24/08/2025 - 10:00
O tarifaço de 50% sobre os produtos brasileiros nos Estados Unidos já está provocando impactos no bolso dos norte-americanos. Nesta semana, o Departamento de Estatísticas de Trabalho anunciou que a carne bovina subiu 2,5% em julho e acumula alta de 11,3% em 12 meses. O preço médio dos bifes crus chegou a um valor equivalente a R$ 143 o quilo.
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Apesar de ser um dos principais produtores de carne bovina do mundo, os EUA dependem muito de importações para abastecer o mercado interno. O Brasil é responsável por 26% de toda a importação de carne para o país e os EUA são o segundo maior destino das exportações brasileiras no setor. Com a sobretaxa que passou a ser aplicada no começo de agosto, a carne brasileira passou a pagar 76% de imposto.
Preço da carne vai cair no Brasil?
Analistas do mercado se dividem sobre se o preço da carne no Brasil vai sofrer uma queda por conta do tarifaço. O economista-chefe da Blue 3 Investimentos, Roberto Simioni, acredita que a queda pode acontecer nos próximos meses por conta de um excesso de oferta do produto que originalmente seria vendido para os Estados Unidos.
“Parte da produção que poderia ser exportada deve ser redirecionada para o consumo doméstico, o que aumenta a oferta interna, e vai pressionar os preços para baixo. A redução da rentabilidade vai levar produtores a aumentar o abate de fêmea, diminuindo a formação de novos rebanhos para o futuro, buscando provocar uma falta da carne e provocar uma alta nos preços nos próximos meses no mercado interno, como forma de compensar a perda do mercado externo”, explicou Roberto Simioni, economista-chefe da Blue 3 Investimentos.
Por outro lado, relatório da Scot Consultoria afirma que não haverá essa oferta maior em razão do volume de exportação para os EUA já ter diminuídos nos últimos meses e o escoamento para outros mercados já estar acontecendo.
“Após a entrada em vigor das tarifas no dia 6, o volume embarcado na semana de 10/8 a 16/8 permaneceu dentro da média anual e, não somente isso, os valores atingiram as máximas do ano, ou seja, com EUA ou sem EUA a nossa exportação, a princípio, permaneceu a mesma. Também avaliamos que vendemos mais para os EUA no primeiro semestre por algumas empresas que já avaliavam que as tarifas iriam vir e se anteciparam na formação de estoques”, apontou a consultoria.
Carne acumula inflação de 23% em 12 meses no Brasil
Mesmo se o cenário de queda se confirmar, ela não deve fazer com que o produto volte ao patamar de um ano atrás. O preço da carne medido pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para o mês de julho mostrou uma queda de 0,3%, o que ajudou a inflação no período ficar em 0,26%, abaixo da previsão do mercado de 0,36%. No entanto, a carne bovina foi uma das vilãs da inflação do ano, acumulando alta de 23% no acumulado de 12 meses.
Simioni acredita que o excesso de produção que vai permanecer no mercado interno pode fazer com que a carne bovina caia no máximo 8% nos próximos meses.
EUA vai sentir mais o tarifaço
Apesar de prever algum impacto negativo para a pecuária brasileira, o setor acredita que os Estados Unidos vão sofrer mais com o tarifaço do que o Brasil. Embora sejam o maior produtor mundial de carne bovina e um importante exportador, os EUA são também o segundo maior importador global, atrás apenas da China. O déficit de carne bovina nos EUA veio de 300 mil t em 2023 para quase 1 milhão de toneladas estimadas pelo USDA para 2025.
Segundo o Analista de Diversificação Internacional da InvestSmart XP, Bruno Suzuki, os preços devem chegar até as redes de fast food.
“Sem os cortes magros importados, frigoríficos são forçados a utilizar cortes nobres do gado local, elevando também o custo de bifes e churrascos, o que amplia a pressão sobre consumidores e redes de fast-food”, apontou.
Levantamento da Datagro aponta que enquanto os exportadores brasileiros possuem grandes vantagens comparativas em termos de capacidade de redirecionamento das cargas a outros mercados, os importadores norte-americanos podem estar diante de um reforço de aperto substancial na disponibilidade local da proteína.
“Essa maior relevância proporcional da carne brasileira para o mercado estadunidense não se dá apenas em termos de volumes absolutos, como também em padrões dos cortes importados pelos americanos. O principal produto exportado aos EUA pelo Brasil são os chamados beef trimmings, que são pedaços de carne bovina restantes do processo de corte e limpeza das peças tradicionais, que na prática, são importados para serem moídos Metade do consumo per capita de carne bovina da população dos EUA se apoia na carne moída, que no mercado doméstico local é beneficiada majoritariamente a partir de fêmeas bovinas de menor padrão de qualidade”, apontou a consultoria.
A representatividade da carne brasileira nas importações totais dos EUA triplicou entre 2021 e 2025, de 66 para 221 mil toneladas.
Quem mais come carne no mundo
O mercado interno brasileiro para a carne bovina vem aumentando a cada ano. Em 2024 o brasil foi o terceiro maior consumidor de carne em absoluto do mundo. Já na disponibilidade per capita, que divide o consumo total pelo número de habitantes, o Brasil fica na quinta colocação
Confira o ranking divulgado pela Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec):
País | Consumo total (1.000 TEC) | População (milhões) | Disponibilidade per capita (kg/hab/ano) |
EUA | 12.668 | 337 | 37,6 |
China | 11.955 | 1.409 | 8,5 |
Brasil | 8.095 | 213 | 38,1 |
Índia | 2.990 | 1.442 | 2,1 |
Paquistão | 2.476 | 236 | 10,5 |
México | 2.152 | 132 | 16,3 |
Argentina | 2.042 | 47 | 43,3 |
Rússia | 1.888 | 146 | 12,9 |
Turquia | 1.636 | 86 | 19,1 |
França | 1.547 | 66 | 23,4 |
Japão | 1.255 | 124 | 10,1 |
Uzbequistão | 1.118 | 37 | 30,3 |
Reino Unido | 1.104 | 68 | 16,1 |
Alemanha | 1.104 | 85 | 13 |
África do Sul | 1.025 | 63 | 16,2 |
Itália | 1.018 | 59 | 17,3 |
Coréia | 980 | 52 | 18,9 |
Canadá | 902 | 41 | 21,9 |
Indonésia | 873 | 282 | 3,1 |
Egito | 857 | 107 | 8 |
Zimbabué | 750 | 17 | 44,1 |
Colômbia | 722 | 53 | 13,7 |
Espanha | 569 | 48 | 11,8 |
Austrália | 558 | 27 | 20,4 |
Uruguai | 138 | 4 | 38,6 |
Outros | 18.692 | 2.699 | 6,9 |
Mundo | 78.973,90 | 7.876,20 | 10 |
Fonte: Athenagro, dados FAO, USDA,OCDE, IBGE