13/01/2010 - 8:00
Curinga é uma função muito específica no futebol. O jogador que é chamado dessa maneira tem habilidade e capacidade técnica para desempenhar bem uma série de funções. Em um jogo pode ser atacante, no outro defensor, dependendo da estratégia do técnico. Os fundos multimercado são os curingas do mercado de capitais. Podem utilizar ativos de renda fixa e de renda variável e mesclar entre a agressividade e a prudência conforme as adversidades e o comportamento dos ativos. Até 2009, era mais difícil para o investidor compreender a estratégia dos multimercado oferecidos pelos bancos. Para facilitar o processo de decisão dos aplicadores, a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), responsável pela autorregulação do setor, acabou com a classificação padrão de multimercado com e sem renda variável. Desde o ano passado, essa categoria passou a jogar com uma nova classificação. As duas antigas separações foram abertas em sete: macro, juros e moeda, multiestratégia, multigestor e estratégia específica são as mais populares, enquanto trading e capital protegido ainda estão na fase do reforço muscular.
A nova divisão foi benéfica aos investidores e, principalmente, às gestoras. “Quanto mais o cliente souber qual é o tipo do fundo que está comprando, melhor será a sua capacidade de comparação”, diz Luís Soares, superintendente-executivo da Bradesco Asset Management (Bram). O ano de 2008 foi terrível para os fundos multimercado. A rentabilidade ruim assustou muitos investidores, que desconheciam o nível de risco de suas carteiras.
A somatória da rentabilidade com os resgates foi a redução dos patrimônios. A perda líquida (depósitos menos saques) total foi de R$ 55 bilhões. No ano passado, houve a virada nas duas frentes: o retorno ficou próximo ou acima do CDI e a captação líquida chegou a R$ 35,3 bilhões, com uma grande concentração de entrada de recursos no segundo semestre.
“Os fundos estão menos correlacionados entre si e com mais opções de estratégia”, diz Otávio Vieira, diretor de investimentos do Safdié Gestão de Patrimônio. E variedade é o principal instrumento para os que estão classificados como multigestor.
Sua função é ter uma cesta de outros fundos dentro da carteira. A performance depende do acerto da escolha e da estratégia dos outros gestores.
Na outra ponta, a estratégia específica depende de uma tática certeira do próprio gestor, que não conta com muitas alternativas. “A estratégia específica é uma renda fixa mais sofisticada”, afirma Arturo Profili, gestor da Capitânia. “O retorno desses fundos é mais próximo da renda fixa do que o dos multimercado”, compara André Vainer, gestor da XP Investimentos. O melhor fundo dessa categoria em 12 meses é o XP Financial fiMultimercado, que opera apenas um ativo de renda fixa. Sua proposta é financiar a compra de operações a termo na bolsa de valores pelos clientes da XP Corretora. O empréstimo é feito com validade e preço para 30 dias, mas se o pagamento ocorrer antes da data final, o dinheiro entra em caixa com o prêmio integral. “A alta da bolsa ajudou na performance do fundo, pela rapidez com que o recurso voltava e era reemprestado”, afirma Vainer. Já o Capitânia Multi FIC Multimercado Crédito Privado depende mais da maturação do que da velocidade. Sua carteira é composta por títulos de crédito estruturado e de securitização. A inteligência da equipe é buscar ativos com bom perfil de risco e alta recompensa. A concentração é proibida, deixando o fundo sempre com 12 a 24 operações. “No mundo do crédito privado, o título público é risco zero, o bancário é risco um e assim por diante.
Buscamos operações com 125% a 140% do CDI”, descreve Profili.
Para encerrar o ano com operações vitoriosas, a equipe da Bram precisou madrugar. Muitos analistas despertavam antes das cinco da manhã para compreender o desempenho dos mercados asiáticos. Era preciso iniciar as operações no Brasil com uma clara visão do que acontecia no cenário internacional. Dessa maneira, os gestores conseguiram evitar um descontrole na volatilidade de quem trabalha com ativos nervosos, como taxa de juros e câmbio. “Foi um ano de queda da taxa de juros e volatilidade cambial expressiva”, diz Soares, da Bram. O resultado do Bradesco Private Multiestratégia pode ser dividido entre o primeiro semestre de acertos nas previsões da taxa Selic e o segundo, da desvalorização do dólar. A moeda americana também incrementou o desempenho do Vetorial FDC fiMultimercado. “A recuperação do câmbio estava mais clara do que a da bolsa no início do ano passado”, afirma Sérgio Machado, sócio da Vetorial Asset Management. Em vez de seguir a corrente que colocava a recuperação do dólar no longo prazo, a gestora firmou posição na queda da cotação. “Gostamos do ditado que diz que o inteligente fica um passo à frente do mercado, pois se ficar dois, pode morrer cheio de razão”, conta Machado.
R$ 35,3 bilhões foi a captação líquida dos fundos multimercado em 2009. Apesar do bom desempenho, eles ainda não recuperaram as perdas de 2008
Ficar um passo à frente é a obrigação do multimercado macro, que tem como característica principal definir um cenário de atuação antes de aplicar uma estratégia direcional. Eles estão mais expostos aos erros e acertos da equipe de gestão, embora tenham conseguido apagar 2008 ao aproveitar o embalo da valorização de 82,66% do Ibovespa no ano passado. Mas, atenção. Antes de olhar a performance atual, faça uma análise do comportamento do fundo nos diferentes cenários e veja como o gestor se saiu. Vale destacar o Planner fiMultimercado, da categoria multiestratégia. Em dois anos completamente distintos, ele se manteve entre os dois primeiros colocados. Golaço.