26/11/2008 - 8:00
A TRAJETÓRIA DOS FUNDOS multimercados com renda variável nos últimos meses tem sido marcada pelo tímido rendimento da maioria das carteiras e pelo reinado absoluto do Sparta Cíclico. O fundo lidera a categoria com uma vantagem avassaladora em relação aos demais concorrentes. Até o dia 11 de novembro, segundo o ranking da DINHEIRO, o Sparta Cíclico marcava 201,05% de rentabilidade em 12 meses. O segundo colocado, o Unibanco Equity Hedge, aparecia com 29% de alta no período. Na semana passada, o Sparta Cíclico em 12 meses estava mais tímido: “apenas” 177,77% de alta, conforme as informações fornecidas pela TAG Investimentos (ver página 104). O resultado excepcional não é uma aberração momentânea. O fundo se mantém no topo há meses consecutivos e parece estar longe de perder a majestade. Seu gestor, o paulistano descendente de libaneses e lituanos, Victor Abou Nehmi Filho, 50, comanda a Sparta Fundos, criada em 2005, e não acredita em milagres na hora de avaliar os resultados de seus produtos. “Nossas posições já estavam ‘hedgeadas’ (com proteção contra quedas) antes de o mercado brasileiro apresentar tendência negativa”, conta. Em uma terça-feira nublada de novembro, em que o Ibovespa cravou 4,5% de baixa, Nehmi recebeu a DINHEIRO em seu escritório e falou tranqüilamente sobre sua história.
A Sparta nasceu de maneira quase despretensiosa na vida da família Nehmi. Com um diploma de engenheiro agrônomo da ESALQ-USP, Victor Nehmi saiu da universidade diretamente para o Grupo Bonfiglioli (dono da marca Cica), onde ficou por quase dez anos cuidando do setor de investimentos agropecuários. Fez pós-graduação na FGV e esteve presente no primeiro pregão da BM&F, há 28 anos. Por isso, conhece o mercado de boi gordo como poucos. Tanto que, ao deixar o grupo, Nehmi foi por muitos anos pecuarista e sócio da FNP, uma consultoria de agronegócio posteriormente vendida para a multinacional inglesa Agra Informa. Paralelamente, fazia a gestão da carteira de investimentos de sua família e de pessoas próximas.
Somente em 2005, com o lançamento do fundo Sparta Cíclico, e logo depois o Anti-Cíclico, é que a Sparta deixou o caráter familiar e se tornou realmente uma pequena gestora. Com um investimento mínimo de R$ 5 mil, qualquer um podia aplicar em seus fundos, compostos basicamente por ações blue chips, contratos de boi gordo, café, soja, açúcar, milho, índice futuro, dólar futuro e outros índices de mercados internacionais. “No primeiro ano, a captação foi só de sócios, amigos e parentes”, relembra Nehmi. No entanto, a rápida subida do Sparta Cíclico entre os rankings de multimercados foi uma vitrine para a gestora. “No segundo semestre de 2006, começamos a ter novos investidores atraídos pela rentabilidade do fundo”, conta. No final daquele ano, os aplicadores eram mais de 30. Um ano depois, já ultrapassavam 200. Este ano, chegaram a 4.100. O patrimônio sob gestão subiu para R$ 250 milhões. A incerteza dos mercados, no entanto, espantou alguns. Hoje, o número aproximado de clientes é 3.900. A popularidade também fez com que o valor mínimo de aplicação subisse para R$ 10 mil em julho deste ano. “Tínhamos um volume cada vez maior de pessoas, algumas com um perfil não totalmente adequado para investir em fundos alavancados. E também não estávamos conseguindo atender tanta gente”, conta Nehmi. Assim mesmo, a Sparta continua tendo cerca de dez a vinte novos clientes por dia. A carência para o resgate das aplicações é zero.
Rentabilidade acima da média do mercado, investimento inicial relativamente baixo e carência inexistente. Isso é tudo que o investidor frustrado com a Bolsa gostaria de ter hoje. No entanto, o próprio Victor Nehmi adverte para as implicações de se investir em um fundo alavancado. “Não estamos livres do risco. Ninguém está. Mas justamente porque nossa exposição ao risco é maior, é que o nosso controle de risco também é”, explica. São quatro sistemas tecnológicos que monitoram todas as operações. Dois ficam dentro da própria Sparta e dois são externos. No controle, oito engenheiros, dos quais cinco são formados pelo ITA. Dois deles são Ulisses e Artur Nehmi, filhos de Victor. “Não é por coincidência que nossos fundos se safaram da crise. Investimos nessa área e nossa equipe é mais voltada para o controle de risco do que para o próprio trade”.
Sobre sua estratégia, Nehmi não revela muito. Junto com o Guepardo FIA e o Fundo Verde da CSHG, é um dos poucos que investe em commodities agrícolas e boi gordo. No entanto, 67% da carteira do Sparta Cíclico, seu fundo principal, está em ações da Petrobras, Vale, CEMIG e Usiminas (leia quadro). Nesse pedaço da carteira, não se faz alavancagem. Todo o resto é composto de investimentos em derivativos financeiros e agrícolas, como dólar futuro, índice futuro, euro futuro, S&P 500 futuro, boi gordo, soja, café, milho e açúcar. São 15 os mercados explorados pelos “espartanos”. “O que varia é se estamos comprados ou vendidos”, explica. Enquanto empresas engolem o prejuízo de terem apostado na queda do dólar, a Sparta celebra. Desde 2007, quando a crise do subprime dava suas primeiras baforadas em Wall Street, a gestora passou a apostar na alta da moeda. “Éramos a ponta inversa. Se todas essas empresas perderam, alguém ganhou. E quem ganhou foram alguns fundos que estavam posicionados a favor da alta do dólar”, explica. A previsão da Sparta foi certeira. “O mundo era financiado com os dólares que estavam sendo alavancados nos EUA. Já esperávamos que eles viriam cobrar esses dólares de volta para pagar suas dívidas”, pondera.
Desde a última semana, a Sparta conta com três fundos. Os já conhecidos Cíclico e Anti-Cíclico, que têm composição semelhante, mas estratégias diferentes: o primeiro segue movimentos e tendências de longo prazo e o segundo oscila conforme a volatilidade do mercado. O terceiro, o Sparta Flex FIA, foi lançado na última quarta- feira 19, e é o primeiro fundo de ações da gestora. Com investimento mínimo de R$ 5 mil reais, ele foi criado para os investidores amedrontados com o risco. “O fundo terá alavancagem zero”, diz. A carteira será composta por 80% das mesmas quatro bluechips dos multimercados, e 20% serão de bluechips boas pagadoras de dividendos. Com o salto de clientes, o próximo passo é a expansão da sede da Sparta, que agora ocupará um andar inteiro de um amplo edifício comercial no bairro de Moema, em São Paulo. Sobre fechar para captação seu principal fundo, que hoje possui um patrimônio líquido de R$ 233 milhões, Nehmi não acha que será necessário. “Somente se chegarmos a R$ 1 bilhão. Por enquanto, o tamanho do patrimônio não atrapalha a gestão”, diz. Enquanto o bilhão não chega, o engenheiro agrônomo que cuida do fundo mais rentável do País continua sua rotina. Abandonou a vida de pecuarista e, em seu tempo livre, pinta quadros, que ficam espalhados pelas salas da gestora. “É um hobby. Quase todos na minha família pintam também”, conta. Pintam e investem na Sparta.