13/11/2002 - 8:00
Um bandeira branca com uma estrela vermelha, onde se lê ?Quero Lula Presidente?, logo chama a atenção de quem entra no oitavo andar do prédio de 43 pisos, de um dos dez maiores bancos de investimentos do mundo, Bear Stearns, na Avenida Madison, em Nova York. Numa mesa ao lado, o mexicano Alejandro Gutierrez-Alvarez, conhecido como Alex, vira-se para trás e grita: ?Um cliente compra US$ 5 milhões de C-Bonds a 58 e um oitavo?. O americano Scott Eilbeck, sentado na fileira de trás, responde: ?Vamos fazer?. Alex pega o telefone e fecha a venda de mais um pacote de títulos da dívida externa brasileira. Essa é uma manhã diferente no trabalho de quem negocia ?Brasil?, como se diz no jargão de mercado. Nos últimos cinco meses, os operadores se acostumaram a receber mais pedidos de venda do que de compra dos papéis. ?Antes das eleições, quase ninguém queria arriscar?, diz Scott, diante de três telas de computador. Scott mostra na tela da esquerda um gráfico nervoso, onde se vê os sinais de medo dos investidores. ?Aqui, os brasileiros começaram a vender?, conta ele, mostrando uma forte queda dos C-Bonds em junho. ?Aqui foram os fundos internacionais?, aponta o despenhadeiro seguinte.
Alex e Scott trabalham no centro nervoso da crise brasileira. Alex é vendedor de títulos da dívida. Seu trabalho é recolher pedidos e fazer ofertas a grandes clientes, como fundos de investimentos. Quando recebe uma proposta, consulta Scott, que é o corretor e dá as cotações de mercado. Vinte e
seis andares acima, a paulistana Emy Shayo, vice-presidente do grupo de economia global, escreve relatórios sobre o Brasil para clientes do banco. ?Para bem ou para mal, tudo o que escrevemos sobre o Brasil no banco
repercute?, comenta. Ela orienta clientes, enquanto Alex e
Scott são intermediários na corrente de negócios de títulos, principalmente C-Bonds, que levaram o Brasil à beira do colapso. Os C-Bonds são a grande referência para a economia. Quando a cotação despenca, os juros cobrados do País e das empresas sobem, alimentando o medo de calote. E como se trata de um mercado limitado (US$ 560 milhões por dia), muitas vezes não espelha a situação do País. ?Quando estão muito em baixa, qualquer negócio pode alterar a cotação?, diz Scott.
O que acontece no mercado de C-Bonds afeta não só o Brasil. Como o País responde por 40% das negociações com títulos de países emergentes, todos corretores acabam acompanhando de perto a política brasileira. ?As eleições no Brasil são o primeiro assunto da reunião das 7 horas da manhã. Entendo mais do PT do que muitos brasileiros?, brinca Alex, que tem em sua mesa retratos da mulher e dos três filhos, uma bandeira do México e outra do Brasil e usa gírias em português, como chamar os colegas de ?cara?.
De tanto falar em Lula, Alex fez uma aposta. Acreditou
nos argumentos sobre a força do governo nas eleições e prometeu US$ 200 a um colega se Lula ganhasse. Alex perdeu, pagou e, de brincadeira, colocou a bandeira do PT no meio do amplo salão, onde também se negociam outros mercados de risco. A bandeira só foi tirada uma vez, na visita de funcionários do governo brasileiro. Com a vitória de Lula, não sai de lá tão cedo. ?Agora somos governo?, brinca Alex, enquanto checa as ofertas pelos títulos brasileiros.