20/12/2021 - 9:51
Sem maioria no Congresso para levar adiante seus projetos, com problemas econômicos no horizonte e a tarefa de curar uma sociedade que emerge de uma campanha polarizada, o novo presidente eleito do Chile, o esquerdista Gabriel Boric, enfrenta uma estrada íngreme.
Os especialistas afirmam que uma das primeiras tarefas de Boric, chamado de “comunista” pelos seus críticos, será tranquilizar os mercados financeiros sobre a estabilidade de uma das maiores economias da América Latina.
Boric, de 35 anos, prometeu em sua campanha impulsionar um “Estado de bem-estar” em um dos países com maior desigualdade social do mundo, uma brecha na origem da denominada “revolta social” de 2019 que abalou o país e sua economia.
Após sua eleição no domingo, prometeu “expandir os direitos sociais”, mas mantendo a “responsabilidade fiscal”.
“Faremos isso cuidando da nossa macroeconomia”, disse.
Mesmo se quiser implementar mudanças radicais no modelo econômico neoliberal chileno, para o jovem presidente será difícil convencer o Congresso, que está dividido em partes iguais entre partidos de esquerda e de direita.
“Governar será muito, muito difícil”, disse à AFP Michael Shifter, do centro de análise Diálogo Interamericano em Washington.
O novo presidente “terá que negociar e fazer acordos e alianças”, estimou.
Isso poderia debilitar seu atrativo entre simpatizantes de Boric com altas expectativas de uma mudança rápida.
“Poderiam se sentir frustrados e então não haveria um descontentamento e desconfiança apenas na direita, mas também decepção em sua própria base”, estimou Shifter.
– “Curar uma nação” –
A participação na votação de domingo (55,4% de acordo com as projeções oficiais) foi recorde em um país de alta abstenção e com um eleitorado de centro que ficou órfão de candidatos quando Boric e o candidato da extrema-direita José Antonio Kast se tornaram adversários na eleição.
Mesmo entre aqueles que apoiaram as políticas socialmente liberais de Boric e suas promessas de mudanças socioeconômicas havia suspeitas de sua aliança política com o Partido Comunista.
Muitos eleitores disseram à AFP que votariam “pelo mal menor” entre Boric e Kast, este último um defensor do ditador Augusto Pinochet (1973-1990).
“Boric terá que curar uma nação”, disse à AFP Patricio Navia, da Universidade de Nova York.
“Mas o processo de redigir uma nova Constituição ainda está em andamento e haverá um plebiscito sobre a nova Constituição em menos de um ano. Então, não acho que tenha muito tempo para curar, 2022 será um ano difícil”, acrescentou.
Uma convenção dominada por representantes de esquerda elabora uma nova Constituição para substituir a aprovada sob o regime de Pinochet, à qual se concede o crédito do relativo bem-estar econômico chileno, mas também é culpada por uma forte desigualdade social.
Segundo uma organização da ONU, 1% dos chilenos possui 25% da riqueza.
Nesta segunda-feira, todos os olhares estão voltados para a abertura dos mercados. A Bolsa de Santiago operava em queda de 6,83% nos primeiros minutos.
“Pode ser que algumas pessoas retirem seu dinheiro do Chile e investidores não venham, isso afetaria a economia e depois as pessoas irão às ruas”, estimou Shifter.
Após uma queda do PIB de 5,8% em 2020 devido às restrições impostas pela pandemia de coronavírus, o Chile termina 2021 com uma projeção de crescimento de 11,5%.
Mas 2022 provavelmente será um pouco mais difícil, com uma desaceleração anunciada, já que os ecos da pandemia persistem.
“Sem dúvida o governo enfrentará dificuldades devido à situação econômica, espera-se uma forte desaceleração nos próximos anos”, disse à AFP María Jaraquemada, do Instituto para a Democracia e Assistência Eleitoral.