26/11/2020 - 8:42
Com uma rapidez inédita na história da medicina, diversas vacinas estão prestes a ver a luz um ano depois da detecção dos primeiros casos de covid-19, mas persistem as dúvidas científicas antes do início das campanhas de vacinação.
– Para quando?
Depois que foram anunciados neste mês resultados promissores de quatro projetos de vacinas – da aliança Pfizer/BioNTech, da Moderna, da AstraZeneca/Universidade de Oxford e do instituto russo Gamaleya -, muitos países começaram os preparativos para campanhas de vacinação, que devem começar após a autorização das autoridades de saúde.
A Agência Europeia dos Medicamentos (EMA) indicou à AFP na segunda-feira que as primeiras vacinas podem ser aprovadas no fim do ano, ou no início de 2021.
Este calendário coincide com os planos de países como Espanha, Itália e França, assim como de vários países da América Latina.
O México, por exemplo, poderia receber em dezembro as primeiras vacinas da Pfizer/BioNTech, e a Argentina planeja iniciar em janeiro a vacinação.
O Peru prevê a vacinação de 24,5 milhões de adultos antes de abril de 2021.
O governo dos Estados Unidos pretende ir mais rápido e começar a campanha em dezembro, assim que receber a aprovação da Agência de Alimentos e Medicamentos (FDA, na sigla em inglês).
As autoridades chinesas aprovaram o uso emergencial de algumas de suas vacinas.
Os prazos foram possíveis, graças à aceleração dos procedimentos de pesquisa, produção e avaliação, apoiados por financiamentos colossais, que reduziram o tempo médio de desenvolvimento e comercialização de uma vacina de dez anos para um.
Mas foram aplicados os “mesmos padrões regulatórios elevados de qualidade, segurança e eficácia”, segundo a EMA.
– Para quem? –
“Em um primeiro momento, a quantidade de vacina será limitada, e os profissionais de saúde, pessoas mais velhas e outros grupos de risco terão a prioridade”, afirmou o diretor da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus.
O acesso dos países pobres, que não têm os mesmos recursos financeiros nem logísticos que os ricos, pode resultar em um problema, sobretudo nos primeiros meses.
Em uma tentativa de garantir uma distribuição equitativa, a OMS criou a iniciativa Covax, que reúne governos cientistas, a sociedade civil e o setor privado.
A Covax permitiria, por exemplo, aos países participantes, como Japão e Reino Unido, fornecer doses aos países pobres por meio de seus acordos de compra com os fabricantes.
– Qual é a melhor?
É impossível saber qual das vacinas anunciadas até agora é melhor, pois nenhum laboratório publicou os detalhes científicos até o momento.
Todos os resultados se baseiam na última etapa dos testes clínicos, a fase 3, com dezenas de milhares de voluntários divididos em dois grupos: os que receberam a vacina e os que tomaram um placebo.
Os dados foram divulgados quando se atingiu um número determinado de pacientes com covid-19: 95, no caso da americana Moderna; 170, para a aliança teuto-americana Pfizer/BioNTech; 131, para o projeto europeu AstraZeneca/Oxford; e apenas 39, para o russo Gamaleya.
A Pfizer/BioNTech anunciou uma eficácia de 95%, entre 170 enfermos: oito pertenciam ao grupo vacinado, e 162, ao grupo placebo. Quase o mesmo para a Moderna, com 94,5% de eficácia (5/90). A vacina russa Sputnik V alcança 91,4%.
AstraZeneca e Oxford anunciaram uma eficácia média de 70%, segundo dois protocolos diferentes. O nível chegou a 90% entre os voluntários que primeiro receberam meia dose e, 30 dias depois, uma dose completa da vacina. O resultado caiu para 62% entre o grupo que foi vacinado com duas doses completas.
Mas a eficácia não é tudo: a vacina da AstraZeneca, por exemplo, é a mais barata (quase US$ 3 a dose), enquanto as da Moderna e Pfizer/BioNTech têm o inconveniente de precisarem do armazenamento a baixa temperatura (-20ºC a primeira, -70ºC, a segunda).
– O que resta saber?
Uma das questões mais importantes é saber durante quanto tempo as vacinas protegem, pois os resultados se baseiam em dados recuperados entre uma e duas semanas após a última injeção.
Também não se sabe se as vacinas são igualmente eficazes para os grupos de risco, como os idosos, mais suscetíveis a sofrer as formas graves da covid-19.
Outra questão pendente é determinar se a vacina impede a transmissão do vírus, além de reduzir a gravidade da doença entre os vacinados, o que seria determinante para frear a pandemia.
Finalmente, embora os testes não tenham revelado nenhum efeito colateral considerável, é necessário um “acompanhamento contínuo” para assegurar que “não acontecem efeitos indesejáveis excepcionais, porém mais graves em seu uso em larga escala”, de acordo com a doutora Penny Ward, da King’s College de Londres, citada pelo organismo Science Media Centre.
– Quantos projetos em curso? –
A OMS anunciou em 12 de novembro 48 projetos de vacina no mundo que são objeto de ensaios clínicos em humanos.
Onze estão na fase 3, incluindo os quatro já mencionados, assim como os das empresas chinesas Sinovac e Sinopharm.
A OMS contabiliza ainda 164 projetos de vacina em fase pré-clínica.
– Quantas técnicas? –
Por um lado, trabalha-se com produtos clássicos, que utilizam vírus “morto”: são as vacinas “inativas”, como as da Sinovac e Sinopharm.
Também existem as “subunitárias”, com base em proteínas, que ativam uma resposta imunológica.
Outras, chamadas de vetor viral, são mais inovadoras: se transforma e se adapta outro vírus para combater a covid-19, como nos casos da Universidade de Oxford e da Rússia, que utilizam adenovírus, uma família muito comum.
Moderna e BioNTech/Pfizer desenvolvem vacinas de “RNA mensageiro”, produtos inovadores que utilizam fragmentos de material genético modificado para ordenar às células os tipos de proteínas que devem produzir para combater o SARS-CoV-2.