30/11/2016 - 19:00
Atuar na indústria de fundos multimercados requer estômago forte e frieza, tal como acontece com atacantes em partidas decisivas, além da capacidade de acreditar que é possível vencer mesmo um adversário temível. Esse foi o cenário para muitos fundos multimercados ao longo de novembro. A turbulência provocada pela eleição de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos tumultuou o mercado. Com isso, vários fundos perderam para o CDI em novembro, que acumula alta de 0,81% no mês. Em alguns casos mais extremos, os ganhos acumulados nos dez primeiros meses do ano simplesmente evaporaram.
No entanto, alguns gestores conseguiram virar o jogo. Foi o que aconteceu com o fundo Versa, da gestora GTI. O fundo, que combina proteção cambial, ações, contratos futuros e opções, acumula a maior rentabilidade do segmento neste ano, um ganho de impressionantes 147,94%. No ano passado, o Versa passou a alavancar seus investimentos e adotar a estratégia long short, na qual compra uma ação e vende outra para obter uma rentabilidade fixa. “Assumimos uma posição acreditando que Dilma Rousseff não terminaria seu segundo mandato”, diz o gestor Luiz Alves Jr.
Tudo parecia encaminhado quando, em janeiro, veio a primeira grande onda de volatilidade, com o temor da desaceleração chinesa. Com uma posição comprada em bolsa equivalente a 150% do patrimônio, o efeito foi devastador. “Perdemos 40%, mas mantivemos nossa posição porque acreditávamos nos fundamentos”, diz Alves. Em março, a estratégia começou a dar lucro. “Subimos 80% com a reprecificação de ativos de risco. Mas passamos a usar opções para blindar o patrimônio contra perdas.” O “kit impeachment” do Versa incluiu ações de estatais que se beneficiariam de uma mudança na gestão e de empresas como Gerdau, que gera metade de seu caixa nos Estados Unidos.
A Versa lucrou com a expectativa de melhora dos resultados da empresa nos EUA, na esteira das medidas protecionistas que foram sendo defendidas por Trump durante sua campanha. As ações subiram 202% no ano, quase metade dos ganhos. Um fator que fez diferença no último mês foram as ações da exportadora de celulose Fibria. Elas foram beneficiadas pela alta do dólar, imediatamente antes e após a vitória do republicano. Os contratos futuros do índice de ações americano Standard & Poor’s de 500 ações (S&P 500) exerceram o mesmo efeito. Outra proteção mais recente adotada por Alves, por conta da queda na produção industrial em outubro, foi a compra de opções de venda de Vale e Petrobras.
“Hoje, quando olhamos riscos como o referendo na Itália no começo de dezembro, que pode afetar as ações de bancos, adotamos algum nível de proteção”, diz ele. Outro fundo que brilhou foi o Macro FI, da Mauá Investimentos. A estratégia do fundo foi revista em outubro, quando o gestor Marcelo Lubliner resolveu embolsar os lucros pós-impeachment e reduzir a exposição ao Brasil. “Avaliamos que os ativos já tinham realizado seu potencial de valorização e reduzimos nossa exposição”, diz ele. O fundo opera apenas com títulos de renda fixa e ativos ligados ao câmbio.
“Tínhamos uma posição comprada em real e vendida em dólar, que desfizemos quando a paridade entre as moedas chegou a R$ 3,15, antecipando a turbulência com a aproximação da eleição americana”, diz Lubliner. “Acreditamos que há espaço para uma valorização do dólar, mas, isso vai depender de medidas que Trump ainda pode tomar”, diz Lubliner. “Os títulos do Tesouro americano ainda têm de se estabilizar para haver a reprecificação dos ativos no pós-eleição”, diz ele. Para proteger o portfólio enquanto aguarda um cenário mais favorável, Lubliner comprou opções de venda de Ibovespa. Novas oportunidade só em dois ou três meses, com o novo presidente já no cargo. “A poesia dos fundos multimercados é essa ação tática, que nos permite responder de forma rápida quando há oportunidades ou riscos.”