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algo errado no compartilhamento de vôos entre a Varig e a TAM. As tarifas subiram


 

 

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A compra da Garoto pela Nestlé vai concentrar o mercado. Somos contra

 

 

DINHEIRO ? Quais setores estão na mira do secretário de Direito Econômico?
DANIEL GOLDBERG ? No meu primeiro ano aqui, a prioridade foi construção civil. Investigamos a indústria de cimento e terminamos o ano com a instauração de processo administrativo contra 10 das maiores indústrias do setor, como a Votorantim, Camargo Corrêa e o Grupo Nassau. Em 2004 vamos centrar nossas investigações em infra-estrutura. Dedicaremos especial atenção à questão logística por causa da agenda macroeconômica do ministro Antônio Palocci.

DINHEIRO ? Temos informações de que a SDE estaria preparando uma devassa nos setores de portos e ferrovias. Confere?
GOLDBERG ? Temos seis casos em análise econômica específica de logística, mas estão todos sob sigilo. Há um grande gargalo de desenvolvimento sustentável do País na área de infra-estrutura. Ativamos um convênio com a Agência Nacional de Transportes Terrestres para identificar todos os casos nos quais o dono de uma ferrovia negou acesso a empresas que tentaram escoar a produção.

DINHEIRO ? O novo presidente da Anatel, Pedro Jaime Ziller, disse que não há concorrência na telefonia fixa. A Secretaria tem feito algo para fomentar a concorrência nesse setor?
GOLDBERG ? A proposta da Anatel para criar concorrência no setor passa pelo unbundling (interconexão de operadoras) e essa questão é da alçada da agência reguladora. O meu papel é dizer a uma operado-
ra que ela não pode negar o acesso à sua infra-estrutura a uma com-
petidora. O papel da Anatel é dizer a que preço. Meu ponto de vista é que há um largo mercado de voz regional desde que as autoridades de competição e as agências trabalhem juntas. A Anatel dizendo o que elas têm que fazer e a SDE dizendo o que não podem fazer.

DINHEIRO ? O Brasil está vivendo um boom de fusões. Mas elas só são analisadas depois que começam a operar. Há algo que a SDE possa fazer para reverter essa situação?
GOLDBERG ? O Cade e a SDE têm uma proposta para mudar esse ponto da lei brasileira. Vamos propor em breve ao Congresso que a fusão seja analisada antes, não depois. Assim, seremos mais efetivos.


DINHEIRO
? Afinal, qual o prejuízo que os cartéis causam ao consumidor brasileiro?
GOLDBERG ? Eu uso o exemplo de dois economistas que fizeram um estudo em 2 mil cartéis internacionais flagrados pelas autoridades. Eles separaram 16 cartéis possíveis de quantificar o prejuízo causado aos seus consumidores, como os setores de vitaminas e de eletrodos de grafite. Ao estudar as vendas desses produtos para os países em desenvolvimento, descobriu-se que o volume de comércio chegou a US$ 55 bilhões naquele ano, e que os prejuízos provocados pelos sobrepreços foram entre US$ 16 bilhões e US$ 32 bilhões. A última cifra é maior do que qualquer pacote aprovado pelo FMI em ajuda a países em desenvolvimento. Significa que esses cartéis internacionais faturam 30% a mais do que deveriam com as vendas de seus produtos a países em desenvolvimento.

DINHEIRO ? Empresários reclamam que não há fiscalização em diversos setores, como o de combustíveis. Essa deficiência do governo não se torna um incentivo para formação de cartel?
GOLDBERG ? É verdade que há pouca fiscalização, mas estamos firmando convênios com outros órgãos para amenizar o problema. Estamos conversando com a Receita Federal para lidar com os
casos de sonegação fiscal que geram efeitos sobre a concorrência. Mas o principal nós já fizemos, que foi montar o Centro de Inte-
ligência e equipar a SDE para se tornar uma agência investigativa. Estamos no caminho certo.

DINHEIRO ? O que mais a SDE fez de concreto no combate aos cartéis?
GOLDBERG ? Criamos duas diferentes frentes de atuação para percorrer o Brasil e desmontar os cartéis. Primeiro, uma agência investigativa, dentro da Secretaria, para ir às ruas e investigar os setores suspeitos. Temos autorização do judiciário para fazer buscas, apreensões e até interceptações telefônicas. Também trouxemos delegados da Polícia Federal para dentro da SDE e os treinamos para ajudar nos Estados. O segundo passo foi criar o programa de leniência, no qual negociamos a ajuda de quem está operando dentro do cartel em troca da redução da pena.

DINHEIRO ? Como funciona esse programa?
GOLDBERG ? É algo inédito no País. Assinamos o primeiro acordo, em outubro, com ex-integrantes de um suposto cartel no setor de vigilância privada do Rio Grande do Sul. Com a ajuda deles obtivemos documentos e informações que nos levaram a uma busca e apreensão simultâneas em seis estabelecimentos. De posse das informações e 11.400 documentos, foi possível instaurar um processo contra 21 empresas, três entidades e 30 pessoas físicas. Só nas empresas que fazem parte desse cartel o faturamento chegava a R$ 150 milhões por ano. A denúncia já está no Ministério Público. Atualmente estou negociando com membros de mais três cartéis diferentes.

DINHEIRO ? Como vai funcionar o prêmio que a SDE vai conceder às empresas que não participam de cartéis?
GOLDBERG ? No dia 1º de dezembro a SDE colocou em consulta pública uma portaria que cria o Plano de Incentivo à Elaboração de Programas de Prevenção de Infrações à Ordem Econômica. A idéia e emitir um certificado antitruste para empresas que cumprem a lei da concorrência. Obviamente criamos alguns critérios, dentre eles o de que a empresa não pode ter nenhuma pendência na Justiça nos últimos dois anos. Queremos criar uma cultura de concorrência e desestimular possíveis infrações à ordem econômica.

DINHEIRO ? Comenta-se que o sr. é contra a compra da Embratel pelo consórcio formado pela Telemar, Telefônica e Brasil Telecom.
É verdade?

GOLDBERG ? A SDE se envolveu na fase prévia à venda. Queremos ter certeza de que as três teles não estão tendo acesso a dados estratégicos da empresa. Há um showroom da MCI sendo organizado em Nova York. Quero ter certeza de que o evento será transparente. Mas são a Anatel e o Cade quem vão julgar se a lei permite ou não a compra da Embratel pelo suposto consórcio. Por enquanto, não vou me pronunciar sobre o mérito do assunto, até porque não vi nenhuma proposta concreta sobre a compra da Embratel.

DINHEIRO ? O compartilhamento de vôos entre Varig e TAM fez com que as tarifas das duas companhias ficassem iguais. Por outro lado, empresas que antes trabalhavam com tarifas menores, como Vasp e Gol, aumentaram seus preços. Há indícios de cartelização no setor aéreo?
GOLDBERG ? Quando foi anunciada a idéia da fusão as duas empresas fizeram um pedido para operar no code-share (compartilhamento) e o pedido foi deferido. Não há nada ilegal. Mas depois disso a SDE percebeu que há algo errado com a concorrência no setor. Há um sistema em operação que permite às empresas monitorarem on-line os preços das concorrentes. Isso facilita a convergência de tarifas. Não estou dizendo que há cartel ou conluio, mas há algo errado. Então chamamos a empresa norte-americana Airline Tariff Publising Company (ATPCO), que oferece o serviço, e assinamos um acordo que altera as regras do funcionamento do sistema de registro e divulgação de tarifas no mercado doméstico.

DINHEIRO ? É verdade que o sr. se opõe ao code-share caso a
fusão Varig-TAM não se efetive?

GOLDBERG ? Se as empresas resolverem ir adiante com a fusão, vamos analisar os impactos no mercado e autorizá-la ou não. Esse
é um cenário. Mas como há um aparente período de indecisão, estamos analisando os efeitos econômicos imediatos do code-share. Mesmo se elas resolverem não se fundir vamos usar esse tempo em que elas operaram em compartilhamento de vôos para fazer uma análise econômica dos impactos sobre o mercado. Isso deve ser finalizado nos próximos meses.

DINHEIRO ? Há muitas críticas de que o setor bancário estaria equalizando suas tarifas e serviços. A SDE vai atuar para incentivar maior concorrência no setor financeiro?
GOLDBERG ? Há um projeto tramitando na Câmara dos Deputados que vai permitir ao sistema brasileiro de defesa da concorrência analisar atos de concentração no sistema financeiro. Já negociamos os detalhes com o Banco Central. Mas não basta garantir a concorrência no setor. É preciso criar nichos de mercado onde a concorrência não existe. Temos um projeto ambicioso para evoluir o marco regulatório do setor bancário com vistas à redução do spreed. Em atuação conjunta com o Banco Central e Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda vamos tentar identificar os nichos onde a concorrência não é forte e remover obstáculos para que ela se desenvolva. Dois exemplos típicos são os cheques especiais e cartão de crédito, onde a mudança de um consumidor de uma instituição para outra é muito custosa do ponto de vista da informação. Hoje o consumidor não pode levar com ele o cadastro de bom pagador. Por isso a idéia é expandir o projeto da Central de Risco do Banco Central e torná-lo um cadastro positivo de informações que permita a redução do spreed bancário para pessoas físicas e jurídicas.

DINHEIROA compra da Garoto pela Nestlé está no Cade. Por
que a SDE é contra o negócio?

GOLDBERG – Achamos que pode ocorrer concentração excessiva
no mercado de chocolates em favor da Nestlé. Recomendamos a venda a outra empresa que não a própria Nestlé ou Kraft.
Queremos concorrência.

DINHEIRO ? A SDE apurou cartelização entre as siderúrgicas Gerdau, Belgo Mineira e Barra Mansa. Elas serão punidas?
GOLDBERG ? Houve uma disputa judicial depois de a Secretaria ter concluído o parecer. Uma das empresas investigadas impetrou dois mandados de segurança contra o envio do nosso trabalho ao Cade. Vencemos a disputa e pudemos enviar o relatório. O processo deve ser julgado a qualquer momento.

DINHEIRO ? A SDE denunciou meses atrás 20 laboratórios farmacêuticos que estariam boicotando a venda de genéricos no Brasil. O sr. adotou alguma medida para fomentar a concorrência no setor de medicamentos?
GOLDBERG ? Comprovamos a tentativa de boicote e enviamos o parecer ao Cade, que está analisando. Em outro front, estamos realizando parceria com o Ministério da Saúde e a Câmara de Regulação de Medicamentos. A idéia é adotar medidas no âmbito dos Conselhos Regionais de Medicina para estimular que os médicos prescrevam genéricos. Nos países que adotaram os genéricos com sucesso, como a Índia, o preço médio dos remédios caiu em até 40%.