Mudar hábitos não é fácil. Deixar o sedentarismo de lado, começar a praticar exercícios físicos e adotar uma alimentação equilibrada podem ser decisões bastante penosas no início. Mas quem vence os obstáculos da inércia e a desculpa da falta de tempo tem mais chances de levar uma vida saudável. As mesmas dificuldades aparecem quando o assunto é a saúde financeira. É difícil resistir ao impulso de vender ações que despencam pregão após pregão. No entanto, os que se atêm à estratégia de investimentos de longo prazo – e entendem que movimentos de baixa são constantes no mercado de capitais – têm grandes chances de obter uma rentabilidade mais polpuda.

Por que é tão difícil tomar decisões racionais e se manter no caminho traçado, quando a bolsa começa a derreter? O planejador financeiro americano Jay Mooreland se dedicou ao tema, na Universidade de Minnesota, e descobriu que, na verdade, o comportamento impulsivo e frequentemente irracional dos investidores não é exclusividade dos momentos de crise. “Eles são tipicamente emocionais”, afirma o especialista, que veio ao Brasil pela primeira vez, para participar do 50 Seminário IBCPF de Planejamento Financeiro, que aconteceu na sexta-feira 9, em São Paulo.

No entanto, as ferramentas financeiras de análise partem do pressuposto de que os investidores são racionais, daí ser comum que tomem decisões inesperadas. “Nas entrevistas que traçam o perfil dos investidores, as respostas refletem o que eles gostariam de ser e não o que são”, diz Mooreland. “É como um primeiro encontro: ninguém fala de seus preconceitos e, sim, de suas expectativas.” É por isso que, quando Mooreland pergunta a uma plateia de investidores sobre o que esperam da bolsa nos próximos 12 meses, eles respondem que o mercado deve apresentar um retorno positivo de 3% a 7%. Na verdade, isso é o que eles gostariam que acontecesse.

“Quase ninguém responde que será negativo, somos otimistas por natureza”, afirma. “Todo mundo ignora o fato de que o mercado pode virar de cabeça para baixo amanhã. As pessoas precisam entender verdadeiramente os riscos que correm ao verem que suas expectativas não são realistas.” Foi pensando nisso que Mooreland desenvolveu um programa com nove passos para a carteira de investimentos ficar em forma. Seguindo à risca esses hábitos, fica mais fácil tomar decisões racionais, que é o primeiro passo para o sucesso. No topo da lista, aparece algo bem simples: seja um investidor, não especule. Em outras palavras, nada de mudar a estratégia no curto prazo.

“Investidores que resistem à tentação maníaco-depressiva dos mercados são mais bem-sucedidos”, diz Mooreland. “Não é fácil, porque as pessoas sofrem mais com as perdas do que ficam felizes com os ganhos, mas é possível.” Mooreland dá o exemplo dos fundos mútuos Morningstar que descobriram que os investidores tiveram um desempenho abaixo do índice de referência por terem entrado e saído da aplicação diversas vezes – geralmente comprando na alta e vendendo na baixa. Outro hábito importante é ter expectativas realistas, ou seja, é preciso ter em mente que momentos de baixa são naturais – até mesmo se a tendência do mercado for de alta. Foi o que aconteceu em 2010, com o S&P 500. O índice teve uma queda abrupta de 16% durante um trimestre, mas no ano subiu 13%.

É importante ficar atento para possíveis oportunidades de investimento que possam surgir para colocar em prática a máxima “compre na baixa e venda na alta”. Ou como dizia Benjamin Graham, economista americano que desenvolveu as primeiras teorias de avaliação de investimentos e é guru de ninguém menos do que Warren Buffett: “Compre quando os outros estão pessimistas e venda quando estão otimistas.” Para não se perder nesse emaranhado de novos hábitos, uma dica é ter por escrito as metas a atingir e os limites de perdas, assim como os ajustes mais recomendados. “O problema é que muitas corretoras e gestoras não conversam sobre isso porque têm medo de mostrar que o investidor está indo no caminho errado”, diz Mooreland.

“Mas se ele está aberto a ouvir pode aprender e, assim, evitar um ataque de pânico e tomar medidas racionais.” Mas quais seriam as vantagens para quem aplica o dinheiro do cliente? Segundo Mooreland, hoje é possível traçar o perfil de investimento pela internet de graça. Dessa forma, com o aumento da concorrência, fica difícil justificar a cobrança da taxa de corretagem. “Com uma abordagem mais psicológica, existe um diferencial”, afirma. “No caso do investidor, quanto mais ele se conhece, mais chances de conseguir um bom rendimento.” Hora de colocar na agenda atribulada de compromissos um tempinho para o divã – vai fazer bem para o bolso.

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Para a carteira ficar em forma

Passo a passo para o investidor ter um portfólio de sucesso

Não especule, invista
Invista pensando no longo prazo e não mude a estratégia no meio do caminho. Isso o diferenciará de um especulador.

Aprenda com o passado
Os movimentos no mercado de capitais são imprevisíveis. Reconhecer os limites da sua habilidade de prever o comportamento dos preços pode evitar erros.

Olhe para a frente
O passado é um bom professor, mas nem sempre é um bom parâmetro para o futuro. O investidor bem-sucedido resiste à tentação de repetir o que já ocorreu, e, ao contrário, analisa cada investimento e o que ele tem a oferecer.

Tenha expectativas realistas
Flutuação dos preços é algo natural, portanto, períodos de baixa são normais. Ter isso em mente pode mitigar riscos.

Como avaliar o portfólio
Medir a distância entre São Paulo e Rio de Janeiro em centímetros não é a escolha mais acertada. O mesmo acontece quando se usa uma métrica de curto prazo para avaliar um portfólio de longo prazo.

Tenha cabeça aberta
Ninguém gosta de ouvir que o seu ponto de vista está errado. No entanto, quando se trata de investimentos, é importante saber ouvir. Só assim é possível calcular o risco potencial da estratégia.

Saiba o que é relevante
Ter mais informações não significa saber mais. Investidores de sucesso distinguem o que é importante de ruído.

Conheça seus limites
Qual é o limite que você está disposto a perder no curto e médio prazos? Saber responder a essa pergunta pode evitar a venda de ativos na hora errada.

Não perca as oportunidades
A velha máxima “compre na baixa e venda na alta” é o caminho para o sucesso. Fácil falar e difícil de fazer. Portanto, a dica é ter por escrito a estratégia de investimento como um compromisso de longo prazo.