Termos como tokenização de ativos e blockchain são expressões cada vez mais presentes no vocabulário de investidores pelo país. A tecnologia está permitindo que o mercado de investimentos não tradicionais, como vinhos e royalties de músicas, cresça e amplie o número de brasileiros dispostos em colocar o seu dinheiro e ativos alternativos em para buscar rendimentos maiores.

A tokenização é a identificação de um produto que o torna único no ambiente virtual. Esse código vai parar em uma carteira virtual, conhecida como blockchain. A série de números mostra que o investidor é o proprietário daquele bem e que ele pode negociá-lo com quem quiser.

Recentemente, o presidente do Banco Central Roberto Campos Neto reforçou publicamente as vantagens da tokenização da economia. “As vantagens estão aí: é mais fácil, mais barata, tem menor custo, é mais aberta e transparente e a programação pode evoluir com o tempo”, disse.

Vale a pena?

Além das criptomoedas, que também são lastreadas e autenticadas via blockchain, a tecnologia abriu caminho para facilitar o investimento em ativos alternativos. No Brasil, empresas estão permitindo investimentos em vinhos e roaylties musicias tokenizados, por exemplo.

Um dos maiores desafios dos investimentos tokenizados é conseguir deixar o estigma das artes via NFTs para trás. Ficaram conhecidos os Bored Apes, imagens de macacos que chegaram a ser compradas por milhões de dólares por celebridades como Neymar e Justin Bieber. Poucos meses depois as imagens valiam uma fração do valor original.

“Com relação ao Bored Apes tem menos a ver com a tokenização e mais com o que pretensamente era um ativo, pois temos que lembrar que tokenização é uma coisa, o ativo tokenizado é outra. A tokenização é uma tendência muito robusta, porém, ela tem que estar lastreando algo que tenha valor, e no Bored Apes não era o caso, já que se tratava de uma coleção ‘hypada’, onde se misturou o avanço tecnológico com algo que essencialmente não tinha valor intrínseco”, explicou o especialista em tecnologia Arthur Igreja.

Vinícula vai tokenizar 11 mil garrafas

A Vinícola Ferreira resolveu levar a tendência da digitalização de ativos para o mercado de vinhos. Com a ajuda da A AIDDA Group, braço tecnológico da Alvarez & Marsal, e da rede blockchain Hathor Network, ela resolveu inovar e tokenizar 11 mil garrafas da produção de 2025.

O modelo de negócios vai fazer com que cada comprador tenha direito a uma caixa com seis vinhos. Além de poder ter acesso a esse bem físico, a oportunidade pode chamar a atenção de investidores já que a vinícola foi ganhadora da medalha de prata no Decanter World Wine Awards em 2020 e conta com grande expectativa para a safra de 2025.

“Um vinho que ganha uma medalha de Ouro Decanter dobra de preço do dia para a noite. Prata e Bronze seguem valorizando com proporções diferentes, mas sempre valem mais do que os vinhos não premiados”, explicou Diego Guareschi, CMO da Hathor.

A expectativa da vinícola é arrecadar R$ 2.500.000,00 com as garrafas tokenizadas. As caixas com seis garrafas custam R$ 1.400, ou seja, R$ 233 por garrafa, e estão à venda no site da companhia.

Igreja vê a iniciativa como uma boa mostra de como os processos de tokenização podem mudar o mercado de investimentos nos próximos anos. “Estamos falando de um ativo (vinho) que tem, sim, possibilidade de valorização, de escassez, de exclusividade, e a tokenização ajuda bastante em todos esses aspectos”, contou.

O investimento, contudo, traz riscos. Como as garrafas estarão disponíveis em 2025, fatores podem prejudicar a qualidade de vinhos, como uma quebra de safra, o que pode fazer com que eles não se valorizem. A vinícola afirma que atualizará todos os compradores com relatórios de produção. Não será possível que o comprador negocie o ativo no mercado secundário.

Royalties musicais 

Outro mercado que está usando a digitalização dos investimentos para desenvolver novos produtos é o comércio de royalties musicais. Artistas venderem os direitos autorais de suas músicas para o mercado financeiro não é algo necessariamente novo, mas hoje o mercado já pode ser uma alternativa para quem quer diversificar a carteira de investimentos.

Uma das empresas que negociam esses direitos autorais é a Hurst Capital, que em 2023 adquiriu o portfólio do ex-diretor da Rede Globo José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni. Nele constam clássicos como a abertura do Fantástico e da novela Tieta.

“Além da diversificação, o grande diferencial deste tipo de investimento é a descorrelação com a bolsa de investimentos tradicional e o recebimento de renda passiva ao longo do período investido. O desempenho do mercado fonográfico é pouco afetado em momentos de incertezas político-econômica, característica que o torna bastante atrativo. Além disso, o investidor poderá ter uma renda mensal passiva durante os meses em que os Certificados de Recebíveis permanecerem em vigor”, explicou o CEO da Hurst Capital Arthur Falache.

Ele explica que o rendimento, que depende das vezes que as músicas são executadas, pode ser de até 20% ao ano e que gera dividendos mensais para o investidor que optar por um ativo nacional e semestral se o ativo for internacional.

O CEO também explica que a tokenização do investimento nesse caso permite que o investidor negocie uma fração de sua cota mínima de R$ 10 mil com outra pessoa no mercado secundário e consiga lucro com isso.

“Quando o ativo é tokenizado, frações dele podem ser negociadas no mercado. Sendo assim, um investidor que tenha aplicado R$ 10 mil em royalties musicais, por exemplo, poderá vender uma parcela para outro investidor com algum ágio e obter ganhos com isso. É semelhante à compra e venda de ações na Bolsa. O investidor pode vender aquele token que subiu no mercado secundário para outro investidor. Ele pode vender qualquer fração do investimento, onde 1 token equivale a R$ 1 com mínimo de R$ 10 para ofertar”, explicou.