Quantas vezes você já escutou a frase “desta vez vai ser diferente”? Buscamos racionalizar qualquer distúrbio no status quo colocando-o no contexto presente e evidenciando condições de contorno atuais que tornam o problema diferente dos mesmos tipos de problema que já foram enfrentados no passado. Nos dias de hoje, em que ser disruptivo parece ser condição necessária para a sobrevivência, estamos anestesiados em pensar que é natural que o que nunca aconteceu antes vai acontecer agora.

O tão almejado pouso suave da economia, o soft landing que os economistas tanto discutem, é algo que nunca foi alcançado antes na história. Todas as vezes em que uma economia enfrentou uma guerra contra a inflação usando como arma e munição a política monetária, ou seja, juros altos e redução de liquidez, o resultado subsequente é uma recessão.

O exemplo mais recente aqui nos Estados Unidos foi o combate à inflação entre as décadas de 1970 e 1980. Em fevereiro de 1971, em uma prestação de contas ao Congresso americano, Richard Nixon escreveu: “Estamos enfrentando o maior teste econômico do pós-guerra. É um teste da nossa habilidade em eliminar a inflação sem colocar a nossa economia de mercado na estagflação do desemprego”. Em 1971 a inflação americana estava na casa dos 5,5%, e Nixon buscava, em seu estilo rebuscado na escrita, o soft landing. Como sabemos, Nixon falhou.

Políticas gradualistas de combate à inflação acabam dando o resultado inverso ao desejado. Essa foi a lição dos anos 70, e somente quando Paul Volcker assumiu o comando do FED, em 1979, o jogo começou a virar. Volcker levou a taxa de juros americana a 12%, e a manteve em patamares elevados por vários anos causando uma forte recessão e quebrando bastante coisa pelo caminho. Essa lição, bastante dura, segue muito clara na cabeça dos banqueiros centrais americanos de hoje.

“Como a classe política é incontrolável em qualquer país, o trabalho sujo fica na mão da política monetária sem qualquer ajuda do lado fiscal

O FED atual segue os passos de Volcker. Sua missão mais relevante é o combate à inflação em uma economia aquecida pelos estímulos fiscais desde a pandemia. Sim, a situação é diferente da enfrentada no final dos anos 70, mas o remédio é o mesmo e, por consequência, os efeitos colaterais também.

Os economistas voltam a falar em soft landing porque os efeitos do aperto monetário aplicado pelo FED ainda não foram sentidos. O desemprego segue em patamares historicamente baixos, as vendas no varejo seguem robustas e há projeções indicando que o PIB americano está crescendo muito além do PIB potencial. Os mercados começaram a acreditar que desta vez vai ser diferente. Se Nixon estivesse vivo, diria que estamos enfrentando o maior teste da nossa habilidade em combater a inflação sem causar desemprego e, a seu estilo, diria que estamos passando com nota 10.

Os ciclos econômicos são muito claros. Eles funcionam como pêndulos. Afrouxamentos monetário e fiscal, como os que tivemos durante a pandemia, causam inflação que é combatida com apertos monetário e, idealmente, fiscal. Como a classe política é incontrolável em qualquer país, o trabalho sujo fica na mão da política monetária sem qualquer ajuda do lado fiscal. Apertos monetários rápidos e agressivos, como os recentes, causam recessão e quebram coisas pelo caminho. É inevitável. Para consertar o estrago, o FED afrouxa a política monetária e baixa juros, e começa tudo de novo. O sistema é imperfeito, mas é o melhor considerando-se as alternativas.

Ah, mas a geração atual é especial e disruptiva e desta vez vai, de fato, ser diferente. Em seu tempo, Nixon achava o mesmo. Tomara.

Norberto Zaiet é economista, ex-CEO do Banco Pine e fundador da Picea Value Investors, em Nova York