26/09/2014 - 20:00
Cuidado, a Receita Federal está de olho em sua bagagem de viagem. Logo após o Banco Central ter confirmado que agosto foi o segundo mês na história em que os brasileiros mais gastaram no exterior, atrás apenas de julho, a Receita anunciou a criação de um novo sistema de fiscalização nas fronteiras. A partir do ano que vem, todos os produtos adquiridos em viagens internacionais que entrarem no País serão examinados com lupa pelo Leão. A bem da verdade, nem todas as compras. As regras atuais continuam válidas: é permitido gastar US$ 500 isentos de impostos em trajetos aéreos e marítimos e US$ 300 por via terrestre em produtos de uso pessoal como roupas, livros e itens de beleza.
Desde que não sejam dúzias da mesma camiseta, em cores e tamanhos variados, que seriam os presentes para o pai, irmão, irmão do vizinho, vizinho do vizinho. As malas dos turistas são a chave desse sistema, que pretende tornar-se um grande banco de dados, com informações variadas, de características pessoais a comportamento de compras dos viajantes. Isso, claro, permitirá à Receita, em pouco tempo, saber com antecipação aquilo que você deve comprar que ainda não faz parte dos seus itens pessoais. Ou, mesmo, fazê-lo desistir de algum produto que você traz em todas as viagens, não usa e deve revender.
No fundo, o problema é mais do que um simples controle de acesso ao que pode e ao que não pode entrar no País. A Receita quer apreender a carga dos muambeiros, que fazem a festa lá fora e trazem produtos ilegais em quantidades proibidas pela legislação brasileira. É no comércio ilegal que o Fisco está de olho. Como zeladora da arrecadação federal, a Receita precisa estancar os descaminhos da sonegação de impostos. Embora o PIB esteja rodando a uma taxa anual próxima de zero, de janeiro a agosto deste ano os turistas deixaram US$ 17,3 bilhões em compras em suas viagens internacionais, 4% a mais do que no mesmo período do ano passado, quando a expansão do PIB foi de 2,3%.
Os gastos seguiram em ascensão mesmo com o aumento, neste ano, do IOF de 0,38% para 6,38% nas compras com cartão de crédito no exterior. Se há muita gente consumindo além das fronteiras, significa que o recolhimento de impostos no País está sendo prejudicado, com menos dinheiro nos cofres da União – de janeiro a agosto, a arrecadação cresceu meros 0,64%. Embora seja justa a preocupação em reduzir a sangria na arrecadação e punir os contraventores, o problema é o efeito colateral da ação da Receita, ou seja, uma generalizada invasão de privacidade. Com a nova tecnologia, as companhias aéreas serão as principais informantes dos fiscais e auditores. Quantidade e peso da bagagem, duração da viagem e até o número do assento no voo deverão ser passados na ida e na volta, para serem comparados.
Por enquanto, não há nenhuma confirmação de necessidade de um relatório do fiscal do raio x sobre os itens abertos e fechados e as roupas limpas e sujas que estão na bagagem. Aquela estratégia do turista de levar uma mala pequena, com praticamente só a roupa do corpo, para se acabar em compras de tudo e mais um pouco, parece mesmo com os dias contados. A cereja do bolo desse sistema é o registro do rosto do passageiro na saída e na chegada ao País. A felicidade na ida e a preocupação com as contas na volta ficarão registradas. Essa expressão poderá incriminá-lo e levá-lo diretamente para a fila da verificação. É a máquina da verdade da Receita que fará a identificação dos suspeitos, meliantes e pagadores de impostos. Em nome, claro, de uma maior eficiência no desembarque.