08/11/2017 - 21:07
Em julgamento no Tribunal Regional Federal da Primeira Região (TRF-1), formou-se maioria de votos para manter a decisão da Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso que determinou a soltura e a devolução do mandato do deputado estadual Gilmar Fabris (PSD), preso em setembro sob suspeita de obstrução de justiça.
O julgamento foi interrompido por um pedido de vista da desembargadora federal Monica Sifuentes. De um total de cinco votos possíveis, já há três votos – do relator Ney Bello, do desembargador Olindo Menezes e a juíza federal convocada Rogeria Debelli – no sentido de validar a decisão da assembleia, que apresentou como justificativa a decisão do plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) na ação direta de inconstitucionalidade, em que a Corte deu permissão ao Congresso para revisar medidas cautelares aplicadas pela justiça a parlamentares.
A Procuradoria Regional da República da Primeira Região recorreu da decisão da assembleia e pediu o retorno à prisão. O pedido de reincarceramento também foi rejeitado pelos três ministros que votaram até o momento. Ainda não há data para a retomada do julgamento.
O deputado foi preso preventivamente por determinação do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), no âmbito da Operação Molebolge, da Polícia Federal. Citado na delação premiada de Silval Barbosa como um dos beneficiados, Fabris teria, de acordo com a Procuradoria-Geral da República (PGR), tomado conhecimento da operação e deixado a residência às pressas antes da chegada dos agentes da PF na casa dele para o cumprimento de um mandado de busca e apreensão.
A discussão jurídica no julgamento na 2ª Seção do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), sob a relatoria do desembargador federal Ney Bello, girou em torno de estabelecer se as assembleias legislativas têm a mesma prerrogativa que o Congresso para revisar cautelares determinadas pelo Poder Judiciário, depois da decisão que o Supremo tomou na ação direta de inconstitucionalidade sobre o tema.
O relator, Ney Bello, lamentou bastante o fato de a Assembleia Legislativa de Mato Grosso ter tomado esta decisão antes de um pronunciamento do Poder Judiciário sobre o caso específico. Ele havia rejeitado conceder a soltura, que havia sido solicitada pela própria Assembleia ao TRF-1.
Na visão dele, a decisão do Supremo não trazia uma clareza completa e o tema precisava ser discutido em colegiado no TRF-1. “Não é razoável entender que assembleia legislativa pode lavrar alvará de soltura, desconstruir decisão do judiciário sem que o judiciário tenha deliberado”, disse Ney Bello no início de seu voto.
No entanto, na análise mais aprofundada, o relator concluiu que a decisão do Supremo sobre parlamentares federais deve ser estendida também aos deputados estaduais. “Voto por declarar a perda de objeto do pedido da Assembleia Legislativa, porque o deputado já voltou à atividade, e por negar o pedido de recaptura e reencarceramento feito pelo STF, considerando que esse é posicionamento do STF”, disse.
“A ausência de parâmetros a que estamos submetidos nos leva a lamentar que tenhamos de suportar um alvará de soltura lavrado por resolução de uma assembleia”, disse ele, falando que o peso da decisão da assembleia é dos próprios deputados que devolveram o colega ao cargo.
“Há um custo político disso. A assembleia que assuma este custo. Alguém que em algum momento é encontrado fugindo na calada da noite com documentos de uma busca e apreensão e logo depois é solto por um alvará de soltura da própria assembleia e volta para função da mesa diretora da própria assembleia… Há um custo para a democracia”, disse Ney Bello.
Para o advogado José Eduardo Alckmin, que representa o deputado estadual, a situação nos Estados deve ser considerada a mesma em relação a parlamentares federais. Ele não pôde fazer sustentação oral em defesa do cliente no julgamento.
Esta foi a primeira vez que o Judiciário se manifestou a respeito da possibilidade de Assembleias Legislativas revisarem decisões de afastamento e prisão de deputados estaduais. A decisão, no entanto, não tem efeito vinculante, ou seja, não se aplica a outros casos eventuais.
Revisões
Além da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, já houve outras duas decisões semelhantes no País. A Câmara de Vereadores de Natal decidiu no dia 25 de outubro pelo retorno do vereador Raniere Barbosa (PDT), afastado em julho por suspeita de corrupção, em uma investigação sobre superfaturamento de propina em contratos de iluminação pública na capital potiguar.
Em outro caso, de maior repercussão, a Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte, no dia 24 de outubro, pôs fim ao afastamento do deputado estadual Ricardo Motta (PSB), que havia sido determinado para preservar as investigações sobre um esquema que desviou mais de R$ 19 milhões do Instituto de Desenvolvimento Sustentável do Rio Grande do Norte (Idema/RN) – ele é um dos investigados. A PGR recorreu ao Supremo contra essa decisão da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte.
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, ao analisar a jurisprudência do Supremo, afirmou que o decidido pelo STF em relação a revisão de cautelares no Congresso não pode basear a decisão da Assembleia Legislativa de revogar afastamento. Segundo Dodge, o STF não disse que a decisão vale para todos os Estados. Além disso, o acórdão dessa decisão do STF nem sequer foi publicado, de forma que a extensão do julgamento não está totalmente definida.
“Improcede a alegação de que o Decreto Legislativo está de acordo com a decisão tomada na Ação Direta de Inconstitucionalidade 5526. Primeiro, como necessário aspecto formal, deve ser enfatizado que o respectivo acórdão ainda não foi publicado, de modo que não transitou em julgado”, disse Dodge.
“A Corte, pelo que se verifica, não examinou se esta decisão aplica-se aos Estados membros e condiciona a questão ao encaminhamento do processo à Assembleia Legislativa, ou seja, a situação que não ocorreu no caso em exame”, disse a procuradora.
“Por todas estas razões, o precedente em questão não se aplica à situação analisada e apenas reforça a impropriedade do procedimento da Assembleia Legislativa em se antecipar à necessária comunicação judicial para desconstituir a decisão judicial”, disse a procuradora.