25/01/2002 - 8:00
Ela tem 36 anos, mora sozinha e ganha mais de R$ 10 mil por mês. Tem seu próprio carro e adora viajar. Em casa, seu freezer contém caixinhas de comida pronta congelada, potes de sorvete e uma garrafa de vinho branco. Você acaba de ser apresentado à consumidora do futuro. De acordo com levantamento realizado pela Fundação Instituto de Administração da Universidade de São Paulo, em 2010 55% das mulheres em idade ativa estarão no mercado formal de trabalho ? 12 pontos percentuais a mais do que hoje. E mais, seu poder de compra irá se equiparar ao dos homens. ?A mulher terá mais dinheiro para gastar e veremos um crescimento de oferta de produtos de conveniência que ajudem a tornar a vida dela mais prática e cômoda?, explica James Wright, professor da Faculdade de Economia e Administração da USP e coordenador da pesquisa ?Perfil do Consumidor do Futuro?. ?Viveremos em uma sociedade mais pluralista, com uma variedade maior de estrutura familiar e de estilos de vida, com muitas pessoas morando sozinhas?, afirma Wright. Outra importante característica é o envelhecimento da população: o número de adultos com mais de 50 anos passará dos atuais 28 milhões para 42 milhões. ?Surgirão muitas oportunidades em empreendimentos imobiliários específicos para atender à população na terceira idade e também aos indivíduos que estarão morando sozinhos?, explica Wright.
Ainda que o número de jovens entre 15 e 25 anos deva permanecer estável ? hoje eles representam 18% da população ? o segmento cresce em importância: sedenta por novidades, a rapaziada quer bens de consumo que sigam as tendências da moda e atualização tecnológica constante. Com o adulto de amanhã sendo alfabetizado no teclado de computador, a tecnologia estará em toda a parte. ?Os consumidores ficarão mais sofisticados e exigentes?, explica o analista Luis Anavitarte, da consultoria Gartner Inc. ?E eles querem produtos mais funcionais, com designs cada vez mais arrojados.? Quem percebeu isso cedo foi a fabricante de celulares finlandesa Nokia. Depois de mandar seus engenheiros para os clubes noturnos de Londres para observar de perto como os jovens usavam os aparelhos, a empresa revolucionou seu próprio negócio. De aparelho funcional e instrumento de trabalho, o celular foi transformado em um acessório de moda. Surgiram então as capas coloridas e a famosa campanha ?Conectando Pessoas.?
Desenhados para elas. Algumas dessas tendências já começam a ser sentidas pelas companhias. O aumento do poder aquisitivo das mulheres, por exemplo, se reflete nas vendas da montadora Fiat. ?A influência da mulher na compra do automóvel, seja dela própria ou da família, é cada vez maior?, afirma Lélio Ramos, diretor comercial da Fiat. ?Nos últimos seis anos, o número de proprietárias saltou de 35% para 50%.? Pensando nelas, a empresa tem adaptado seus modelos e campanha publicitária. O último modelo da marca, o Dobló, foi desenhado com assentos mais altos e possui diversos compartimentos para guardar objetos. ?As mulheres gostam de guiar numa posição mais alta, pois se sentem mais poderosas?, revela.
O crescimento do número de pessoas morando sozinhas também está influenciando o desenvolvimento de produtos. De olho nesse público, a Unilever do Brasil lançou em dezembro o Refoga, um tempero à base de alho, sal, cebola e óleo para cozinhar. Além de facilitar a vida das mulheres ? e dos homens ? na cozinha, o produto é ideal para quem mora sozinho, evitando desperdícios.
É claro que nem tudo pode sair exatamente como no script. Pesquisas apontam tendências mas não são uma bola de cristal. Por precaução, as empresas estão usando novas formas de acompanhar as transformações no momento em que elas nascem. Usando técnicas de pesquisa de campo da antropologia adaptadas à era hi-tech, as companhias estão entrando na intimidade desta tribo exótica chamada consumidor. Com câmeras de vídeo, elas invadem seu habitat natural (sempre com consentimento e mediante pagamento de cachê). Conhecido como ?pesquisa observacional?, o novo método é inspirado em programas de ?reality show? tipo Casa dos Artistas e Big Brother e já foi adotado por empresas como a multinacional Procter & Gamble. No ano passado, a P&G espalhou câmeras de vídeo e microfones em 80 residências no Reino Unido, Alemanha e China. ?Você precisa observar as pessoas com o produto no momento exato em que elas estejam usando?, afirmou à DINHEIRO o publicitário Bill Abrams, dono da Housecalls, a primeira agência de marketing a oferecer esse tipo de ?pesquisa observacional?, com sede em Nova York. Abrams cobra US$ 33 mil para bisbilhotar os hábitos de 20 pessoas e já prestou serviço para clientes como Colgate-Palmolive, Kodak, Johnson & Johnson, Bristol-Myers Squibb e Duracell. O modelo pesquisa de campo adotado pela Housecalls é apenas um entre tantos que começam a surgir da tentativa de entrar na mente do consumidor. Nos últimos anos, montadoras como Honda e Toyota chegaram a contratar antropólogos para, literalmente, morar com algumas famílias e observá-las usando os automóveis.