No meio da loja, o patrão sobe na escada para alcançar uma prateleira mais alta. ?O que você está olhando??, ele pergunta a um funcionário que assiste à cena. ?Nada, chefe. Só estou torcendo para você cair daí.?, responde o empregado. Silêncio. Mal-estar. Constrangimento. De repente, o patrão cai. Mas na gargalhada. ?Aqui é assim, não tem frescura?, ele diz.

?Nos tratamos de igual para igual.? Mas vá com calma. Por trás de tanta informalidade há um minucioso planejamento que está levando a rede de lojas de materiais de construção Dicico a surpreender o mercado com seu rápido crescimento.

O patrão em questão é o paulista Dimitrios Markakis, de 41 anos. Filho de um feirante que virou grande atacadista, sua história começa com a fundação dos Supermercados Cândia, no final da década de 80. Em 2003, Markakis vendeu seus quatro hipermercados à portuguesa Sonae. Com o bolso cheio, comprou a Dicico, uma empresa familiar nascida no bairro do Ipiranga, em 1917, em São Paulo. Quando Markakis assumiu, eram duas lojas e faturamento de R$ 30 milhões anuais. Hoje são treze (há mais duas em obras) e receitas previstas para 2005 de R$ 310 milhões, um crescimento de 40% sobre 2004.

Dois fatores tornam os números da Dicico ainda mais impressionantes. Segundo dados do IBGE, as vendas do varejo especializado em materiais de construção despencaram 10% no primeiro semestre. Para piorar, a Dicico é uma empresa de médio porte e, como tal, fica espremida num mercado de concorrência feroz. De um lado estão as mais de 50 mil pequenas e médias lojas de bairro ? elas dominam 96% do setor, que movimentou R$ 33,5 bilhões em 2004. Do outro, há os poderosos home centers Leroy Merlin, C&C (do banqueiro Aloysio Faria) e Telhanorte (do Grupo Saint-Gobain), que têm alto poder de investimento e negociação. Para driblar esses obstáculos, Markakis traçou um plano com três pilares:

LOGÍSTICA E CUSTO BAIXO ? Ao contrário dos grandes rivais, que mantém depósitos nas próprias lojas, a Dicico tem um centro de distribuição (CD) unificado. ?Trabalho com estoque no limite. Não tenho dinheiro fácil vindo da França para deixar mercadoria criando teia de aranha?, alfineta. Esse mesmo CD abastece outras treze redes menores que se juntam à Dicico na hora de fazer pedidos e, assim, arrancam preços melhores dos fornecedores.

RECURSOS HUMANOS ? Cada funcionário é ?convidado? a freqüentar 18 horas de cursos por mês. Quem faltar a uma única aula, não pode ser promovido. ?O atendimento sempre foi o calcanhar-de-aquiles desse setor?, diz Claudio Felizone, especialista em varejo da USP. Markakis dá prêmios em dinheiro até para os motoristas das transportadoras terceirizadas que não atrasam as entregas.

TECNOLOGIA ? Cada vendedor tem um computador de mão e verifica na hora se o produto escolhido pelo cliente está disponível no estoque. A prática comum no setor é outra: o vendedor pede licença e vai até um terminal fazer a pesquisa. ?E é aí que ele perde a venda. Se você deixa o consumidor racionalizar a compra, ele desiste?, ensina Cláudio Conz, presidente da Associação Nacional dos Comerciantes de Material de Construção.

Junte-se a isso doses cavalares de agressividade. Todas as semanas, uma equipe da Dicico pesquisa os preços de mil itens vendidos pelas rivais. Se encontra valores mais baixos que o seus, a redução é imediata. Uma planilha com os preços das quatro (Leroy, C&C, Telhanorte e Dicico) é afixada na entrada de cada loja.

Mas nem sempre foi assim. ?Em 2001, por uma sucessão de erros meus, quase fali?, admite Markakis. O maior erro foi não compreender a tradição da Dicico e adotar outro nome, ConstruDecor. Outros tropeços: tentar vender artigos de decoração sem ter espaço físico suficiente nas lojas e contratar apenas executivos com experiência em supermercados. ?Quebrei a cara, mas deu tempo de corrigir.? Se deu. ?Para 2007, a meta é ter 30 lojas, vendas de R$ 1 bilhão e me associar a um grupo estrangeiro.?

Dias desses, um executivo da Leroy Merlin no Brasil perguntou se Markakis o deixava ver o sistema de informática usado pela Dicico. Ele não só deixou como explicou o funcionamento do programa pessoalmente. Por quê? ?Aqui é assim, não tem frescura?.