Olhos postos na exuberante Mercedes DTM 2000, cujos 450 cavalos de potência o haviam alçado minutos antes à vitória nos 500 Quilômetros de Interlagos, o empresário Alcides Diniz voltou à infância na tarde do domingo 31. ?Dá vontade de levá-la para a cama, como a gente fazia com um brinquedo novo?, comparou. Tal qual Diniz, que aos 60 anos montou sua própria equipe de competições para participar de corridas de longa duração, presidentes de grandes companhias, executivos financeiros e homens de negócios de diferentes setores estão vestindo botas, macacão, luvas e capacete para reencontrar seus sonhos. Eles compram seus próprios carros, arregimentam seus próprios mecânicos e, bem, arriscam seus próprios pescoços pelo prazer de atingir velocidades próximas a 300 quilômetros por hora. São os gentlemen drivers, pilotos com cerca de 50 anos ou mais, disposição juvenil e dinheiro suficiente para bancar a diversão movida a gasolina verde. ?Um Porsche custa cinco mil reais por hora rodada na pista?, calcula o ex-presidente da Bolsa de Valores de São Paulo, Fernando Nabuco, chefe da equipe dos pilotos Antônio Carlos Canto Porto, o Totó do Banco Pactual, Fernando Trita, diretor do Unibanco, e Ricardo Etchenique, do clã fundador da Brastemp. Os quatro racham os custos do carro.

É no Campeonato Brasileiro de Endurance que esses pilotos velozes e poderosos medem suas forças. Já foram disputadas quatro provas e duas estão pela frente. Em Interlagos, nada menos que 53 carros alinharam para a largada. ?Temos um dos campeonatos mais concorridos do País?, diz Francisco Rosa, envolvido na organização das corridas. Presidente da Mitsubishi do Brasil, o empresário Eduardo Souza Ramos trouxe da Inglaterra um protótipo de 400 quilos e 200 cavalos de potência impulsionado por um motor de motocicleta Suzuki. Quem duvidou do carrinho se deu mal. Com valor estimado em US$ 40 mil, ele recebeu a bandeirada final em segundo lugar. ?Pilotei carros esportivos quando tinha meus 20 anos de idade?, recorda Souza Ramos, hoje com 48. ?Pensei que meu tempo houvesse passado, mas com esse monte de amigos voltando a correr, me animei e agora quero a ponta.? No box vizinho estava a postos seu colega de geração Flávio Andrade, presidente da companhia de tabaco Souza Cruz.

Dono de um protótipo com motor BMW de 250 cavalos, Andrade foi puxado para o esporte pelo tricampeão de Fórmula-1 Nelson Piquet. ?Há dois anos ele me ligou com uma convocação para eu correr os Mil Quilômetros de Brasília ao lado dele?, contou. ?Não deu para dizer não.? O executivo, cuja companhia patrocinou carros e pilotos de corrida até que a propaganda de cigarros em eventos esportivos fosse proibida por lei, já tinha a necessária prática. Nos anos 80 e 90 ele costumava guiar os carros bancados pela Souza Cruz depois do final das provas. Hoje, é um dos mais rápidos em pista. Venceu as Seis Horas de Fortaleza e cruzou fronteiras. Anos atrás correu as lendárias 24 Horas de Le Mans e 24 Horas de Daytona. ?Inesquecível?, resume. Marcos Moraes, presidente da Companhia Brasileira de Cartuchos (CBC), acelera um Porsche cujos custos ajuda a cobrir. ?Ao volante, encaro meus limites?, registra ele, de 62 anos.

Presidente do Conselho de Administração da Medley Genéricos, Xandy Negrão, 52, comanda um negócio que faturou no último ano US$ 140 milhões. Nos finais de semana, torna-se um dos pilotos mais velozes do País. Quando está ao lado dos velhos amigos, é um dos que mais se divertem nos boxes. ?Correr ao lado desse pessoal é uma delícia?, define. Na corrida, o Porsche Turbo de Negrão teve problemas, mas ele não perdeu o domingo. Ao final da tarde, deixou Interlagos pilotando um flamejante Jaguar XK 120, 1951, clássico vencedor de Le Mans, comprado de um colega na semana da corrida. Ex-controlador da Bombril, Ronaldo Ferreira também levou aos boxes uma atração especial. ?Comprei dos irmãos Fittipaldi. A reforma durou seis anos?, explicava diante da Mercedes 300 SL, 1955, também vitoriosa em Le Mans. Todo esse movimento atrai interesses milionários. Num camarote para 700 vips, a corrida foi assistida entre champanhe e almoço. No padock, a Mitsubishi disponibilizou 30 carros para voltas em uma pista de rally. No asfalto de Interlagos, a corrida de três horas e meia não teve incidentes. ?Nossa categoria nasceu sob o signo da vitória?, define o típico gentleman driver Totó, 58, do Pactual. ?Todos queremos ganhar mas, sobretudo, competir.?