15/12/2010 - 21:00
Curt Baumgart sempre tinha uma frase pronta para cada situação do dia a dia e foi lançando mão de pequenos provérbios que norteou a formação profissional dos filhos. A que ele mais repetia era “Klein und fein” ou simplesmente “pequeno e bom”. De acordo com o velho Curt, era melhor ser pequeno e fazer tudo com perfeição. Ser o melhor em cada ramo de atuação. E ele esteve entre os melhores. Morreu aos 74 anos, em agosto passado, com problemas cardíacos.
Alexandre Baumgart, diretor comercial da Vedacit e filho de Curt
Mas os negócios deixados por Curt estão longe de ser pequenos. Conhecido como o rei da zona norte de São Paulo, Curt ergueu um império naquela região por enxergar oportunidades onde os demais viam apenas um brejo cercado de lagoas.
Foi Curt quem insistiu para que o pai, Otto Baumgart, fundador da indústria de hipermeabilizantes Vedacit, comprasse uma área de 410 mil metros quadrados, ainda na década de 60. Foram necessários 20 anos apenas para aterrar a área.
Quando os negócios de shopping center ainda engatinhavam por aqui, Curt resolveu apostar nos centros de compras e fundou, no antigo brejo, o maior shopping center da América Latina, o Center Norte.
Era só a ponta de um conglomerado comercial que hoje inclui um shopping center especializado em móveis e utilidades domésticas, um centro de exposição e, como uma coisa puxa outra, um hotel da bandeira Novotel, bem ao lado da área onde aconteceram mais de 50 eventos, só em 2010.
“Uma das coisas que ele repetia sempre aqui é que todo mundo sempre procura o caminho mais fácil. Se você optar pelo mais difícil, vai suar mais, em compensação, vai faturar mais também”, afirma Alexandre Baumgart, 41 anos, filho do meio de Curt. E de faturamento a família entende bem. A holding que concentra os negócios do grupo vai encerrar 2010 com receita de R$ 600 milhões.
Curt Baumgart: criou um conglomerado com o lema de fazer pouco e benfeito
Não é só o império construído pela família Baumgart que chama a atenção. A forma como o processo sucessório foi conduzido pelo filho mais velho de Otto Baumgart também é muito peculiar.
Alexandre explica que cada filho de Otto Baumgart – além de Curt, o mais velho, há Roberto e Úrsula, gêmeos de 70 anos – tem um terço das ações do conglomerado. Roberto e Úrsula ainda dão expediente na Vedacit e cada um designou um filho para representá-los na holding.
“Não há um presidente e cada filho representa o ramo familiar em todo o negócio”, explica Alexandre. Assim, é Carlos, 45 anos, quem cuida dos interesses dos herdeiros de Curt.
Otto, de 30 anos, é o representante dos descendentes de Roberto e Marcos representa a mãe, Ursula, e seus irmãos. Confuso? “Para nós, não”, responde Alexandre, diretor comercial da Vedacit. Segundo ele, não é preciso haver um presidente acima de todos, tampouco há um conselho de administração.
“Um dos ensinamentos de meu avô e de meu pai é que a família tem que trabalhar pela empresa e não ao contrário. Desta forma, aqui dentro, todos têm um objetivo comum que é fazer os negócios prosperarem”, afirma Alexandre, que é diretor comercial da Vedacit.
Segundo ele, há pelo menos dez anos, Curt iniciou o processo de sucessão e foi ele quem fez a divisão dos negócios em três holdings, cada uma representada por um membro da terceira geração dos Baumgart.
Os membros da família não parecem preocupados com o que dizem os livros de administração ou os gurus da sucessão familiar. Ao contrário. Alexandre demonstra ficar realmente incomodado com o tema.
“Perguntam quando vamos profissionalizar a empresa, como se não fôssemos profissionais. Todos aqui têm sólida formação acadêmica e experiência profissional”, afirma ele, que aproveita para alfinetar os consultores da área.
“A matemática nestes casos é muito simples: apresenta-se uma grande dificuldade para vender-se uma grande solução. Não tiro o mérito de existir essa demanda por consultores externos, mas achamos que, nos dias de hoje, se você não sabe como lidar com os desafios dos negócios não vai sobreviver.
E há desafios muito maiores do que questões familiares. O mercado, a concorrência, as multinacionais são apenas alguns deles”, diz Alexandre, que é engenheiro mecânico por formação, tem pós-graduação em administração e marketing e um MBA em marketing.
Antes e depois: até a década de 60, uma lagoa ocupava a área onde hoje é o Center Norte, um dos maiores
shoppings da América Latina (à esq.). A Vedacit (à dir.) nos anos 1930 e hoje num espaço que ocupa mais de um quarteirão
Para o consultor Ronaldo Da Matta, da RM Consultoria e especialista em sucessão familiar, as relações podem até ser boas entre irmãos, tios e sobrinhos, cunhados e primos.
Mas uma pessoa que não tenha o sobrenome da família pode ser importante não só para intermediar conflitos como para evitar que eles acontecem. “É claro que eles são craques no que fazem. Mas não são craques em sucessão e, por experiência, asseguro que cada herdeiro imagina um futuro diferente para o mesmo negócio.”
Da Matta lembra, porém, que a questão mais delicada é a que diz respeito aos princípios da governança corporativa. “A primeira pergunta de um banco quando você demanda um empréstimo é quem vai pagar a conta. No caso de família, o devedor pode ser uma criança hoje e, se não houver princípios claros de governança, você terá problemas”, afirma o consultor.
Isso também não preocupa os Baumgart. Alexandre não revela o percentual, mas assegura que a maior parte da receita obtida pelo grupo é reinvestida nas empresas. “Não temos nenhuma intenção de abrir capital e muito menos de recorrer a financiamento bancário.
Nosso endividamento hoje é próximo de zero e estamos muito satisfeitos com a forma com que estamos conduzindo os negócios. Trabalho para duas coisas na vida: minha família e nossas empresas. Nenhum Baumgart pensa ou age diferente dessa máxima”, diz ele, repetindo um dos ensinamentos do velho Curt.