O Vaticano confirmou nesta quarta-feira a abertura em poucos meses  dos arquivos relativos à ditadura militar na Argentina (1976-1983) por  vontade do papa Francisco, indicou o porta-voz da Santa Sé, padre  Federico Lombardi.

“Como já anunciado no passado, o papa Francisco manifestou seu desejo  de abrir para consulta os arquivos do Vaticano relativos à ditadura na  Argentina”, afirmou. (1976-1983).

Para isso, é necessário catalogar o material, explicou.

“O trabalho está sendo realizado e achamos que terminará nos próximos meses”, acrescentou Lombardi.

A abertura dos arquivos com cartas, relatórios da nunciatura,  testemunhos e documentos sobre esses anos obscuros da história da  Argentina fornecerá elementos importantes para esclarecer muitos casos  de desaparecidos.

Organizações humanitárias e, em particular, as Mães e Avós da Praça de Maio solicitaram ao Papa a autorização para tal medida.

A confirmação pelo Vaticano é anunciada na véspera do aniversário de  40 anos do golpe que deu início à sangrenta ditadura na Argentina, que  deixou 30.000 desaparecidos, de acordo com agências humanitárias.

O Vaticano disse que, para consultar tais arquivos, seria necessário  estabelecer “os prazos e condições, de acordo com a Conferência  Episcopal Argentina”, como é o caso de outros documentos históricos.

“Já começamos a responder a solicitações específicas sobre indivíduos  e casos judiciais (rogatória) e humanitários”, explicou Lombardi.

Trata-se de uma decisão de “importância histórica”, não só para a  Argentina, mas para toda a América Latina, afirma Luis Badilla,  especialista da Rádio Vaticano, ao ressaltar que servirá para posterior  reconstrução da história da região, abalada por golpes militares  sangrentos, iniciados no Brasil em 1964, e que terminou com a derrota,  em 1990, do referendo que forçou a saída do ditador chileno Augusto  Pinochet.

O papel que a Igreja Católica desempenhou em cada um desses países  foi muito diferente e é possível que a decisão de abrir os arquivos do  Vaticano se expanda para outros países.

De acordo com fontes da América Latina, os arquivos sobre a ditadura no Uruguai (1973-1985) também serão abertos.

O papa Francisco dedicou nesta quarta-feira, ao final da audiência  geral na Praça de São Pedro, um momento especial às mães dos  desaparecidos argentinos, beijando a testa de Françoise Tisseau, mãe da  francesa Marie Anne Erize Tisseau, desaparecida em 1976.

“Esse beijo é para todas as mães que sofreram com o desaparecimento de seus filhos”, afirmou Francisco.

O Papa argentino saudou com particular afeto a delegação de 10  pessoas, incluindo a mãe e os dois irmãos de Tisseau, que viajou a Roma  para depor na quinta-feira ante a justiça italiana que investiga o caso.

“Foi um momento muito emocionante, todos choramos”, contou à AFP Marie-Noelle.

A justiça italiana deve decidir se há provas suficientes para abrir  um processo contra o repressor Carlos Malatto, residente na Itália desde  2011, onde vive livremente, que foi denunciado pelo desaparecimento e  morte entre 1975 e 1977 de várias pessoas, incluindo da modelo  franco-argentina, que ajudava os argentinos a fugir para a França e se  exilar durante a ditadura.