04/04/2017 - 8:32
Em 15 de maio de 1984, as gestantes Maria Martins Pereira, então com 18 anos, e Percília Vicente, de 24, entraram quase ao mesmo tempo no Hospital Municipal de Quirinópolis, no sul de Goiás, e deram à luz duas meninas. Cada uma seguiu seu caminho, levando seu bebê nos braços. Ontem, passados 32 anos, o resultado de um exame de DNA confirmou que as crianças foram trocadas. Keila Martins Borges, criada como filha por Maria, é na verdade filha de Percília. Já Elisângela Vicente Maciel, que sempre amou Percília como mãe, é filha biológica de Maria.
As duas famílias já se encontraram, mas ainda não sabem ao certo o que fazer. Keila se adiantou e, de sua parte, já decidiu que vai ter duas mães. “Não quero ficar distante da mãe que me criou (Maria), mas também desejo ficar muito próxima da minha mãe biológica (Percília) para descontar o tempo de convivência que não tivemos.”
Em janeiro deste ano, uma prima de Keila encontrou na igreja uma mulher muito parecida com ela. “Minha prima ficou tão impressionada que fez uma foto com o celular e me mandou.” Segundo Keila, a prima foi além e, conversando com a mulher, descobriu que tinha uma irmã que havia nascido no mesmo dia e na mesma maternidade. “Aí minha cabeça ficou cheia de dúvidas. Me lembrei que, quando criança, ouvi comentários de que eu não era nada parecida com minha mãe e podia ter sido adotada.” Ela conversou com a mãe e as duas fizeram exame de DNA. Para ela, o resultado não foi surpresa: não havia laços de sangue entre elas.
Keila sabe agora que a mulher com quem a prima se encontrou é Eliene Maciel, sua irmã biológica. Em sua página no Facebook, ela comemorou ter encontrado a irmã. “Parece brincadeira, coisa de novela, talvez, mas aconteceu! Eu já sabia desde o primeiro instante que eu te vi que tanta semelhança assim não podia ser coincidência. Então, a moça que se parece tanto comigo é a minha irmã! Estou feliz, pode contar comigo sempre! Amo você!”
Maria também já tinha alguma suspeita. Ela contou que, no dia do parto, sua mãe lhe disse que seu bebê era “bem clarinho”, parecido com o pai. Quando a criança foi trazida do berçário para que fosse amamentada, a avó questionou se era o mesmo bebê. “Minha mãe achou a menina mais morena. Quando vimos o bracinho, ela não tinha a pulseira com o nome.” Maria lembra que a enfermeira foi questionada e respondeu que, provavelmente, a pulseira tinha caído.
Depois que saiu do hospital, Maria procurou esquecer a história e não a relatou aos familiares. A menina foi criada em Gouvenlândia, cidade próxima de Quirinópolis, onde a família morava. Como era costume na época em áreas rurais, as duas crianças só foram registradas em cartório mais de um ano depois. Os registros indicam apenas os dados declarados pelas famílias.
O Estado não conseguiu contato com Percília, que mora na zona rural de Quirinópolis. A uma rádio da cidade, ela disse que ainda está “um pouco atordoada” com a situação, mas espera que as famílias se mantenham unidas. Ela foi procurada pela filha biológica e disse que não teve dúvida de que se tratava de “alguém do meu sangue”. Até se lembrou de ter amamentado Keila no hospital, pois Maria estava com pouco leite. Percília deixou claro que não pretende se afastar de Elisângela. “Convivemos durante 32 anos como mãe e filha, não é agora que a gente vai se distanciar.”
Procurada, Elisângela não atendeu aos contatos da reportagem. Familiares disseram que ela ainda está “procurando entender” a situação. Keila disse que vai buscar a aproximação das duas famílias.
Hospital
O diretor do Hospital Municipal de Quirinópolis, Lucas de Oliveira Biela, disse que no sistema de controle atual uma troca de bebês é praticamente impossível. “Fazemos o parto humanizado e o bebê já sai da sala com a mãe.” Quando a criança precisa de cuidados especiais em Unidade de Terapia Intensiva (UTI), por exemplo, ela recebe a pulseira de identificação com todos os dados. “A pulseira acompanha o recém-nascido até ele deixar o hospital.”
Biela disse que o quadro de funcionários de 1984 foi totalmente mudado. “Nosso médico mais antigo foi admitido em 1997. Eu mesmo sou paulista de Catanduva e estou em Quirinópolis desde 2004, mas, se houver solicitação, vamos fazer o possível para esclarecer. O hospital vai agir com responsabilidade.” Segundo ele, o centro medico segue as normas do Conselho Federal de Medicina, segundo as quais os documentos e cadastros são arquivados por um prazo de 20 anos. “Pode ser que haja alguma coisa anterior e, se houver solicitação, vamos fazer uma busca. Temos interesse em esclarecer tudo.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.