09/06/2024 - 15:06
Com um placar apertado, o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou recursos envolvendo uma condenação da União ao pagamento de indenização bilionária por causa do não cumprimento de um contrato fechado em 1950, sobre a entrega de 200 mil pinheiros adultos. O pedido era para que o Supremo debatesse se seria possível rever a condenação, já definitiva, considerando que a perícia sobre o valor dos pinheiros estaria, segundo a União e o Ministério Público Federal, “viciada”.
Por seis votos a cinco, o STF negou seguimento – sequer analisando o mérito – de recursos que foram impetrados pelo Ministério Público Federal e a União contra uma decisão dada pela ministra Rosa Weber, hoje aposentada. A magistrada já havia, em decisão monocrática, negado analisar os apelos sob o argumento de que não haveria afronta à Constituição no caso e que seria necessário reexaminar fatos e provas – o que, segundo Rosa, não seria possível segundo a jurisprudência do STF.
O ministro Dias Toffoli inaugurou corrente divergente no julgamento e defendeu que o recurso tramitasse normalmente na Corte máxima. Tal posicionamento foi acompanhado pelos ministros Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Luis Roberto Barroso e Edson Fachin. A corrente vencedora, no entanto, é a de Rosa Weber, que foi seguida pela ministra Cármen Lúcia, e os ministros Gilmar Mendes, André Mendonça, Luiz Fux e Kassio Nunes Marques (que deu voto decisivo no caso).
O debate teve início em uma ação civil pública que a Procuradoria e União moveram pedindo a anulação de uma decisão que mandou a União a pagar indenização equivalente a 200 mil pinheiros que não foram entregues no bojo de um contrato de compra e venda fechado em dezembro de 1951 entre a Superintendência das Empresas Incorporadas ao Patrimônio Nacional (SEIPN) – sucedida pela União – e a Companhia de Madeiras do Alto Paraná S.A.
Foi questionada uma relação jurídica no caso, sendo que, se ela fosse derrubada, a indenização também seria. Além disso, a ação apontou “flagrante erro material” na perícia realizada na ação, quando do cálculo do valor de cada “pinheiro adulto”, o que resultou – segundo a AGU e o MPF – em uma “indenização astronômica”. Os órgãos pediam que o valor fosse corrigindo, tomando por base o valor dos pinheros “ao tempo” do laudo.
Em primeiro grau, o pleito foi atendido e o laudo contestado foi declarado “imprestável”, com a ordem para que a indenização fosse fixada seguindo o valor real dos pinheiros adultos “ao tempo” do da perícia, em fevereiro de 1985. Depois, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região determinou a realização de uma nova perícia.
Em meio ao imbróglio, o STF analisou uma parte do caso, determinando uma perícia judicial, a qual foi homologada em março de 2017 pelo juízo da 4ª Vara Federal de Curitiba. Na ocasião, a prova técnica definiu em Cr$ 56.000,00 o valor do pinheiro em pé, em fevereiro de 1985. Segundo a AGU, o valor levaria a um total de R$ 4 milhões, em outubro de 2002, sendo que o precatório inicial do caso – que chegou a ser suspenso pelo STF – era de R$ 300 milhões.
No entanto, o caso sofreu uma nova reviravolta no Superior Tribunal de Justiça, que reformou o acórdão do TRF-4 e julgou improcedente o pedido da AGU e da Procuradoria. A avaliação foi a de que não havia conflito aparente de normas constitucionais que justificasse a “relativização da coisa julgada” – a indenização que havia sido determinada.
Assim, o tema do recurso no STF passou a ser a possibilidade de ajuizamento de ação civil pública, para questionar valor que foi fixado, contra a União, a título de indenização, “com fundamento em laudo pericial reconhecidamente eivado de erros grosseiros, quando expirado o prazo da ação rescisória, considerados os princípios da motivação das decisões judiciais, da justa indenização, da moralidade e da razoabilidade”.
A Advocacia-Geral da União, por exemplo, alegou ao STF suposta violação da regra constitucional de que todas as decisões devem ser legitimamente fundamentadas. Isso por que, segundo o órgão, a decisão do STJ está relacionada a um “laudo pericial viciado e redunda no pagamento de indenização exorbitante”.
A AGU diz que o documento apresenta “inequívocos erros crassos” e haveria ainda afronta aos princípios da moralidade e da razoabilidade no caso. Pedia que o STF definisse se o fato de a indenização ser fixada com base em “perícia viciada” autorizaria ou não a “relativização da coisa julgada” – revisão de uma condenação que já se tornou definitiva.
“Debate-se, no presente feito, se a União deverá pagar quase um bilhão de reais – por se entender que o valor da indenização se encontraria acobertado pela coisa julgada, não podendo ser rediscutido em sede de ação civil pública -, a despeito da incontroversa existência de erros crassos existentes no laudo pericial que levaram a um montante indenizatório muito maior do que aquele efetivamente devido”, indicou o órgão no recurso agora negado pelo STF.