23/09/2009 - 7:00
Aos 50 anos, Patrick Antonio Claude de Larragoiti Lucas, presidente da seguradora SulAmérica, está ficando cada vez mais rico. Este ano, as ações da sua companhia subiram estratosféricos 161% até 15 de setembro, cifra quatro vezes maior que a da concorrente Porto Seguro e quase três vezes acima do Ibovespa. O valor de mercado da SulAmérica engordou R$ 2,2 bilhões desde dezembro passado e alcançou R$ 3,6 bilhões na quarta-feira, dia em que a crise financeira mundial completou um ano. Se quisesse, Patrick Larragoiti poderia botar uma boa parte dessa nova fortuna no bolso. Mais de 60% da empresa pertence à sua família, aos sócios holandeses (o ING Bank tem 21% do capital) e aos administradores e acionistas vinculados. A competição no setor está mais acirrada do que nunca e não faltam compradores para o seu quinhão, a começar pelos maiores bancos do País. Bastaria ao empresário vender a participação, pegar o paletó e ir embora para curtir a vida de milionário aposentado em algum paraíso tropical. A grande questão, no entanto, é: por que ele faria isso?
Não há resposta óbvia, nem fácil, a esse dilema. Seu colega Jayme Brasil Garfinkel, da Porto Seguro, também poderia ter escolhido esse caminho, mas recentemente preferiu continuar no batente. Depois de negociar com o Bradesco, ele surpreendeu e fez negócio com o Itaú Unibanco. Continua no comando da Porto Seguro, agora com as carteiras de automóveis e residências e a rede de agências do Itaú Unibanco ao seu dispor. A movimentação brusca do maior banco privado nacional fez da SulAmérica a grande noiva cobiçada do mercado segurador. Se não for a mais cobiçada, é de longe a mais bonita, afirmam executivos da área. Quarta maior do mercado, com 14% de participação e prêmios de R$ 4 bilhões no primeiro semestre, a SulAmérica é muito forte em seguro- saúde e pode fazer a diferença na ferrenha disputa dos grandes bancos de varejo pela liderança do setor.
As cartas estão na mesa. O Banco do Brasil, que acelerou o crédito e reconquistou o primeiro lugar do ranking por ativos no primeiro semestre, elegeu a área de seguridade como a próxima trincheira competitiva. O Bradesco, ainda o número 1 em seguros e previdência, precisa defender sua posição e está sempre em busca de aquisições que façam sentido na sua estratégia de crescimento no mercado doméstico. E o ING, que sofreu com a crise na Europa e teve de ser socorrido pelo governo holandês, teria colocado a participação na SulAmérica à venda.
“É óbvio que o ING é vendedor e BB e Bradesco são compradores”, diz um grande investidor que acompanha com interesse as movimentações. Então, por que não sai negócio? “O problema certamente está na participação minoritária e nas concessões que a família Larragoiti estaria disposta a fazer”, palpita.
Nenhuma das empresas acima comenta os rumores do mercado. O comportamento das cotações da SulAmérica na bolsa, contudo, indica mais do que o simples otimismo com o crescimento do mercado e da companhia nos próximos anos. É sinal de que há apostas pesadas na venda da participação do ING e, quem sabe, de todo o bloco de controle.
Quaisquer que sejam os motivos dessa movimentação, há que se levar em conta uma mudança importante nas negociações de fusões e aquisições no mercado financeiro brasileiro. Até pouco tempo atrás, os grandes bancos privados eram apenas fortes compradores de fatias de mercado. Colocavam um caminhão de dinheiro na mesa e incorporavam concorrentes, um a um. Desde a fusão do Itaú com o Unibanco, no final de 2008, isso mudou. As famílias Setubal e Villela aceitaram dividir o poder com os Moreira Salles, depois de uma troca de ações. Esse modelo foi replicado na parceria estratégica com a Porto Seguro.
O próprio Bradesco, ao negociar com Garfinkel, admitiu conversar sobre gestão compartilhada, o que antes não fazia. E o Banco do Brasil, que durante anos ficou alijado da consolidação e perdeu espaço, só recentemente voltou às compras e arrematou bancos estaduais, como a paulista Nossa Caixa. No caso dos seguros, o BB fez parcerias com empresas do ramo – inclusive a SulAmérica – e está renegociando essas alianças para ficar com a maior parte do capital (e dos lucros). A americana Principal e a espanhola Mapfre estão no tabuleiro de Aldemir Bendine, o presidente do BB. Ele quer manter o mesmo espírito de gestão compartilhada com as parceiras.
Assim como a SulAmérica é fundamental para a estratégia do BB de brigar de igual para igual com Itaú Unibanco e Bradesco, o BB é essencial para a distribuição de apólices de saúde e de veículos da seguradora. Há mais de 13 anos, ambos são parceiros na Brasilsaúde e na Brasilveículos. Além do balcão do BB, a SulAmérica tem contratos de distribuição com outras instituições financeiras, como BV Financeira, Banco de Brasília, Banrisul, Banco da Amazônica, HSBC e Santander. A BV Financeira pertence ao Banco Votorantim, do qual o BB comprou 50% e manteve o modelo de gestão compartilhada com a família Ermírio de Moraes, a primeira fora da área de seguros. Ou seja, tudo é possível nesse jogo, inclusive uma entrada mais forte do BB no capital da SulAmérica, caso haja acordo em torno dos termos. Larragoiti tem a faca e o queijo na mão, mas não deve saborear a sobremesa sozinho. No que diz respeito à governança, ele poderia melhorar suas práticas. Atualmente, acumula as funções de presidente do conselho de administração e da diretoria, o que não é recomendado pelos especialistas.
Não lhe faltam, contudo, outros atrativos para levar ao altar. Um detalhe importante, para o BB, é a penetração da SulAmérica nas corretoras de seguros, que levam as apólices para fora das agências bancárias. A empresa trabalha com 26 mil corretores independentes, de quem obtém 81% de suas receitas. E elas são crescentes (veja tabelas abaixo). Seu 1,7 milhão de beneficiários em seguro-saúde renderam prêmios de R$ 2,2 bilhões no primeiro semestre. Os donos de dois milhões de veículos gastaram R$ 1,3 bilhão em apólices.
O volume de ativos administrados chega a R$ 12 bilhões. No primeiro semestre, a empresa deu lucro de R$ R$ 188 milhões, com rentabilidade de 15,7% do capital investido.
Com quase 115 anos de história, a SulAmérica tem uma forte cultura de inovação e uma marca forte. Foi a primeira a fazer seguro de vida em grupo no Brasil, em 1918. Foi pioneira em seguro de responsabilidade civil, seguro-saúde e serviço de assistência 24 horas. Com um sócio estrangeiro enfraquecido, é um bom alvo para aquisição no Brasil. Difícil é prever quem levará a melhor proposta a Larragoiti e aos holandeses. O BB tem fome de crescimento. O Bradesco não participa de negociações no momento, mas isso não significa que seja carta fora do baralho.