16/04/2015 - 18:00
Uma mansão de quatro mil metros quadrados, no bairro Morumbi, em São Paulo, serviu de cenário para uma das minisséries mais polêmicas exibidas pela Rede Globo, no final de janeiro. Os quartos da luxuosa casa se transformaram em set de filmagem de “Felizes para Sempre?”, que retratou o triângulo amoroso entre um empresário corrupto, sua esposa e uma garota de programa. Durante 15 dias, aquelas paredes e janelas entraram para o imaginário dos telespectadores. Essas mesmas imagens estão há uma década no pensamento dos credores do Banco Santos.
O imóvel pertencia ao ex-banqueiro Edemar Cid Ferreira, do Banco Santos, que sofreu intervenção do Banco Central, em dezembro de 2004, quando devia cerca de R$ 2,1 bilhões aos credores. Agora, a mansão, avaliada em torno de R$ 116 milhões, e as 961 obras de arte apreendidas poderão ser vendidas para pagar parte da dívida. É que, em fevereiro passado, foi suspenso o último entrave legal para a venda dos bens de Cid Ferreira, após o arquivamento de um estudo de tombamento histórico pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turismo do estado de São Paulo, o Condephaat.
O dinheiro levantado pelos leilões, que devem começar a ser realizados até o fim deste ano, será usado para ressarcir 2.116 credores e ser incorporado à massa falida do banco. Mas como os recursos chegariam até o bolso deles? Estão na mesa duas propostas de fundos de investimentos. Uma delas foi elaborada pelo Credit Suisse e, outra, pelo Banco Paulista. Este último pretende estruturar um fundo de investimentos em direitos creditórios (FIDC), em que os credores seriam os cotistas. Uma categoria seria o dos privilegiados, que receberiam primeiramente. Entre eles, estariam a União, que seria ressarcida por impostos atrasados, e aqueles que têm dívidas trabalhistas a receber.
A escolha não é aleatória. Na verdade, segue as regras estabelecidas pela legislação brasileira. Outra categoria seria composta por credores que têm a receber títulos como CDBs. “Caso sobre dinheiro, ele é distribuído entre os que estão na massa falida”, explica Álvaro Augusto Vidigal, presidente do Banco Paulista. No caso de essa proposta ser aprovada, a casa e as obras de arte passam a fazer parte do patrimônio líquido do FIDC. “É uma engenharia financeira comum e tende a beneficiar aqueles que têm direito a ser ressarcidos”, afirma.
“Se não aderirem, a tendência é que a liquidação dos bens demore ainda mais para acontecer e eles vão continuar gerando despesas e menos eficiência.” De fato, a manutenção da luxuosa casa de Cid Ferreira custa mensalmente R$ 70 mil. Até por isso, o imóvel foi alugado para a Rede Globo para cobrir os gastos. “Um fundo como esse tem custos elevados, por isso, para fazer sentido, não pode ser pequeno, de uns R$ 50 milhões”, diz Vidigal. Além da taxa de administração, é cobrada uma taxa de performance, à medida que os ativos são vendidos e os recursos, repassados para os cotistas.
O executivo diz não saber ao certo qual seria o tamanho do FIDC, mas estima que exista algo como R$ 4 bilhões de créditos a serem realizados. “Não será um processo rápido, pode ser que demore 20 anos até que tudo seja liquidado”, diz Vidigal. É por isso que a ideia do Banco Paulista é estruturar um fundo aberto. Com isso, os cotistas que não querem aguardar até o final da liquidação poderiam vender a sua participação para investidores, que possuem apetite por risco e não têm pressa para receber o dinheiro. “Isso suscitaria um incremento do mercado secundário de cotas”, afirma.
É bom lembrar que é uma operação arriscada, afinal, não é certo que vai sobrar dinheiro para pagar todos os credores — velhos ou novos. Outra instituição que quebrou e está se desfazendo de seus bens é o Banco Econômico, que sofreu intervenção do BC, em 1995, após a implantação do Plano Real. Em setembro de 2013, o seu balanço apresentava um patrimônio negativo de aproximadamente R$ 765 milhões. Para fazer caixa, o banco colocou à venda, na quarta-feira 8, 91 imóveis residenciais e comerciais, terrenos e lotes, localizados em sete estados: São Paulo, Bahia, Minas Gerais, Espírito Santo, Goiás, Pará e Rio de Janeiro.
Os lances variavam de R$ 11,60 mil a R$ 244,80 mil, e, ao todo, levantaram R$ 1,3 milhão. Segundo Pedro Barreto, diretor da Superbid, empresa de leilões online, em geral, 40% do lote é vendido e o restante volta para novos lances. “Usualmente, quando um bem não tem comprador, os donos abaixam ao redor de 10% para próximo leilão”, afirma. “Mas, no caso do Banco Econômico, os lances iniciais são os valores mínimos de venda.” Esse dinheiro, assim como o do Banco Santos, é destinado à massa falida. As duas histórias estão bem longe de terem um final feliz para sempre.