O momento econômico não é dos melhores para as famílias brasileiras. Os recordes batidos pelos índices de endividamento só mostram que as taxas de juros altas devem levar à inadimplência de quem está tendo dificuldade de pagar as contas.

Na segunda-feira (29), o Banco Central informou que o endividamento das famílias chegou ao recorde de 52,8% em maio. Já no início do mês, a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), também atingiu o maior número, com  78% dos lares com dívidas a vencer em julho deste ano.

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Ainda segundo o BC, a taxa Selic – que representa os juros básicos da economia brasileira e influencia em todas as taxas de juros praticadas no país – passou de 2% ao ano, em janeiro de 2021, para 13,75% ao ano, em junho deste ano, sendo o maior patamar em seis anos.

Oferta de crédito

Diante de um cenário desfavorável para os brasileiros, o governo tem ampliado a oferta de crédito e microcrédito à população. Na semana passada, foi sancionada a lei que instituiu o Programa de Simplificação do Microcrédito Digital para Empreendedores (SIM Digital), no entanto, ainda depende da regulamentação pelo Ministério do Trabalho e Previdência. 

O programa será destinado a quem exerce alguma atividade produtiva ou prestação de serviço, de forma individual ou coletiva, e microempreendedores individuais (MEIs). A primeira linha de crédito será de até R$ 1,5 mil para pessoas físicas e R$ 4,5 mil para MEIs. As taxas de juros vão de 3,6% ao mês, com prazo máximo de 24 meses.

Há algumas semanas, o Banco do Brasil também lançou uma linha de crédito de até R$ 20 mil para compra de itens de mobilidade, como bicicletas, patinetes, scooters elétricas ou mecânicas e motos abaixo de 125 cilindradas. A taxa parte de 1,83% ao mês e o prazo máximo é de 60 meses.

Além disso, recentemente, o Ministro da Cidadania, Ronaldo Bento, afirmou que o empréstimo consignado para beneficiários do Auxílio Brasil deve ser liberado em setembro.

Vale a pena pegar empréstimo?

Com tantas ofertas de crédito, a pergunta que não quer calar é: vale a pena pegar empréstimo agora? De modo geral, a resposta, de acordo com os especialistas, é “não”. “A rigor, é bom tomar crédito quando os juros estão baixos ou caindo”, explica Luiz Rabi, economista da Serasa Experian.

Ele ressalta que crédito não vem “de graça, tem um preço”. “Mesmo que sejam linhas especiais, vai ter uma taxa que vai ser cobrada e sabemos que essas taxas estão subindo no Brasil. Então, do ponto de vista econômico, não estamos no melhor momento”.

Para Rabi, o ideal é esperar as taxas de juros caírem, o que só deve acontecer no segundo semestre do ano que vem, “quando espera-se que estejamos com uma inflação menor”.

Arthur Ridolfo, professor do Centro de Estudos em Microfinanças e Inclusão Financeira da FGV EAESP, concorda em esperar até o ano que vem, caso o crédito seja para consumo. “Não faz sentido nenhum. Melhor guardar dinheiro e poupar”, indica. 

Mesmo em casos de bens que não costumam ser comprados à vista, como automóveis e imóveis, o conselho de Ridolfo segue sendo o de esperar para assumir compromissos maiores. 

O coordenador do Instituto de Finanças da Fecap, Ahmed El Khatib, cita a alta da Selic como fator negativo ao contrair crédito. “Como essa taxa é levada em conta para calcular a taxa de juros dos empréstimos e outras operações, é esperado um aumento das taxas que são cobradas aos clientes no momento de realizar qualquer operação de crédito, muito embora esse efeito não seja percebido de imediato”, pontua.

Nem todos precisam esperar

Segundo Leandro dos Santos Maciel, professor de finanças da FEA-USP, de forma geral, a conjuntura econômica atual brasileira desincentiva os agentes ao endividamento, contudo, ele aponta alguns fatores particulares que podem alterar essa decisão. 

“Uma vez que alguns setores, mesmo em condições de retração econômica, conseguem apresentar um bom desempenho, e que compense, inclusive, custos de endividamento mais elevados”. 

Katib concorda que captar ou não captar um empréstimo depende muito da finalidade desse dinheiro, ou seja, se os recursos serão utilizados para custear algo essencial ou supérfluo. “Caso não se tenha escolha, é sempre recomendado recorrer a empréstimos pessoais, microcrédito ou consignado, que têm taxas, historicamente, muito menores”, indica.

Em caso de renegociação de dívida, Ridolfo reconhece que o crédito pode ser uma opção, desde que seja para conseguir melhores condições de pagamento. “Ao trocar a linha de crédito para pagar mais barato, você está trabalhando uma consequência” explica ele.

“Nesse caso, a pessoa já fez uma tomada de crédito ruim, e agora não está conseguindo pagar. Então ela troca uma dívida por outra, o que é melhor, pois usa um dinheiro ‘mais barato’”.

Outra situação que pode ser interessante a tomada de crédito é para microempreendedores que desejam investir. 

“O microcrédito, que é destinado a micronegócios, com a finalidade de não tapar buraco, nem corrigir desequilíbrios de caixa, deve ser usado para ampliação ou investimentos necessários, seja na abertura de novos negócios ou já existentes”, avalia Rabi. “Nesse caso, se existe uma lógica para usar, não existe melhor ou pior momento, vai depender da evolução do negócio”, conclui.