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“Os dois grupos econômicos que estão com Alckmin concordam em 80% dos temas”

 

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“O Lula teve sorte com o crescimento mundial. Ele não teve mérito nenhum”

 

DINHEIRO ? O que muda com a saída de Antonio Palocci do Ministério da Fazenda?
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
? O Lula ficou sem fiador para a disputa pelo novo mandato. O mercado confiava no Palocci, e o PT não tem outro nome para fazer uma boa substituição. O Palocci foi quem garantiu a política econômica do governo Lula. Para conduzir a economia até o final do mandato, nada deverá ser alterado. Mas, para disputar a reeleição, o PT tem um problema.

DINHEIRO ? É suficiente para gerar incerteza ao mercado?
MENDONÇA DE BARROS
? Para o mercado, a ausência do Palocci abre uma insegurança que não existia: o risco eleitoral. Até então, o mercado estava vendo um confronto entre o Alckmin e o Lula, mas sabia que, em relação aos fundamentos da economia não haveria grandes mudanças. Então, desconsiderava-se o risco eleitoral.

DINHEIRO ? Havia solução melhor para esta crise?
MENDONÇA DE BARROS
? A saída do Palocci tem um componente político que é difícil de avaliar. Eu posso dar a minha opinião. Acho que ele já saiu tarde. Deveria ter saído mais cedo. Assim, conseguiria evitar desgaste à sua imagem. A demora para deixar o cargo só demonstra a importância que ele tinha para o governo. O presidente reconhecia que seu sucesso vinha da política escolhida por Palocci.

DINHEIRO ? O ministro Guido Mantega, que já manifestou posições antagônicas às de Palocci, aumenta a instabilidade?
MENDONÇA DE BARROS
? Nestes quase quatro anos, o grande mérito do Palocci foi ser médico e não economista. Pelo fato de não ser profissional da área, ele escolheu uma equipe correta e homogênea (para a Fazenda). Já o Mantega é economista. Tem as suas opiniões, que pelo que conhecemos são contrárias aos pontos centrais da política econômica atual.

DINHEIRO ? Isto é perigoso?
MENDONÇA DE BARROS
? Talvez o Mantega esqueça essas contradições e, simplesmente, faça tudo o que o Lula mandar. Isso pode ser positivo porque o Lula vai querer manter os fundamentos da economia. Além disso, temos que lembrar que o Banco Central tem a sua independência. É evidente que o Lula e o Mantega vão se empenhar para vender para o mercado a idéia de que nada muda. Mas mudou. Afinal, sabemos que a força política do Palocci era crucial para o governo.

DINHEIRO ? O senhor será o coordenador econômico da campanha de Geraldo Alckmin? Com uma proposta desenvolvimentista?
MENDONÇA DE BARROS
? O PSDB tem o privilégio de ter dois grupos de técnicos econômicos. O Alckmin acabou de se lançar candidato. Ele ainda tem tempo para discutir as propostas. Pode, inclusive, escolher vários caminhos.

DINHEIRO ? O programa econômico divide o seu grupo daquele conhecido como monetarista?
MENDONÇA DE BARROS
? Os dois grupos concordam em 80% dos pontos que precisam ser mudados na economia. A discussão que existe é mínima do ponto de vista dos fundamentos. É mais uma questão de estilo. Podemos resumir dizendo que um modelo é mais asiático e o outro é mais mexicano. Isso mostra a sofisticação econômica do PSDB.

DINHEIRO ? Os indicadores econômicos mostram avanço durante o atual governo. Há muito o que mudar?
MENDONÇA DE BARROS
? O PT pegou um software pirata para administrar a economia. O programa que eles usam é do PSDB. Só que software pirata tem um problema. Ele congela a tecnologia. É o PSDB que tem os técnicos para desenvolver esse programa. O mundo hoje, comparado ao que existia em 1995, é completamente diferente. O PT, porém, não atualizou o programa. Continua aplicando a mesma fórmula. Não percebeu que o mundo estava crescendo e que ele poderia ser mais ousado, inclusive nos juros. Até 2001, o Brasil tinha uma falta de dólar da ordem de US$ 15 bilhões por ano. Hoje, o País tem um excesso da ordem de US$ 30 bilhões. Mas o PT não percebeu a diferença. Essa mudança permite a aplicação de um software mais moderno.

DINHEIRO ? Que recursos há no software de vocês para fazer o Brasil crescer?
MENDONÇA DE BARROS
? Queremos gerir a economia de acordo com a realidade atual favorável. Sair do juro elevado. Afinal, para que serve o juro alto? É exatamente para não deixar o Brasil crescer. Não precisamos mais dele. O Brasil tem condições de crescer 5% ao ano durante um longo período. Mas para isso é preciso ter uma mudança na política fiscal.

DINHEIRO ? O superávit primário de 4,25% já não garante austeridade?
MENDONÇA DE BARROS
? Não. Ao aumentar a carga tributária em cerca de 1%, o governo pôde passar a gastar mais sem impactos sobre a meta fiscal. Isso é uma armadilha. É possível ter um superávit primário grande e continuar gastando muito com contratação de pessoal e aumento a alocação de recursos para diversas áreas. Como no caso do crescimento explosivo do programa Bolsa Família. Tudo isso foi financiado com aumento de impostos. É fundamental um controle de gastos.

DINHEIRO ? Este diagnóstico é quase consensual. A questão é como tirá-lo do papel.
MENDONÇA DE BARROS
? A proposta do PSDB é adotar o déficit nominal como indicador da situação fiscal. Ou seja, considera-se tudo: despesa do governo, juros e receitas. Os governos do PSDB mostraram que é possível fazer esse ajuste via redução de despesas. O Aécio Neves (governador de Minas Gerais), o Alckmin e o José Serra (prefeito de São Paulo para concorrer ao governo do Estado) fizeram isso. Então, temos a prova de que a estratégia é viável.

Ag. O Globo

  

?O Lula teve sorte com o crescimento mundial. Ele
não teve mérito nenhum?

 
 

DINHEIRO ? Qual o diagnóstico tucano para o problema do câmbio?
MENDONÇA DE BARROS
? O Brasil sofre do que chamamos de doença de rico. Como está sobrando dólar, há uma tendência da nossa moeda se valorizar. Só que isso é terrível para o desenvolvimento de um país que quer crescer com as exportações. O governo do PT, que usa software pirata, também não percebeu que este câmbio é um risco. A primeira vez que este fenômeno apareceu na literatura econômica foi na Holanda, um pouco antes da crise do petróleo. A Holanda tinha reservas de gás muito grandes, que geravam muita receita com exportações. Com isso, a moeda holandesa se valorizou muito rápido e quebrou a indústria, que ficou com preços impraticáveis. Alguns anos depois, o gás acabou. A Holanda ficou sem gás e sem indústria. Hoje, o Brasil enfrenta situação semelhante. Só que o PT não tem a menor idéia do que está acontecendo.

DINHEIRO ? Como se sai dessa armadilha?
MENDONÇA DE BARROS
? É preciso equilibrar a balança comercial. Para isso, é fundamental aumentar as importações. Mas o País só consegue comprar mais no exterior se crescer.

DINHEIRO ? As taxas de crescimento atuais não são inferiores às do governo Fernando Henrique.
MENDONÇA DE BARROS
? O PSDB enfrentou várias crises econômicas mundiais, que travaram os planos de crescimento. Hoje, o Brasil é um países que tem mais dólar do que dívida. Está entre os menores riscos do mercado. O PT ganhou esse bônus, mas não teve a capacidade de entender direito o que estava acontecendo. Os indicadores econômicos atuais não são mérito do Palocci nem do Lula. O único mérito deles foi manter o projeto econômico do governo passado. E tiveram a sorte de contar com um momento de crescimento mundial extraordinário.

DINHEIRO ? Se a política econômica é a mesma, não é natural que os resultados sejam semelhantes?
MENDONÇA DE BARROS
? Dentro do novo cenário, eles poderiam ter feito mais. O Brasil levou de graça uns US$ 40 bilhões de saldo comercial graças ao aumento dos preços internacionais do ferro, da soja e de outras commodities. O Lula apresenta a expansão da economia como seu ponto forte, mas isso não é verdade. O País está crescendo a mesma coisa que cresceu no ciclo de baixa da economia mundial. O crescimento econômico é muito menor do que poderia ser em função do cenário internacional. O Lula teve sorte. Não teve mérito nenhum.

DINHEIRO ? A cobrança tucana por juros mais baixos não contrasta com as taxas praticadas na gestão FHC?
MENDONÇA DE BARROS
? Na época do governo Fernando Henrique, em função das crises mundiais, era como se o Brasil estivesse com o coração fraco. Não poderíamos exigir muito dele. A falta de dólar gerava instabilidade. Hoje é diferente, o cenário econômico favorece o crescimento. O PT não deixa o Brasil crescer como deveria porque gere a economia olhando para trás. Como se o País enfrentasse os mesmos problemas do passado. Temos que aproveitar o crescimento mundial, porque esta expansão não é para sempre.

DINHEIRO ? Como o lado social entra na equação econômica do PSDB?
MENDONÇA DE BARROS
? Um crescimento da ordem de 5% ao ano afetaria positivamente a vida do brasileiro. Não via transferência de renda, mas via salário. Para uma parcela da sociedade, esse crescimento vai demorar a chegar via salário. Então, ainda serão necessários os programas sociais. Mas visando que a próxima geração já não dependa de subsídios. Só que para isso acontecer é preciso baixar os juros e investir.

DINHEIRO ? O Brasil está preparado para crescer 5% ao ano sem o risco da volta da inflação?
MENDONÇA DE BARROS
? Em uma sociedade acostumada a trabalhar com juros muito altos, quando ocorre uma redução das taxas há um estímulo muito grande ao consumo. O poder de compra da população aumenta muito. O brasileiro transforma quase imediatamente esse ganho em consumo. Como o controle da inflação é uma das condições necessárias para estarmos inseridos no comércio mundial, este efeito colateral pode ser um problema. Mas um economista resolve isso de uma maneira muito fácil. Para administrar este aumento da demanda, a teoria econômica diz que uma das ferramentas que podem ser utilizadas é o controle do gasto público. Com isso, o Banco Central terá mais segurança nesse processo de redução dos juros. Além disso, se reduzir os gastos, o País pode também diminuir os impostos. O governo atual gasta muito mal.