Na Bolsa de Valores de São Paulo há um seleto grupo de 33 empresas, que reúne nomes como Perdigão, Natura, Grendene e Embraer. É o Novo Mercado, ao qual só podem aderir companhias com práticas de governança corporativa e regras societárias acima do que é exigido por lei. No próximo dia 17, a fabricante de telhas e caixas-d’água Eternit entra para esse clube. Com um faturamento de R$ 500 milhões e lucro líquido de R$ 34 milhões no ano passado, a empresa, dona de uma mina de amianto em Goiás e cinco fábricas em quatro Estados, é líder do setor, com 28% do mercado total (residencial, industrial). No Brasil, de cada dez casas com telhado de fibrocimento (aquela placa cinza), cinco são Eternit. Até aqui, tudo parece muito bem. Senão por um detalhe: a matéria-prima dos produtos Eternit é o amianto. Causador de doenças graves nos pulmões, como câncer, o material foi banido em 40 países e em três Estados brasileiros (PE, RJ e RS). Sua principal rival, a Brasilit, deixou o amianto de lado e partiu para produtos à base de fibra plástica. A Eternit, entretanto, continua apostando no polêmico material. Resta saber até quando ela conseguirá se sustentar com um produto condenado.

No que depender de Élio Martins, presidente da Eternit, a vida da empresa será longa. “Vamos continuar com o amianto até que surja uma alternativa tão rentável quanto”, diz. Ele garante que o amianto da Eternit não oferece riscos à saúde, por duas razões. A primeira é que, desde 1980, a Eternit não usa mais o amianto anfibório, o tipo cancerígeno. “Utilizamos o crisotila, que até hoje não apresentou problemas”, explica. A segunda razão, segundo ele, é que agora a companhia tem tecnologia para diminuir a níveis seguros a exposição dos trabalhadores à fibra do amianto. “Há 26 anos não registramos nenhum caso de doenças provocadas por amianto”, afirma.

Mas se o amianto não é o fantasma que pintam ? como diz Martins ?, por que a rival Brasilit teria investido R$ 120 milhões para adaptar suas fábricas à produção de telhas e caixas-d’água 100% livres do material? “Foi pressão dos acionistas da matriz, na França”, diz Roberto Netto, diretor da Brasilit, que pertence ao grupo Saint Gobain. Do lado da Eternit, Martins garante que nem mesmo a proibição em alguns países afeta os negócios da empresa, que exporta 63% da fibra que produz para Índia, Indonésia e Colômbia. “Sabemos quais os males que o amianto pode causar e sabemos também como evitá-los. Não vamos trocar o certo pelo duvidoso e ainda entrar no prejuízo”, afirma o executivo, provocando a concorrência. Netto, da Brasilit, defende-se: “É verdade que nossos custos cresceram 15%. Mas a diminuição na rentabilidade é compensável pela segurança do nosso produto”, diz. “E nos livramos de, no futuro, ter que arcar com indenizações milionárias a funcionários que possam estar se contaminando agora.”

Desse risco a Eternit não está livre. Em 2004, o Tribunal de Justiça de São Paulo sentenciou a empresa a pagar US$ 170 milhões a 2,5 mil vítimas do amianto. A companhia recorreu do processo, que agora está em segunda estância. A briga judicial pode demorar. Mas se for condenada, a dívida será maior que o valor de mercado da Brasilit, hoje estimado em R$ 330 milhões (US$ 150 milhões). “Mesmo que sejamos condenados, cada uma dessas 2,5 mil pessoas teria que entrar com ações individuais para conseguir a indenização. Isso dificilmente ocorrerá”, afirma.