21/06/2025 - 14:37
O aiatolá Ali Khamenei se mudou para um bunker após ter parte do escalão militar abatido por Israel. Determinado a evitar colapso do regime, ele já teria apontado três candidatos, segundo o NYT.Enfraquecido após perder vários auxiliares e ciente de que pode ser ele mesmo vítima de um atentado em breve, o líder supremo do Irã, aiatolá Ali Khamenei, nomeou à Assembleia dos Peritos três clérigos como candidatos à sucessão, informou o jornal americano The New York Times neste sábado (21/06).
Com isso, Khamenei, de 86 anos, quer evitar um eventual colapso do regime e assegurar uma transição rápida e ordeira caso ele seja assassinado – já que, em circunstâncias normais, o processo de escolha de um novo líder supremo pela Assembleia dos Peritos poderia levar meses.
Khamenei, que comanda os militares, o Judiciário, o Legislativo e o Executivo, é também o mais alto clérigo na hierarquia dos muçulmanos xiitas. Ele conduz o país com mão de ferro desde 1989 e é o mais longevo chefe de Estado em todo o Oriente Médio.
Além de nomear os candidatos à sucessão, o aiatolá também teria designado uma série de substitutos do alto escalão militar, que foi gravemente desfalcado desde o início dos ataques israelenses, no último dia 13.
Os nomes são mantidos em segredo, por razões estratégicas, já que a inteligência israelense tem sido rápida em abater também substitutos recém-nomeados e anuncia todos os dias a morte de novas lideranças.
Em 2024, o presidente iraniano Ibrahim Raisi, que era cotado para suceder Khamenei, morreu em um acidente de helicóptero. Outro nome que já circulou no passado é o de Mojtaba, filho de Khamenei ligado à Guarda Revolucionária do Irã, mas o NYT afirma que ele não estaria na lista de candidatos apresentada pelo pai.
Líder supremo escondido em um bunker
A guerra entre Israel e a República Islâmica mal completou dez dias e já causou mais danos à capital iraniana, Teerã, que em toda a guerra entre Iraque e Irã (1980-1988), último grande conflito vivido pelo país.
Khamenei tem passado os dias escondido em um bunker e, segundo o NYT, só se comunica agora por mensageiros, por temer ser rastreado. À população iraniana, ele tem se dirigido por meio de pronunciamentos gravados em vídeo.
No início da semana, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, chegou a pressionar o aiatolá publicamente a abdicar do poder e sugeriu que há planos de assassiná-lo.
“Sabemos exatamente onde o chamado ‘líder supremo’ está escondido. Ele é um alvo fácil, mas está seguro lá – não vamos matá-lo, pelo menos não por enquanto”, disse Trump em uma publicação na rede Truth Social.
O premiê israelense Benjamin Netanyahu também sinalizou que não descartava assassinar Khamenei, argumentando que isso poria fim ao conflito.
Uma eventual sucessão de poder no Irã também estaria sendo estudada por diplomatas americanos e europeus, segundo a emissora americana CBS.
Algumas lideranças europeias têm expressado publicamente reservas à ideia de derrubar o regime do aiatolá pela força, como o presidente francês Emmanuel Macron.
“Alguém acha que o que foi feito no Iraque em 2003 […] ou na Líbia na década passada [em 2011] foi uma boa ideia? Não”, disse Macron durante viagem ao Canadá para participar da cúpula do G7.
Em ambos os casos de intervenção ocidental citados por Macron, ditaduras foram depostas, mas o que seguiu depois foi um cenário de instabilidade e conflitos sangrentos.
Há também o temor de que uma operação do tipo acabe por facilitar a ascensão ao poder de forças ainda mais radicais no Irã.
Temor de infiltração
A rapidez com que Israel foi capaz de abater auxiliares do altíssimo escalão do governo expôs um poder frágil, abalado por ataques organizados e realizados dentro de território iraniano mediante a colaboração de agentes infiltrados. Ainda assim, segundo o NYT, o regime ainda parece estar ideologicamente coeso.
Militares do alto escalão iraniano teriam sido instruídos a abandonar meios eletrônicos de comunicação, e a população está praticamente sem acesso à internet.
Apesar de o regime de Khamenei ser altamente impopular entre os iranianos e muitos desejarem seu fim, a guerra tem sido criticada até mesmo por aqueles que mais ferrenhamente se opuseram à República Islâmica.
Milhares fugiram às pressas de Teerã em meio aos bombardeios. O país não dispõe de abrigos antibombas para civis.
“Acabem com a guerra e escolham o diálogo em vez da destruição”, apelaram na segunda-feira (16/06) as ativistas iranianas Narges Mohammadi e Shirin Ebadi, detentoras do prêmio Nobel da paz, ao defender o fim do programa de enriquecimento de urânio do Irã. “Esta guerra, iniciada por Israel sob violação do direito internacional, já provoca um sofrimento imenso e ameaça descambar para um conflito maior regional e mundial.”
À BBC, Mohammadi, notória opositora do regime e cujo marido está preso em Teerã, argumentou que “democracia, direitos humanos e liberdade não podem vir através de violência e guerra”.
Por que Israel e Irã estão em guerra?
Os ataques contra o Irã foram deflagrados por Israel sob a justificativa declarada de impedir que a República Islâmica desenvolva armas nucleares – pretensão que o Irã nega ter. Teerã, que é signatário do Tratado Internacional de Não Proliferação, que veta armas nucleares, alega desenvolver a tecnologia somente para fins civis.
Israel, que não é signatária desse tratado, é o único país do Oriente Médio que, acredita-se, dispõe de tais armas – algo que Tel Aviv não nega nem confirma.
Antes de ser bombardeado por Israel, porém, o Irã foi censurado pela Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), órgão de fiscalização nuclear da ONU, por descumprir obrigações previstas no tratado.
O país produz urânio enriquecido a 60% de pureza – muito acima do necessário para fins civis, mas ainda abaixo dos 90% que possibilitariam a produção de armas de destruição em massa.
Em 2023, a AIEA anunciou ter encontrado partículas de urânio enriquecido a um grau de 83,7% de pureza em uma dessas instalações nucleares, Fordo, fortaleza encravada nos subterrâneos de uma montanha e que, até agora, segue ilesa aos bombardeios israelenses.
Segundo a CBS, diplomatas europeus e americanos teriam avaliado nesta semana as consequências e riscos de ataques a instalações nucleares iranianas, incluindo Fordo.
Desde o início da guerra, ao menos 24 pessoas foram mortas e 592 ficaram feridas nos ataques iranianos a Israel. Já os bombardeios israelenses teriam feito mais de 430 vítimas e ferido outras 3,5 mil pessoas, segundo números oficiais do regime.
ra (Reuters, DW, AFP, dpa, ots)