“Todos têm direito à sua própria opinião, mas não aos seus próprios fatos”. A frase do economista e ex-Secretário de Defesa dos Estados Unidos James Schlesinger é extremamente atual e pertinente, embora date da década de 1970. Vivemos em um mundo onde a opinião tende a ser muito mais importante do que a realidade, do que os fatos em si. É disso que trata o livro Factfulness, de Hans Rosling, um tratado em defesa da importância de analisarmos fatos e a realidade antes de formarmos a nossa opinião. Segundo o autor, de uma forma generalizada, mesmo entre as pessoas mais bem informadas do mundo todo, existe um profundo desconhecimento sobre os principais fatos e dados relacionados às principais questões que formam a nossa sociedade. Segundo Rosling, “nossos cérebros frequentemente se apressam em chegar a conclusões sem muita ponderação”. Isso ocorre tanto por nossos vieses inconscientes quanto por uma reação atávica que trazemos de nosso passado como caçadores-coletores, quando a velocidade da reação muitas vezes era mais importante para nossa sobrevivência do que a análise da situação em si.

Muitas das inovações com as quais convivemos hoje em nossa vida cotidiana foram originadas de uma visão absolutamente inusitada de fatos há muito conhecidos

A doença da opinião desinformada ganha tons de epidemia quando o Império da Dopamina (as mídias sociais) se transforma em seu principal vetor de disseminação. Esse processo, que inicialmente se estabeleceu nas camadas sociais com menor acesso à informação, hoje está presente entre executivos, acadêmicos e até mesmos entre líderes de organizações importantes. Imaginem se Joseph Goebbels, ministro da propaganda nazista de Adolf Hitler, pudesse se utilizar das mídias sociais atuais para concretizar sua famosa estratégia: “Uma mentira contada mil vezes torna-se uma verdade.”

No mundo empresarial, essa epidemia age na contramão da inovação, que se dá através de nossa capacidade de associar informações e conhecimento, muitas vezes absolutamente desconexos, armazenados em nosso cérebro. Esse conhecimento é adquirido através de nossa capacidade de observar, questionar, socializar e experimentar. Não se trata de adivinharmos a melhor experiência do cliente e sim de mergulhar na realidade e buscar o verdadeiro entendimento das necessidades de nosso público.

O ato da inovação, aquele famoso insight estratégico, emerge de uma percepção diferenciada de fatos, sempre fatos. É quando se rompe a ligação entre a memória de longo prazo e a percepção do presente. Em outras palavras, conseguimos ver para além do que todos estão acostumados a observar em determinado fato ou conjunto de fatos. Muitas das inovações com as quais convivemos hoje em nossa vida cotidiana foram originadas de uma visão absolutamente inusitada de fatos há muito conhecidos. Na visão de René Descartes, um dos filósofos mais inovadores da história: “É necessário que ao menos uma vez na vida você duvide, tanto quanto possível, de todas as coisas”. Essa é a essência da inovação. Ao duvidar, baseie-se em fatos, observação e experimentação — e nunca na adivinhação e opinião vazia.

Se você de alguma forma sente que contraiu a Síndrome da Opinião Vazia, atenção. Principalmente se você ocupa uma posição de liderança. Não aceite opiniões sem consistência, seja crítico sem ser deselegante, se informe através de veículos sérios, pense muito antes de tomar decisão baseada em opiniões seja lá de onde elas possam vir. Não confunda opinião com intuição. A intuição é um processo ainda muito controverso e pouco conhecido, mas que deve servir como input para pesquisa. Use sua racionalidade como vacina para a essa síndrome que pode acabar com sua carreira.

*Jorge Sant’Anna é diretor-presidente e cofundador da BMG Seguros e membro do conselho de administração da Associação Brasileira de Bancos