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“Este processo está sendo planejado há alguns anos e todos conversamos sobre isso”


AOS 7 ANOS DE IDADE, ELE APROVEItava as férias escolares para ajudar o pai na empresa da família montando caixas de papelão para sapatos. Com 12 anos, passou a dar expediente na linha de produção aprendendo a fazer desde a costura até o acabamento das peças. Dois anos depois, mais precisamente aos 14, foi estudar em Boston; com 16, partiu para a Itália; e ao completar 18 anos deu seus próprios passos criando a marca de sapatos Schultz, que, em 2008, faturou R$ 138 milhões. Agora, Alexandre Birman, 32 anos, vice-presidente do grupo Arezzo, se prepara para dar o maior salto de sua carreira. Em 2011, ele assumirá a presidência da companhia, um dos maiores conglomerados de calçados do País, com faturamento de R$ 485 milhões em 2008 – 35% a mais do que em 2009 -, hoje comandado por seu pai, Anderson Birman, 55 anos. “Esse é um assunto natural. Ele conquistou respeito ao construir a marca dele e estamos discutindo esse processo de sucessão”, diz Anderson Birman, presidente do grupo Arezzo. É natural porque Alexandre cresceu respirando sapatos, pensa neles 24 horas por dia, sabe como funciona o mercado e não é visto apenas como o herdeiro, pois trilhou o próprio caminho com a Schultz e provou que sabe fazer negócios. É muito discutido porque a companhia tem passado por uma das mais profundas mudanças desde que foi criada pelos irmãos Anderson e Jefferson Birman em 1972.

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Em 2007, depois de comprar a participação do irmão na Arezzo, Anderson arquitetou a união com a Schultz, originando o grupo Arezzo, e vendeu 25% da nova empresa por R$ 76,3 milhões para a Tarpon, gestora de recursos que administra US$ 1,1 bilhão. A partir daí, o grupo passou a apostar na diversificação de marcas, criou uma nova grife de luxo com o nome de Alexandre Birman e o projeto de uma nova marca está sendo implantado. A ideia é cobrir todos os segmentos: a Arezzo, com 230 lojas franqueadas no Brasil e no Exterior, vende sapatos que custam, em média, R$ 160; a Schultz, com oito unidades no País e exportações que já representam 40% do seu faturamento, vende calçados com um apelo mais fashion a um preço médio de R$ 230; já a Alexandre Birman, uma marca cujo nicho de mercado é o luxo, ostenta modelos de produção mais artesanal, com preços que variam de R$ 400 a R$ 800. Os novos passos do grupo se darão por meio da extensão da grife Arezzo para as linhas Uomo, com sapatos masculinos, e Bambini, com produtos para crianças. “Isso está nos nossos planos”, diz Alexandre. Ao mesmo tempo, silenciosamente, o grupo lançou a marca Ana Capi, que já possui duas lojas de rua. Alexandre não dá pistas do novo negócio, diz apenas que é um novo modelo de varejo. No mercado, entretanto, comenta- se que é uma grife que atuará com preços mais acessíveis. “A segmentação de mercado é cada vez mais imperativa”, diz Eugênio Foganholo, da Mixxer Desenvolvimento Empresarial, consultoria especializada em varejo. “Isso faz com que a empresa tenha mais sucesso atendendo cada tipo de cliente de uma maneira diferente.”

 

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EXPANSÃO E IMAGEM: loja da Arezzo na China (à esq.) e campanha da grife com as atrizes Claudia Raia, Mariana Ximenes e Patrícia Pillar

 

O que faz com que as marcas tenham sucesso em suas áreas de atuação é a forma como são administradas. Elas possuem executivos, distribuições e estruturas diferentes. A Arezzo, por exemplo, trabalha com franquias e já cravou presença na China, onde possui cinco lojas e pretende abrir mais 300 até 2016. A Schultz tem oito lojas próprias, vende em mil multimarcas no Brasil e em 300 pontos no Exterior. A Alexandre Birman não possui loja e é encontrada em locais de alto luxo como a paulistana Daslu e as americanas Bergdorf & Goodman e Neiman Marcus. Em breve, diz Alexandre, novos canais de distribuição serão explorados pelo grupo. “Estamos estudando a entrada na internet e até mesmo a venda por catálogo”, explica. Pode parecer estranho, mas as vendas de porta em porta, nos moldes das empresas de cosméticos Natura e Avon, já são adotadas por empresas de calçados em outros lugares do mundo. “No México, 70% das vendas de sapatos acontecem via catálogo”, afirma Birman. A estratégia vislumbrada pelo grupo faz todo o sentido. “No segmento de roupas isso já acontece, mas isso funcionaria com uma marca diferente e com um determinado conjunto de produtos”, diz Cláudio Felisoni, coordenador do Programa de Administração de Varejo da Fundação Instituto de Administração da USP (Provar-FIA).

Antes de pôr em prática a maioria desses projetos, o grupo tem, evidentemente, como grande desafio vencer os obstáculos da crise econômica. Os esforços para isso já estão sendo feitos: os salários dos diretores serão atrelados a resultados no fim do ano, os gastos com telefonia reduzidos de R$ 180 mil mensais para R$ 80 mil e a compra de matéria- prima, como o couro, está sendo muito mais planejada. “Vamos vender uma bota que no ano passado custava R$ 399 e agora sairá por R$ 299”, diz Alexandre. O segredo dessa equação é que, baseada em estudos de mercado e de comportamento, a empresa tem quase certeza que o produto fará sucesso. Com isso, consegue comprar mais por um preço menor. Até o planejamento do espaço físico dos escritórios entrou no pacote. O grupo criou o programa At Home, que consiste em dar suporte para que alguns de seus funcionários trabalhem em casa, permitindo, assim, uma economia de 300 metros quadrados de espaço e, consequentemente, de aluguel. “Nos tempo de crise, pensamos no que sempre deveríamos ter feito”, afirma Alexandre, que está sendo preparado para o comando desde que nasceu.

O processo sucessório dentro dos corredores do grupo não é de hoje. “Sempre acompanhei tudo sobre o tema, lia muitos artigos do João Bosco Lido”, diz Anderson Birman, referindo-se ao famoso professor da Fundação Getúlio Vargas. Há cinco anos, bem antes da associação com a Tarpon e com a Schultz, Anderson contratou o consultor José Ernesto Bologna, da empresa Ethos, especializada em sucessão familiar. “Prestei uma série de consultorias nas áreas de gestão, desenvolvimento de liderança e foco no modelo de negócios”, afirma Bologna Depois, já com a Tarpon no negócio, Bologna tratou de ajudar a unir a cultura da Arezzo com a da Tarpon. “Isso mudou a perspectiva empresarial do Alexandre”, diz Bologna. Ou seja, se antes ele tinha uma cultura de negócio baseada na visão do dono, passou a enxergar a empresa com uma visão mais global. Afinal, tem que prestar contas aos acionistas. “Ele é um jovem talentoso, tem uma boa visão comercial e de mercado”, explica Bologna. “O que falta, e ele está aprendendo, é uma linguagem mais acadêmica de negócios e de administração.” Para suprir isso, além da ajuda de Bologna, Alexandre conta com a experiência de seu pai, que irá para a presidência do conselho. “Estarei mais presente na estratégia da empresa, tenho que dar espaço para os mais jovens”, diz Anderson Birman. “Tenho certeza que Alexandre poderá e fará essa empresa crescer mais.”