20/06/2022 - 4:02
O checheno Islam não é um combatente como os demais. “Se os russos me levarem como prisioneiro, não vão me trocar por ninguém”, afirma o checheno de 33 anos que luta perto da linha de frente com o exército ucraniano.
“Eles vão me torturar e depois me exibir na TV”, acrescenta.
Islam, um dissidente refugiado na Polônia há duas décadas, integrou em abril o batalhão Xeque Mansur, fundado em 2014 após a anexação da Crimeia e formado principalmente por veteranos das guerras da Chechênia.
O grupo foi batizado com o nome de um comandante militar checheno contra a expansão russa no Cáucaso no século XVIII, para recordar que a sede de independência de seu povo é antiga.
Assim como Islam – cabeça raspada e longa barba, como todos os colegas – “algumas centenas de homens” viajaram de maneira voluntária à Ucrânia para ajudar Kiev e lutar contra Moscou.
– Prudência –
Quantos são? Onde estão? Como lutam? Islam, entrevistado em Zaporizhzhia ao lado de outros dois integrantes do grupo, não responde.
Também não revela sua identidade, para evitar represálias contra sua família, que permanece na Chechênia.
De fato, do outro lado da linha de frente, há outros chechenos, leais ao Kremlin e integrados aos comandos “Kadyrovtsy”.
Estas milícias de reputação sinistra estão mobilizadas no exército russo. Alguns citam 8.000 homens, número impossível de verificar.
“Queremos mostrar que nem todos os chechenos são como eles e que muitos consideram os russos agressores e invasores”, argumenta Islam.
Para ele, a guerra de agora é “uma continuidade do que começou no Cáucaso”.
Grozny, a capital da Chechênia, sofreu o mesmo destino que Mariupol, quando foi arrasada há mais de duas décadas pelas bombas russas.
A pequena república de maioria muçulmana foi devastada por duas guerras violentas.
A última, iniciada por Vladimir Putin em 1999, acabou com a chegada ao poder em 2007 do temível Ramzan Kadirov, um pró-Moscou acusado de reprimir violentamente os críticos.
– “Ensinar a guerra” –
Como consequência, 250.000 chechenos fugiram do país e passaram a morar em vários países da Europa, na Turquia e nos Emirados Árabes Unidos.
“Decidi integrar o batalhão para lavar a honra dos chechenos que Moscou tenta fazer passar por terroristas” explica Islam, que é solteiro e documenta na internet os crimes de guerra cometidos pela Rússia, o que rende ameaças.
Ele segue as ordens do vice-comandante Mansur, de 40 anos, que exibe muitas cicatrizes.
“Dois dos nossos morreram, outros ficaram feridos. Mas o importante é estar aqui. Temos coisas para ensinar aos soldados locais”, afirmou o vice-comandante.
Os chechenos, não oficialmente integrados ao exército ucraniano, estão equipados com material recuperado do inimigo.
Eles são alimentados pela população local, de maioria ortodoxa, que parece ter uma opinião positiva sobre os chechenos.
“Não estamos aqui para impor preceitos islâmicos, e sim para combater um inimigo comum e defender a liberdade”, disse Mansur, para quem, no entanto, esta é “uma forma de jihad”.
Como vários chechenos residentes na Europa se uniram nos últimos anos às fileiras do Estado Islâmico, as autoridades ucranianas foram durante muito tempo céticas sobre este tipo de apoio.
Alguns foram incluídos em uma lista de sanções por terrorismo por elementos pró-Rússia no poder, porque são procurados pela Interpol a pedido de Moscou.
“Mas tudo isso foi antes da invasão. Agora a visão do governo (ucraniano) sobre nós mudou”, declarou Islam, que lembra que há combatentes cristãos no batalhão, atualmente considerado um “aliado”.
A tal ponto que alguns ucranianos preferem se unir ao batalhão, e não ao exército.
Este é o caso de Asadula, um atleta que se converteu ao Islã e que afirma admirar estas “pessoas de honra e dignidade”, apesar de tudo que sofreram.
“O desejo de independência e de justiça é um exemplo para todos nós”, declara, orgulhoso de ter sido aceito por seus “irmãos de armas”.