19/02/2010 - 4:49
Financistas são pessoas estranhas. Quando fecham um grande negócio, mandam fazer uma lápide. No jargão do mercado, uma tombstone. Como nos cemitérios, ela serve para perpetuar uma lembrança. Não de uma pessoa, mas de uma operação lucrativa. Banqueiros e investidores de capital de risco preferem as lápides de acrílico.
Lembranças: Tombstones de algumas operações de private equity realizadas pelo Advent no Brasil, como a compra da rede Frango Assado
Os números e logotipos vistosos servem para decorar os escritórios e impressionar novos clientes. Na sede brasileira do grupo Advent International, em São Paulo, as peças que você vê na foto acima estavam fechadas dentro de um móvel de uma sala de reuniões. Muitas trazem histórias felizes, de negócios que deram certo. Outras, nem tanto.
A mais recente envolve a International Meal Company (IMC), empresa de alimentação que faturou R$ 507 milhões nos primeiros nove meses de 2009, 66% acima do mesmo período no ano anterior. No Brasil, a IMC é dona de marcas tradicionais como Frango Assado, Viena e Brunella.
?Ninguém investiu como nós na crise? Patrice Etlin
Com 191 lojas no Brasil, no México e no Caribe, a companhia cresce a passos largos e atinge milhões de pessoas que passam por shopping centers, rodovias e aeroportos e buscam uma refeição rápida. ?Somos a maior rede de casual dining em sete países da América Latina?, orgulha-se Patrice Phillippe Nogueira Baptista Etlin, principal sócio do Advent no Brasil.
Mas nem tudo são flores na mesa do executivo. No início de fevereiro, ele desistiu de lançar ações da IMC na Bovespa ainda este ano, como pretendia, e pediu o cancelamento da oferta pública de R$ 1 bilhão. Os investidores potenciais, nervosos com a situação econômica frágil em alguns países europeus, como a Grécia exigiram um desconto muito grande sobre os preços sugeridos para as ações da IMC, cerca de 30% abaixo do mínimo aceitável por Etlin. Ele recusou. ?Não vamos queimar uma operação como essa?, afirmou à DINHEIRO, em sua primeira entrevista sobre o assunto. ?Não temos pressa.?
Nos últimos anos, o Advent fez mais de 140 IPOs (sigla, em inglês, de ofertas públicas iniciais) mundo afora. As bolsas costumam ser a melhor porta de saída para os investimentos do grupo, que aporta recursos e gestores em companhias com alto potencial de crescimento para vendê-las depois de alguns anos, com um bom lucro ? é o que se chama de private equity.
O dinheiro para as compras vem de investidores internacionais, que correm riscos por até dez anos. Na América Latina, o Advent já investiu US$ 3,5 bilhões, a maior parte disso no Brasil. Desde setembro de 2008, Etlin aplicou R$ 1 bilhão em quatro empresas: Frango Assado, Cetip, Kroton Educacional e Quero Quero. ?Ninguém fez isso na crise mundial?, gaba-se. Nenhum centavo para as aquisições foi levantado localmente. ?Nossos clientes são investidores institucionais estrangeiros?, diz Etlin.
Nos últimos 13 anos, ele e seus três sócios locais ? Juan Pablo Zucchini, Martin Escobari e Luis Antonio Alves ? estiveram por trás das aberturas de capital de nomes como CSU Cardsystem, Microsiga (Totvs), Paraná Banco, Dufry, Kroton e Cetip. Todos parecem ter sido um ótimo negócio para o Advent e, principalmente, para os cotistas de seus fundos.
Estratégia: Rede internacional de lojas em aeroportos, a Dufry é uma das apostas da Advent que ainda não decolou. A CSU virou mico e já foi vendida
Mas nem todos os investidores nos IPOs ganharam dinheiro, especialmente no caso da CSU Cardsystem e do Paraná Banco. A CSU, processadora de transações com cartões de crédito, revelou-se um grande mico. Quem investiu R$ 100 no IPO da companhia do empresário Marcos Ribeiro Leite teria, hoje, menos de R$ 45 para contar história. No caso do Paraná Banco, da família Malucelli, os R$ 100 do IPO valeriam R$ 86. No final do ano passado, Etlin aproveitou a alta das cotações e vendeu as últimas ações que detinha na CSU e no Paraná Banco. Recebeu mais de R$ 700 milhões. ?Para nós, 2009 foi um ano sensacional?, diz ele.
O objetivo dos fundos de private equity é gerar valor nas companhias investidas. Trabalhos acadêmicos sugerem que estreantes na bolsa que passaram por investimentos dessa natureza têm melhor comportamento nos pregões do que as novatas sem essa característica. ?Como o dinheiro não é deles, os fundos têm que vender a empresa depois.
Isso é positivo e se reflete na gestão e no desempenho da empresa após o IPO?, afirma Andréia Maria Minardi, diretora do Insper. Mas o que dizer aos investidores da CSU e do Paraná Banco? Seriam um indício de problema no modelo do Advent? Etlin diz que não. ?São exceções.
Nos tornamos investidores muito pequenos após os IPOs e não tínhamos influência na gestão dessas duas empresas?, afirma. Reservado, ele não dá detalhes do que teria dado errado no relacionamento com os controladores. De todo modo, como são duas empresas do Novo Mercado, não deveriam apresentar problemas de governança.
Segundo Etlin, um engenheiro eletrônico de 46 anos que começou a vida profissional projetando sistemas para satélites na França, a história é mais feliz nas companhias nas quais o Advent mantém participação acionária relevante. Gestores profissionais e conselheiros indicados pelo fundo fazem a diferença, argumenta.
Na Atmosfera, rede de lavanderias industriais, os conselheiros independentes são Horácio Lafer Piva, ex-presidente da Fiesp, Fernando Sotelino, ex-Unibanco, e Maurizio Mauro, ex-Booz Allen Hamilton. ?Há muito espaço para o modelo deles no Brasil?, diz Piva. Etlin garante que tem pelo menos US$ 1,3 bilhão para investir. Ele sabe ganhar dinheiro, embora isso não signifique lucro certo para todos os investidores. O que dirá sua próxima lápide?