Poucos são os executivos de alto escalão que decidem trocar o trabalho em uma grande multinacional pela oportunidade de empreender em busca de um propósito de vida. Foi o que fez Rafael Sousa. Funcionário do grupo JBS durante 13 anos, ele ocupava a função de CFO global da Seara quando saiu da empresa. Seu sonho? Criar uma fintech de impacto social que tem o compromisso de destinar 11% do lucro para iniciativas sociais. Assim nasceu a Segue, em novembro de 2022.

Sousa reconhece que não foi fácil tomar a decisão de deixar um emprego estável pelo sonho de poder fazer mais pelas pessoas. Em 2016, ele havia trocado o Brasil pelos Estados Unidos, para trabalhar na Swift. Cinco anos depois, em plena pandemia, assumiu o comando financeiro da Seara. “Estava no meu melhor momento profissional. Tinha ótimas perspectivas e já havia rodado o mundo inteiro. Mas precisava conseguir impactar a vida das pessoas, colocar o meu melhor à disposição da sociedade”, disse Sousa à DINHEIRO. “Foram 13 anos de uma grande experiência, com muitas oportunidades na JBS”, afirmou.

Apesar da mudança de rota, o caminho financeiro estava mantido no planejamento de Sousa. Só seria preciso outro olhar para o modelo de negócio. Na visão dele, as fintechs apenas olhavam para os produtos oferecidos e não para as pessoas. “A prova está no fato de que a gente nunca teve uma sociedade tão endividada como atualmente”, disse, referindo-se aos 72 milhões de brasileiros inadimplentes, segundo levantamento do Serasa. “Eu quero ser uma solução para isso. O sistema financeiro não entendeu o que significa impacto social.”

EQUILÍBRIO

Mudar essa realidade é o objetivo da Segue. “Todos os meses vamos destinar 11% do lucro para o impacto social. Juntos, os principais bancos do Brasil lucraram R$ 30 bilhões no primeiro semestre do ano passado. Imagina colocar 11% disso em causas sociais? O tema ESG não pode ser tratado como marketing.”

Junto ao projeto de destinação de lucro a entidades está a construção de um hospital em São Paulo, incluindo todos os equipamentos para o funcionamento, até 2026, a ser entregue para o poder público. O custo dessa ação está estimado em R$ 25 milhões. E virá do dinheiro que iria para o bolso do executivo, do lucro da empresa.

A Segue alcançou o ponto de equilíbrio em novembro e já foi possível destinar recursos a duas entidades: uma em Osasco (SP), onde foram entregues calçados para crianças, e outra na Vila Madalena, em São Paulo, com a entrega de alimentos. “Minha proposta é de ação com recorrência. Os clientes vão escolher os projetos, que precisam ter ações vinculadas às iniciativas ESG. O dinheiro precisa ter um propósito”, disse.

Até aqui, a Segue atingiu o volume de R$ 35 milhões em operações, a maior parte em crédito consignado a aposentados e pensionistas do INSS. A empresa saiu do zero para um faturamento de R$ 10 milhões em 2023. Para este ano, a perspectiva é de faturar R$ 250 milhões com este produto. Em fevereiro, a Segue lança o consignado privado. Mas ele assegura que o plano não é de sair oferecendo empréstimo e sim analisar o cenário financeiro das pessoas.

“O sistema hoje não está preocupado se você tem 10 dívidas. Eu não quero dar outra dívida e sim fazer um diagnóstico se é possível acabar com o débito caro por outro mais barato. Se o meu crédito for mais caro, eu vou negar”, disse. Também pretender implementar o serviço de telefinanças, uma espécie de telemedicina, mas com um assessor financeiro para ajudar o cliente em um momento de urgência relacionado a dívidas. “Será um socorro no momento de desespero.”

Sousa garante que, ao fim de sua jornada, daqui a muitos anos, quer chegar ao ponto de distribuir 85% do lucro de sua empresa. “Não tenho plano B. O plano A é fazer com que a Segue dê certo. Lá na frente quero que meus filhos herdem o meu legado e não o que eu construí materialmente.”