30/07/2025 - 6:00
Em um cenário de escalada na tensão das relações Brasil-EUA, com o anúncio de tarifas de 50% pelo presidente americano Donald Trump, especialistas não esperam um impacto imediato nas próximas decisões do Comitê de Política Monetária (Copom) acerca da Selic.
De forma consensual – inclusive excetuada a situação com as tarifas – especialistas esperam uma manutenção da Selic na reunião do Copom desta semana, mantendo a taxa em 15%.
A discussão do mercado, por ora, é acerca das sinalizações do Banco Central (BC) sobre o futuro da taxa de juros, com foco na análise dos próximos comunicados. Nesse sentido, a expectativa é de mais cinco ou seis reuniões do Copom com manutenção do patamar de juros.
Sobre as tarifas – anunciadas após a última reunião do Copom -, o economista Rodolfo Margato, da XP destaca que esse esse evento não irá alterar a decisão de política monetária a ser anunciada.
“Esperamos manutenção da taxa selic no patamar de 15%. Isso porque ainda há muitas incertezas sobre o impacto líquido. Da elevação de tarifas sobre a inflação do Brasil. Por um lado, podemos observar um efeito desinflacionário devido à ampliação da oferta de produtos no mercado interno. Algumas reportagens vem chamando a atenção para este ponto, especialmente em relação a alimentos, a menor demanda externa e a maior oferta doméstica podem gerar uma redução em grupos do IPCA, um vento de desinflação”, explica.
“Ao mesmo tempo, a depender do desenrolar desse conflito tarifário, podemos observar uma reação mais forte da taxa de câmbio e uma eventual depreciação da nossa moeda colocaria uma pressão sobre a inflação. Ao longo dos próximos meses. Ou seja, o efeito líquido ainda não está claro, é um cenário de muita incerteza sobre a persistência ou não das tarifas de 50% sobre as exportações brasileiras, sobre retalhação ou não por parte do governo brasileiro e como se daria essa resposta e principalmente esse impacto líquido”, completa.
Nesse sentido, aponta que os efeitos desinflacionários de curto prazo parecem ‘os mais prováveis’, todavia não pode ser descartada alguma reação na taxa de câmbio e efeitos para cima sobre alguns grupos do IPCA.
“Então tendo em vista essa incerteza, não acreditamos que o Copom reagirá ao novo evento, a elevação de tarifas mudando a decisão de política monetária que deve ser de manutenção em 15%.”
Gustavo Sung, economista-chefe da Suno, também analisa que as tarifas de 50% podem entrar no cenário do Banco Central com uma preocupação, mas isso não deve afetar as decisões no curto prazo da autoridade monetária.
“Tudo vai depender de fato se haverá ou não uma guerra comercial, um escalonamento e os impactos que isso pode ter principalmente sobre a nossa taxa de câmbio. Caso a cotação do real contra o dólar permaneça em um nível muito elevado, dentre as incertezas que se traduzam em impactos inflacionários que resultem na piora das expectativas de inflação, aí isso pode começar a preocupar de uma forma mais relevante o Banco Central, possivelmente postergando o ciclo de queda dos juros, que é o nosso cenário base, deve se iniciar no primeiro trimestre.”
Fernando Siqueira, Head de Research da Eleven Financial, destaca que o impacto no Copom de imediato é pouco provável.
“Não teve impacto claro. Até teve um impacto negativo na bolsa e um pouco no câmbio, mas não muda nada para o Copom nesse momento. A decisão já estava tomada algum tempo atrás de parar de aumentar os juros eu acho que isso vai se concretizar. Essa é a decisão e ponto. Esses eventos não mudam.”
Cenário de retaliação pode pesar sobre Selic
Apesar disso, a visão é de que ao longo dos próximos meses as tarifas podem ter um impacto maior nas decisões de política monetária.
Sung observa que se o Brasil de fato retaliar os Estados Unidos e a nação americana subir ainda mais as tarifas, haverá uma preocupação maior.
“Vai depender também dos impactos que isso vai ter sobre a o cenário inflacionário brasileiro.”
Margato, da XP, analisa que uma retaliação por parte do governo brasileiro, considerando, por exemplo, a imposição de tarifas sobre as importações de bens dos Estados Unidos, teria um efeito adverso sobre a economia local.
“Haveria provavelmente um impacto baixista sobre a atividade, tendo em vista que cerca de 90% das importações de produtos americanos são manufaturados, boa parte disso representa bens intermediários, ou seja, insumos, matérias-primas utilizados em processos de produção pela indústria local, então poderíamos observar algumas restrições de oferta, e neste caso o encarecimento de alguns produtos, sem falar na reação da taxa de câmbio.”
Nesse aspecto, aponta que uma escalada do conflito comercial, uma retaliação com elevação de tarifas, provavelmente aumentaria a percepção de risco e isso levaria a uma depreciação cambial também colocando pressão sobre a dinâmica inflacionária – o que mexeria mais drasticamente nas variáveis analisadas pelo BC ao tomar decisões sobre a Selic.
“Provavelmente o impacto seria altista nas projeções de inflação, que poderiam subir e isso poderia alterar sim o plano de voo do Copom. O nosso cenário base na XP considera primeiro corte na taxa Selic em janeiro de 2026, o início portanto de um ciclo de flexibilização monetária. Essa discussão poderia ser adiada para alguns meses à frente em caso de uma escalada dessa questão comercial com reação no câmbio.”
Siqueira, da Eleven, tem uma análise mais cautelosa e frisa que ainda ‘é difícil de responder o que vai acontecer’.
“Acho que o impacto aqui seria mais para o lado negativo disso acabar gerando uma depreciação do cambial, gerar um pouco mais por fuga de capitais no Brasil, também por aversão a risco. Nesse cenário seria mais na linha de o Copom, talvez até voltasse a aumentar os juros ou pelo menos não conseguiria reduzir os juros tão cedo, lembrando que o mercado espera que o Copom comece a reduzir os juros no começo do ano que vem, mas eu acho que essa guerra comercial se agravando com retaliações, isso poderia na minha visão aumentar a aversão a risco”, observa, sobre as eventuais mudanças na trajetória da Selic.