03/08/2025 - 7:30
Ator importante na exploração de metais verdes e de terras raras, o Brasil vê sua importância na transição energética aumentar em um momento de tensão no comércio internacional.
Cerca de duas semanas antes da entrada em vigor a taxação de 50% para produtos brasileiro que chegam aos Estados Unidos, o encarregado de embaixada dos EUA no Brasil, Gabriel Escobar, reforçou o interesse norte-americano sobre minerais críticos e estratégicos (MCEs) do Brasil, em reunião com o Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM) entidade que representa as companhias privadas do setor no país.
O presidente da associação, o ex-ministro Raul Jungmann, se posicionou afirmando que a entidade não tem poder para negociar com governo estrangeiros, papel que somente o governo brasileiro pode desempenhar. Na quinta-feira, 24, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva subiu o tom contra o governo Trump, afirmando que o país não vão “por a mão” nos minerais brasileiros.
O que são os “metais verdes”?
Os chamados “metais verdes” são substâncias de ocorrência natural, frequentemente encontradas em rochas e ideais para uso em tecnologia renovável, baterias de veículos elétricos, energias renováveis e tecnologias sustentáveis. O Brasil possui um grande potencial nesses materiais, com destaque para níquel, lítio, cobre, cobalto e terras raras.
Robson Costa, engenheiro ambiental e professor da Estácio, explica que, por mais que a China conte com as maiores reservas desses tipos de minerais, o Brasil se destaca nessa extração.
“O Brasil é responsável por cerca de 90% da produção global de nióbio, metal que é fundamental para a produção de superligas, utilizadas em turbinas eólicas, motores de veículos elétricos e outras aplicações de alta performance na transição energética. Além disso, detém cerca de 16% das reservas mundiais de níquel e é um produtor importante deste metal, essencial para baterias recarregáveis e aço inoxidável, além de possuir cobalto como subproduto”, apontou.
Fundo se destaca por exploração de níquel sulfetado
Um dos metais mais procurados no contexto da transição energética é o níquel. Porém, para ser utilizado em baterias de veículos elétricos, por exemplo, ele precisa estar na forma ‘sulfetada’ e não na forma de ligas de ferroníquel.
A única companhia que atua na extração e comercialização do níquel dessa forma no país é o fundo de investimento Appian Capital Brazil, por meio da Atlantic Nickel (ATN). A companhia explora a mina de Santa Rita, na cidade de Itagibá, no sul da Bahia, grande região produtora do minério.
No primeiro semestre foram mais de 50 mil toneladas de níquel sulfetado enviados para Canadá, Finlândia e China, em cinco embarques no período. Em seis anos de operação no país, a empresa tem mais de 50 embarques realizados e mais de 500 mil toneladas secas (dmt) de material exportadas.
“O Brasil, de uma maneira geral, é muito importante por ter um potencial de recursos naturais enorme, uma grande variedade, incluindo lítio no norte de Minas, conhecido como Vale do Lítio, na região do Jequitinhonha, cobre, e o níquel, onde a Santa Rita é uma das maiores reservas mundiais de níquel sulfetado. Entendemos que o Brasil é uma alternativa geopoliticamente estável no cenário de transição energética, especialmente comparando com questões de guerras comerciais e a dependência da China”, contou Tony Lima, Chief Operating Officer (COO) da Appian Capital Brazil.
A produção anual de níquel no Brasil variou nos últimos anos, com a Vale reportando 164,9 mil toneladas em 2023 e a Agência Nacional de Mineração (ANM) indicando 159,9 mil toneladas no mesmo período, embora a produção em 2020 tenha sido de 70 mil toneladas de níquel contido. Os principais estados produtores são Goiás, Pará e Bahia.
De acordo com Lima, o plano da Appian é aumentar essa exploração em 60% a partir de 2028. O fundo também explora grafite, por meio da empresa Graphcoa.
O que é o níquel sulfetado?
O níquel sulfetado é um tipo de níquel mais adequado para a produção de baterias, especialmente para a transição energética e veículos eletrificados. As principais características e diferenças em relação a outros tipos de níquel são:
- Eficiência Energética: no processo químico, o níquel sulfetado demanda menos energia para ser transformado no dióxido de níquel, que é o material utilizado nas baterias. Isso contrasta com o níquel que geralmente vem de ligas de ferro (como o níquel laterítico, que produz ferroníquel), cujo processo de transformação para material de bateria consome mais energia;
- Aplicação em Baterias: enquanto o níquel proveniente de ligas de ferro (ferroníquel) é mais empregado na produção de aços inoxidáveis, o níquel sulfetado é mais propício para atender às demandas de baterias.
Diversas regiões se destacam na produção
Diferentes regiões do Brasil se destacam na produção de minerais estratégicos. No Norte, há uma forte concentração de extração de cobre e níquel, especialmente em áreas operadas pela Vale, como Onça Puma. O estado do Pará também se destaca pela produção de grafita. Já no Nordeste, o destaque vai para o lítio e para as terras raras, especialmente no estado do Piauí, embora essa exploração ainda enfrente desafios tecnológicos e ambientais significativos.
Outros grandes estados produtores de níquel é Goiás e Mato Grosso. A região conhecida como “Niquelândia” é operada pela Anglo American. Nessa região também existem projetos promissores de cobalto, geralmente extraído como subproduto do níquel. No Sudeste, o grande destaque é o Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, que abriga a maior reserva de lítio do país, com destaque para os municípios de Itinga e São Gonçalo do Abaeté. O projeto Sigma Lithium, localizado em Grota do Cirilo, é um dos maiores do mundo em produção sustentável de lítio. Além disso, a região também abriga importantes jazidas de grafita e terras raras, como em Araxá, onde há a presença de nióbio e outros elementos associados.
O que são terras raras?
Outros materiais importantes na fabricação de celulares, turbinas eólicas e baterias de carros elétricos são as chamadas terras raras.
As terras raras são um grupo de 17 elementos químicos que são centrais na transição energética. São eles: lantânio (La), cério (Ce), praseodímio (Pr), neodímio (Nd), promécio (Pm), samário (Sm), európio (Eu), gadolínio (Gd), térbio (Tb), disprósio (Dy), hólmio (Ho), érbio (Er), túlio (Tm), itérbio (Yb) e lutécio (Lu), escândio (Sc) e ítrio (Y).
O Brasil ocupa a terceira maior reserva de terras raras do mundo.
“Em 2023 o Brasil subiu para segundo no ranking, com 23% das reservas de terras raras mundiais, mas com produção ainda incipiente, de apenas 1%, destas reservas, sendo sua maior exportação para a China”, explicou Costa.
O que diz a legislação sobre essa exploração?
Em resposta ao interesse norte-americano sobre minerais críticos e estratégicos (MCEs) do Brasil, o presidente Luiz Inácio lula da Silva afirmou que os norte-americanos não vão “por a mão” nos valiosos materiais. Desde a Constituição de 1988 o subsolo brasileiro é de propriedade da união, mas ela pode concede autorizações ou concessões para a lavra por meio da Agência Nacional de Mineração (ANM).
Há mecanismos de controle e compensação financeira por parte do Estado, como a CFEM (Compensação Financeira pela Exploração Mineral), que pode chegar até 3,5% do faturamento das mineradoras. Além disso, há restrições em áreas estratégicas, como terras indígenas ou zonas de fronteira, cuja exploração requer autorização do Congresso Nacional. O governo também pode intervir ou barrar investimentos estrangeiros em minérios considerados críticos por motivos de segurança nacional.
“Embora o Brasil não tenha monopólio generalizado sobre a mineração, exerce um forte controle regulatório, especialmente em setores sensíveis. A tendência é de maior abertura para investimentos internacionais, especialmente nos ‘metais verdes’, considerados estratégicos para a transição energética global”, encerrou Costa.