O grande vilão do homem contemporâneo é a balança. No Brasil, cerca de 30% da população está acima do peso ideal e 1 milhão de pessoas têm obesidade mórbida. É uma massa espetacular de gente lutando, diariamente, para entrar em forma, o que tem despertado o interesse da indústria farmacêutica e de alimentos, dos hospitais e clínicas de cirurgia plástica, do ramo editorial e até mesmo do turismo. Acredite, os livros de dieta já aparecem na lista dos mais vendidos e o Brasil é o único lugar do mundo onde as pessoas participam de um cruzeiro marítimo com um único objetivo: malhar.

A obsessão pela forma perfeita está provocando uma revolução de consumo – calcula-se que o mercado de produtos e serviços para emagrecer esteja em torno de R$ 15 bilhões por ano. O Brasil só perde para o país mais rico do mundo, os Estados Unidos, no uso de adoçantes, no número de academias e de lipoaspiração – realizou 200 mil cirurgias do tipo em 2003, tem 7 mil academias e consome US$ 190 milhões em adoçantes por ano.

Quando o que está em jogo é perder peso, as pessoas não medem esforços, inclusive financeiros. ?Sem dúvida alguma, a obesidade é o mal que mobiliza mais gastos no Brasil?, afirma Giuseppe Repetto, presidente da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade. O maior volume de receitas é gerado pelo setor de alimentos. O Brasil consome hoje US$ 3 bilhões anuais em produtos light e diet, uma cifra que aumentou 870% nos últimos 10 anos, segundo dados da ACNielsen. E ainda há muito o que crescer. Veja o exemplo dos refrigerantes. Apenas 7,5% das bebidas vendidas são light ou diet. Até agora o maior avanço foi o dos iogurtes, que já abocanharam 20% da sua categoria.

Esse segmento só não é maior por uma questão de preço, pois os produtos na versão menos calórica custam o dobro dos tradicionais. Se depender da americana NutraSweet, isso vai durar pouco. A produtora de aspartame, que pertenceu à Monsanto até 2000, está aguardando a aprovação no Brasil de um adoçante revolucionário: o neotame. A substância tem o poder de adoçar 8 mil vezes mais que o açúcar. ?A grande vantagem do produto está na redução de custo. A indústria pode aumentar suas margens ou reduzir o preço final dos alimentos?, explica Daniela Conrado, gerente de negócios da NutraSweet. ?O produto já foi aprovado na maioria dos países ricos. A Anvisa deve dar o sinal verde em 2004.?

Emagrecer virou uma espécie de mantra no Brasil. E nem é preciso ter uma conta bancária gorda para ganhar um corpo escultural. Hoje em dia já há clínicas que cobram R$ 600 por uma cirurgia de lipoaspi-
ração. ?Vivemos a era da popularização desse tipo de operação?, diz André Staffa Filho, diretor-financeiro do Hospital São Luís. ?O problema é a falta de consciência. As pessoas não têm muito critério na hora de escolher o lugar e o profissional para retirar as gorduri-
nhas.? Das 400 mil cirurgias plásticas feitas no País, metade já é de lipoaspiração. Calcula-se que essa indústria movimente algo em torno de R$ 1 bilhão por ano. Para se ter uma idéia da importância desse mercado, o inventor da técnica, o francês Yves Illouz, vem ao Brasil pelo menos uma vez por ano para dar palestras sobre o assunto. ?Só existe um lugar para onde eu viajo mais que o Brasil: os Estados Unidos. Vou para lá três vezes por ano?, disse Illouz a DINHEIRO.

Os estrangeiros já perceberam: o Brasil é uma mina de ouro. Neste ano, uma das maiores redes de academia do mundo, a americana Gold?s Gym, com 638 unidades, vai abrir sua primeira franquia em São Paulo. Serão 36 academias até 2012 – um investimento total de US$ 36 milhões. A Gold?s Gym deve cobrar cerca de R$ 100 por mês de cada aluno. O desembarque da rede americana no Brasil é estratégico: o mercado de fitness local é um dos cinco maiores do planeta. Movimenta R$ 3 bilhões por ano, mas tem potencial para gerar cifras ainda maiores – apenas 2% dos brasileiros freqüentam academias, enquanto na Europa e nos EUA, esse porcentual já ultrapassou a barreira dos 10%. Recentemente, duas das maiores fabricantes de equipamentos de fitness anunciaram investimentos no País. Em 2003, a italiana TechnoGym montou em Manaus a sua primeira fábrica fora da Itália. Gastou R$ 3 milhões. A americana LifeFitness tem uma subsidiária no Brasil desde 1999 e planos de iniciar a produção local ainda neste ano. ?Não podíamos deixar de fabricar no Brasil. O País é visto pela matriz como uma área estratégica?, diz Augusto Lanzelotti, diretor-comercial da LifeFitness, que calcula investir cerca de R$ 10 milhões no novo projeto.

A vantagem é que os brasileiros não encaram a malhação como um sacrifício. Eles até são capazes de se divertir enquanto levantam peso ou pedalam numa bicicleta ergométrica. A Costa Cruzeiros é italiana, mas nunca cogitou vender um programa de ginástica a bordo de um transatlântico para europeus. ?Para eles, lazer e malhação não combinam. O cruzeiro fitness faz sucesso no Brasil há dez anos?, diz Francisco Ancona, consultor de marketing da Costa Cruzeiros. O programa já arrastou mais de 15 mil pessoas, que desembolsam, no mínimo, US$ 800 para ter direito a 7 dias de muito suor. São 24 professores a bordo e um cardápio de 125 aulas diferentes. ?Vamos trazer o maior transatlântico da companhia no próximo ano. Ele carrega 2400 passageiros, o dobro da capacidade atual.?

O motivo para emagrecer, em alguns casos, é estético. Mas há uma grande fatia da população que precisa perder peso para ganhar saúde. Trata-se do obeso mórbido, que tem quase o dobro do peso ideal. A indústria também está de olho nele. O número de cirurgias de redução do estômago triplicou nos últimos três anos, segundo a Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica. Estima-se que esse tipo de operação movimente R$ 30 milhões no Brasil. É um grão de areia perto do que ainda pode gerar. O País tem 1 milhão de obesos mórbidos, mas só realizou 13 mil cirurgias até hoje. Os EUA, país que tem mais de 10 milhões de pessoas nessa condição, operam 100 mil por ano.

Quem não está nessa situação extrema pode recorrer aos medicamentos. A indústria farmacêutica não poupa esforços em lançar remédios cada vez mais eficientes. A última grande invenção da categoria foi o Xenical, da suíça Roche. ?Ele é o único que não interfere no sistema nervoso central?, diz João Carlos Ferreira,
diretor da Roche. ?A droga elimina 30% da gordura ingerida em uma refeição.? A companhia levou 15 anos para desenvolvê-lo e gastou US$ 800 milhões. Deu resultado. A pílula está entre as 40 mais vendidas nos EUA. No Brasil, de cada quatro remédios anti-obesidade vendidos em 2003, um foi Xenical. O produto rendeu à filial uma receita de R$ 60 milhões no ano passado. Mas vem aí um rival à altura. A francesa Sanofi-Synthelabo está desenvolvendo uma pílula para emagrecer e parar de fumar ao mesmo tempo. A droga está na fase dos testes em humanos e a previsão é que esteja no mercado mundial no próximo ano. Até lá, trilhões de calorias e bilhões de dólares serão gastos em prol do peso ideal.

ABAIXO À GORDURA
A luta pelo peso ideal atrai o interesse de toda
a indústria, da farmacêutica à editorial

R$ 60 milhões
foi o volume de vendas do Xenical em 2003, segundo Ferreira, da Roche

120 mil livros
foram vendidos em 4 meses. O título ao lado
está na lista dos mais lidos no País

US$ 190 milhões
é quanto se consome em
adoçantes, segundo Daniela
Conrado, da NutraSweet

R$ 3 bilhões
é o que a indústria do fitness
fatura no Brasil. O País tem
sete mil academias