19/10/2011 - 21:00
Uma decisão polêmica tomada pela Suprema Corte dos Estados Unidos, no início do mês, representa um tapa na cara do velho modelo que regulamenta a questão dos direitos autorais naquele país e pode dar novos contornos à discussão sobre música digital no mundo. O órgão reiterou a decisão de um tribunal federal em Nova York, que julgou que fazer o download de uma música pela internet não significa execução pública desse tipo de material. A questão é que, assim, a verba arrecadada com direitos autorais via canais digitais diminuirá. As principais críticas à novidade partiram da American Society of Composers, Authors and Publishers (Ascap), entidade que atua no controle dos direitos autorais. A associação argumenta que, como os downloads seriam execução pública, os detentores de direitos autorais deveriam ser remunerados a cada vez que um americano baixasse uma música. Esse discurso não colou, o que agradou às empresas de internet, que pagarão menos aos autores de músicas e, em alguns casos, às gravadoras.
É perfeitamente compreensível a preocupação dos responsáveis pelos direitos autorais e, em certa medida, também dos produtores de discos. A revolução deflagrada pelo Napster, o site de compartilhamento de música lançado em 1999, tirou a força do CD. As vendas de discos nos EUA em 2005 foram de US$ 11,2 bilhões, valor que despencará para US$ 5,5 bilhões neste ano. Enquanto isso, a verba obtida com o produto digital cresce: saiu de US$ 636 milhões em 2005 e deve alcançar US$ 4,6 bilhões em 2011, pouco menos que um empate técnico em relação ao desempenho do CD. Mas o cerne da questão é outro. Extrapolando a questão sobre perdas e ganhos comerciais imediatos em função da decisão da Suprema Corte, o mais relevante a observar é a vereda aberta pela legislação: e se outros países seguirem o exemplo? Vai representar um golpe no velho modelo. Para as gravadoras, a lição a se tirar do episódio é que a indústria não deve depositar toda a esperança de salvação de seu negócio nesse tipo de comercialização. Afinal, não dá para nadar contra a maré. A cultura da internet está amplamente alicerçada no compartilhamento de informações – dados, vídeos, som –, algo que começa a ser amparado por decisões judiciais.
A tendência no novo cenário do mercado é a circulação livre da música pela rede. Sim, será possível ganhar algum dinheiro com a comercialização pelos canais digitais, mas não se deve esperar que isso tire as gravadoras do atoleiro. Esse é o ponto.É mais realista buscar outras frentes de receita. Indo mais fundo: é necessário se reinventar. Deve-se ter a clareza de que é inexorável o fato de a indústria fonográfica – embora a venda de canções pelos canais digitais vá continuar a existir, assim como a de CDs – ser um negócio mais enxuto daqui para a frente e precisar se adaptar ao novo contexto. Assim, a diversificação das atividades é necessária. Por que não mudar o perfil de atuação, deixando de viver apenas da comercialização de música, para gerar receitas também com a promoção de shows de seus artistas, gerenciamento de carreiras de bandas e a criação de projetos musicais e marketing que possam render patrocínios de empresas? Por enquanto, quem está na dianteira das inovações são os próprios músicos. Além de recursos com os shows, eles passaram a recorrer ao crowdfunding, comércio eletrônico e às redes sociais para fazer seus acordes ecoarem mais longe e, assim, garantir a sua sobrevivência na era digital.