conseguiu fugir da deportação e foi escondido por uma família cristã até o fim da guerra. Sua mãe e sua irmã também sobreviveram.
“Eu me salvei. Ainda não sei por quê”, afirma.
Gryn mora em Israel há 50 anos. Decidiu deixar a França quando chamaram seu filho de “judeu sujo” na escola.
Outros sobreviventes do Holocausto que emigraram da França para Israel explicaram à AFP sua indiferença ante o que ocorre em um país com o qual cortaram laços.
– “Má direção”-
Em 2006, Ilan Halimi, um jovem judeu, foi torturado até a morte perto de Paris. Em 2012, um rabino e três crianças morreram em um atentado em uma escola judaica em Toulouse (sul).
Quatro anos depois, em 2015, um extremista que jurou lealdade ao grupo extremista Estado Islâmico matou quatro pessoas em um supermercado kosher em Paris.
E no ano passado, uma senhora judia de 85 anos foi esfaqueada em casa, antes de lhe atearem fogo, em um crime que se acredita ter sido motivado, ao menos parcialmente, pelo antissemitismo.
Incidentes assim fazem aumentar a sensação em Israel de que os judeus franceses estão em perigo no país que tem a maior comunidade judaica da Europa.
“A história não está se repetindo, mas seguimos em uma má direção, isto é certo”, afirma Gryn.
Shlomo Balsam é o presidente da associação israelense Alumim de crianças judias que sobreviveram ao Holocausto na França e trabalha como guia no memorial do Holocausto Yad Vashem de Jerusalém.
“O aumento de atos antissemitas na França relembra muitas coisas aos sobreviventes”, diz. “São muito, muito sensíveis ao que está acontecendo”, acrescenta.
“Para muitos de nossos membros, os coletes amarelos evocam a estrela amarela […] Cada incidente os leva de volta ao seu passado”, afirma Balsam.
“Uma idosa judia foi assassinada porque era judia, novamente vandalizam nossos cemitérios, as imagens de agora se sobrepõem às do passado”, reforça.
Berthe Badehi, de 87 anos, voluntária no Yad Vashem durante mais de vinte anos, conta sua história várias vezes por semana em hebraico, inglês e francês aos visitantes do memorial.
“Meus pais, de origem polonesa, estiveram na resistência comunista e em 1941 fizeram uma mala pequena para mim e me mandaram com uma família não judia para a Saboia” (leste da França), recorda.
“Não guardo rancor dos franceses, devo a eles a minha vida”, afirma, mostrando fotos de sua “família francesa”.
Ela tinha 12 anos quando seu pai foi buscá-la, em setembro de 1944.
Berthe Badehi radicou-se em Israel 1956 e agora garante estar “decepcionada ao ver a volta do ódio contra os judeus, como na minha infância”.