O deputado federal Paulo Salim Maluf (PP-SP) é a melhor síntese do que a política brasileira tem de pior. Corrupto comprovado e procurado pela Interpol, amargou 40 dias no xilindró em 2005. Foi um gestor público de competência questionável, que patrocinou obras caríssimas que privilegiaram o transporte individual, em detrimento do metrô. Seus túneis e viadutos pouco aliviaram o trânsito de São Paulo, que se tornou moroso a ponto de reduzir o crescimento de toda a economia brasileira. Irresponsável fiscal, ao encerrar seus mandatos, Maluf invariavelmente deixou para trás um orçamento público transformado em terra arrasada. 

 

67.jpg

 

Incorrigível antidemocrata, defendeu uma polícia violenta e sempre baseou sua estratégia eleitoral em um estridente ataque às garantias individuais – “direitos humanos só para os humanos direitos”, dizia ele nos anos 1980, com sua inconfundível voz anasalada. Contorcionista ideológico, alardeou um anticomunismo visceral todas as vezes que subiu em um palanque, o que não o impediu de apoiar a candidatura vitoriosa do petista Fernando Haddad à prefeitura paulistana em 2012. No entanto, apesar dessa fornida folha corrida, Maluf pode ser o patrono improvável de um avanço na gestão pública. Desde que bem aplicada, uma decisão de 1996, seu último ano na prefeitura, tem todas as condições de gerar bons frutos. 

 

Desde então, os 150 mil servidores municipais são obrigados a declararseu patrimônio pessoal anualmente. A ideia é detectar enriquecimentos inexplicáveis, indicativo seguro de malfeitorias. Há fortes indícios de que esse controle é necessário. Um levantamento preliminar mostra que 60 servidores construíram um patrimônio igual a 100 vezes seus salários nos últimos dez anos. Outros cinco conseguiram amealhar o equivalente a 576 vezes o que receberam. O caso mais evidente é o de Hussain Aref Saab. Mesmo recebendo R$ 9.400 por mês de salário, Saab foi denunciado pelo Ministério Público por amealhar, em menos de sete anos, um patrimônio de 106 imóveis, avaliados em mais de R$ 70 milhões. 

 

Tanta prosperidade, suspeitam os procuradores, pode ter uma longínqua relação com o fato de ele ter sido o responsável por aprovar grandes obras na capital nesse período. Desde sua implantação, a norma criada por Maluf foi aplicada de maneira burocrática. As declarações eram enviadas em papel ao departamento da Prefeitura responsável pela gestão de pessoal. Em casos suspeitos, os controles internos solicitavam as declarações e, se as desconfianças se aprofundassem, os números eram comparados aos da Receita Federal. Agora, os dados serão informados de maneira digital à Prodam, empresa de processamento de dados paulistana. 

 

Quem não apresentar essa declaração poderá ficar sem receber salário. Há alguns riscos na proposta. A digitalização dos dados permite a ação de hackers e torna mais fáceis os vazamentos de informações sigilosas, o que pode dar espaço a usos políticos das mesmas contra quem desagradar o mandatário da vez. Outra dificuldade é que os servidores municipais são obrigados a manter sigilo dos dados, mas os funcionários da Prodam são, em grande parte, terceirizados. No entanto, mesmo com a possibilidade de usos malúficos – ou melhor, maléficos –, a transparência vai facilitar a identificação das maçãs podres em meio à enorme massa de servidores dedicados da Prefeitura. Algo surpreendente, tendo em vista a autoria da ideia.