A indústria de imóveis de luxo está em polvorosa.
Nunca tantas mansões estiveram à venda pelo País.
São casas, e muitas vezes apartamentos, que não saem por menos de R$ 3 milhões. Muitas são cotadas em dólares ou euros. O preço não assusta os interessados, gente do tipo que não se preocupa em demasia com o saldo bancário. Para muitos especialistas deste ramo, a hora é boa para bater o martelo. ?Existe uma superoferta de mansões, com ótimas oportunidades para os compradores?, diz Luiz Paulo Pompéia, diretor da Empresa Brasileira de Estudos de Patrimônio, a Embraesp. Levantamento feito por DINHEIRO encontrou casas espetaculares em oferta nas principais capitais brasileiras ? como São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Salvador. Juntas, elas somam R$ 58 milhões.

 

A Embraesp faz pesquisas periódicas dos lançamentos imobiliários em São Paulo. De acordo com um estudo da empresa, nos últimos quatro anos foram lançados 262 casas e apartamentos de alto luxo na capital paulista com preços a partir de US$ 1 milhão ? isso mesmo, um milhão de dólares ? o equivalente a R$ 3 milhões. Há vinte anos, esse número era nulo. A estatística não inclui os negócios com imóveis usados. Um aviso: esse mercado é discretíssimo. Os negócios, por serem elevados, acontecem longe dos holofotes. Os corretores que lidam com essa rica clientela se recusam a dar os nomes dos vendedores e dos compradores. Mas é, na verdade, um segredo de Polichinelo, dado o charme inescapável desse gênero de transação. Tanto o mercado quanto os vizinhos acabam sabendo quem está vendendo e quem está comprando. Embora a compra e venda de casas de luxo ocorra nos quatro cantos do País, o destaque fica mesmo com a capital paulista. ?O maior número de mansões à venda ainda está em São Paulo?, conta Fábio Pacheco, diretor da Rede Imobiliária Brasileira, que tem negócios em 31 cidades brasileiras, junto com corretoras locais.

Anos 50 e 70. Muitas das residências suntuosas à venda pelo Brasil foram construídas entre os anos 50 e 70, período de bonança e sem graves crises econômicas. Com o passar do tempo, o dinheiro mudou de mãos. A riqueza, antes exclusiva das famílias quatrocentonas e tradicionais, acabou migrando para empreendedores da indústria, das finanças e, mais recentemente, das novas tecnologias. São eles os atuais compradores das grandes mansões, construções antigas que demandam gastos com manutenção e modernização. Trata-se de um estilo que não existe mais ? e por isso atraem tanta atenção. São casas com pé-direito alto, quartos imensos e localizadas em terrenos com tamanho
semelhante ao de um campo de futebol.

 

Outras construções, mais recentes, incorporam à estética do passado o que há de mais moderno em termos de tecnologia e conforto. Como a do empresário Eduardo Souza Ramos, representante da Mitsubishi Motors no País. A casa, de 2.100 metros quadrados, ocupa um terreno de 3 mil metros quadrados, localizado em uma rua sem saída no bairro do Morumbi, um dos redutos dos milionários paulistanos. Só de IPTU são R$ 27 mil por ano. Além das quatro suítes e 12 vagas na garagem, o imóvel tem piscina, adega, pisos aquecidos, sala com home theater de última geração e até elevador. Mas o grande destaque está no subsolo: uma piscina semi-olímpica (de 25 metros), com aquecimento. O espaço conta ainda com vários aparelhos para musculação e ginástica, e uma jacuzzi, ideal para o relaxamento depois dos exercícios. Todo esse pacote de conforto está disponível a quem se dispuser a pagar R$ 13 milhões pelo imóvel, que aguarda o novo dono. O discreto Souza Ramos, o proprietário, continuará morando no bairro, mas em um condomínio de apartamentos de luxo, o mesmo para onde está indo o banqueiro Olavo Setubal, do Itaú – ele também com a casa à venda. Essa mesma trilha, do chão de uma residência para os andares de um prédio, será seguida pelo empresário Paulo Villares.

 

Eis o novo estilo de vida de quem deixa os casarões para trás, junto com as lembranças: a mudança para apartamentos luxuosos. ?Os empresários e os altos executivos já trabalham muito e querem se divertir em casa?, diz Marcelo Gurgel, da Gurgel do Amaral Consultoria de Imóveis. ?Daí o sucesso dos condomínios com estrutura de clube, com sauna, piscina, área de musculação e muitas garagens?. No Rio de Janeiro, o imóvel mais caro à venda atualmente é uma cobertura localizada na avenida Vieira Souto, em frente à praia de Ipanema. O apartamento, de 900 metros quadrados, é um projeto do arquiteto Sérgio Bernardes. O destaque é a piscina, de 4 metros por 7 metros e com fundo transparente, o que permite a passagem da luz, que ilumina a sala de estar. A sala de jantar foi construída num nível acima da sala, com vista para o mar. Preço: US$ 6 milhões, o equivalente a R$ 18 milhões. De acordo com Paulo Cezar Ximenes, diretor de vendas da Ximenes Empreendimentos Imobiliários, quinze interessados já visitaram a cobertura. ?Houve uma oferta menor do que o preço pedido, que foi recusada?, informa Ximenes. ?Mas a negociação continua.? O corretor se recusa a revelar o nome do proprietário, mas o mercado carioca dá como certo que o dono do apartamento é o empreiteiro paranaense Cecílio do Rego Almeida.

Mas por que, afinal de contas, os ricos estão deixando as casas de luxo em busca de edifícios ou condomínios fechados? A resposta: medo da violência. É um fenômeno nacional, que atinge todos os grandes centros urbanos. No Rio, o comediante Renato Aragão pôs uma placa de ?vende-se? em sua mansão no Recreio dos Bandeirantes, que serviu de locação para o filme O Cupido Trapalhão. A casa, avaliada em R$ 9 milhões, fica num terreno de 460 mil metros quadrados e tem heliponto, sauna, piscina, campo de futebol, cinco suítes e garagem coberta para dez carros. Em 1999, a casa foi invadida por quinze homens armados, que roubaram jóias e um carro do artista. No momento do assalto ele estava em São Paulo. ?Hoje, não há ninguém no Rio, por mais dinheiro que tenha, que seja louco o bastante para construir uma mansão fora de um condomínio fechado?, afirma o corretor carioca José Figueiredo. A tese é comprovada em outros Estados. ?As mansões localizadas à beira da lagoa da Pampulha estão pela metade do preço?, diz o emprei-
teiro mineiro Rubens Menin, diretor da MRV Engenharia. ?Em Belo Horizonte, quem tem dinheiro está indo morar em prédios ou em condomínios de casas de luxo.?

 

 

O mesmo clube. Com o aumento da procura por imóveis de luxo, as imobiliárias tiveram de se preparar para atender essa clientela especial. A Coelho da Fonseca, de São Paulo, criou um time de 14 corretores para cuidar do segmento de alta renda. Esses corretores, chamados de private brokers, têm clientes exclusivos e fazem do relacionamento a principal arma de venda. ?O nível social e econômico dos nossos corretores se equivale ao dos nossos clientes, o que facilita a venda?, diz Hamilton Rosa Junior, diretor comercial da Coelho da Fonseca. ?Eles freqüentam o mesmo clube, são vizinhos em São Paulo e, às vezes, na praia também.?

 febre das mansões também contagiou o mercado de casas de veraneio. Nesse ponto, levam vantagem os Estados litorâneos repletos de beleza natural, como os da região Nordeste. ?Estamos assistindo ao redescobrimento da Bahia?, afirma a corretora Josinha Pacheco, dona de uma imobiliária que leva o seu nome, em Salvador. Há trinta anos no mercado baiano, Josinha se especializou no segmento de luxo. Segundo ela, no ano passado foram vendidas, só com a intermediação de sua empresa, 90 mansões na Bahia, um crescimento de 30% sobre 2002. Pelas contas de Josinha, apenas nos cinco primeiros meses deste ano já foram vendidas 100 casas de luxo. ?Nunca tantos interessados buscaram casas na Bahia quanto agora?, diz Josinha. ?Além dos brasileiros, há muitos compradores europeus.? Entre as casas à venda na Bahia estão a do investidor israelense Montiel Roche. Projetado pelo baiano Marcos Barbosa, o imóvel fica às margens do Rio Joanes, próximo do encontro com o mar, e tem seis suítes, bar, baia para cavalos e ancoradouro para barcos. Para garantir o conforto e a comodidade, todos os cômodos têm ar-condicionado e acesso à internet. Preço: R$ 3,8 milhões.

 

Pedigree. O fenômeno da venda de casas de luxo também chegou à capital federal. Atualmente, há cerca de 25 mansões à venda em Brasília, todas por valores acima de R$ 3 milhões. A maioria está localizada em bairros nobres da cidade como Lago Sul, Lago Norte e Park Way, onde o terreno mínimo tem 5 mil metros quadrados. Uma das mais cobiçadas pertence ao empresário Osório Adriano, dono da Brasal Refrigerantes (engarrafadora da Coca-Cola em Brasília) e revendedor Volkswagen. A casa fica em uma chácara no Lago Sul, vizinha às mansões do senador Paulo Octávio e do ex-embaixador Paulo Tarso Flecha de Lima. Trata-se de um imóvel com pedigree, como dizem no mercado brasiliense. Construída pelo empreiteiro Wayne Faria, da Irfasa, a mesma construtora que ergueu o prédio do Banco Central, a casa possui seis suítes, escritório e biblioteca. O grande destaque é um salão de 110 metros quadrados, que foi palco de grandes eventos na capital organizados pela mulher de Faria, a socialite Elenita. O preço do imóvel ? R$ 3,5 milhões ? é considerado uma pechincha pelos especialistas do ramo.

?A crise econômica encheu o mercado de boas oportunidades. É hora de comprar?, afirma José Lírio Ponte Aguiar, o corretor dos poderosos da corte, que por nove anos teve procuração com plenos poderes de compra e venda de imóveis do casal Ruth e Fernando Henrique Cardoso. As piscinas espetaculares parecem refletir uma certeza: é um pedaço da economia que anda bem das pernas, em frenética movimentação. ?Apesar do grande volume de mansões em oferta, sempre há demanda para comprá-las?, diz Fábio Pacheco, da Rede Imobiliária Brasileira. ?Esse é um mercado onde a palavra crise não existe.?
Colaborou Thais Antonelli

ARQUITETURA DO MEDO
A violência criou um novo estilo, de muros e cercas

Uma nova tendência domina o estilo arquitetônico das casas brasileiras, principalmente as de luxo. Ela é formada por muros altos, guaritas blindadas, cercas elétricas e uma profusão de câmeras de vigilância. A motivação é clara: o medo da violência. Um levantamento realizado pela professora Teresa Pires do Rio Caldeira, em um trabalho para a Universidade da Califórnia, comprova essa tese. Seu trabalho mostra que o crescimento da criminalidade nos principais centros urbanos foi acompanhado do aumento do aparato de segurança das residências. A pesquisa virou livro com o sugestivo título Cidade de Muros.

Um exemplo desse estilo é a casa do banqueiro Edemar Cid Ferreira, do Banco Santos, no bairro do Morumbi, em São Paulo. São 4.100 metros quadrados de concreto, projeto do arquiteto Ruy Othake, numa obra estimada em R$ 50 milhões. Do alto, a construção lembra um museu de arte. De perto, se parece com um bunker. O arquiteto Roberto Migotto reconhece que a segurança é preocupação central. ?Certa vez um cliente resolveu instalar grades na casa toda, o que não estava no projeto?, diz Migotto. ?Ficou parecendo um presídio.?

 
O CAÇADOR DE CASAS
Corretor usa helicóptero para encontrar endereços de luxo

O corretor paulista Marcelo Gurgel do Amaral é um especialista em casas e apartamentos de luxo. Ele é lembrado pelos milionários tanto na hora de comprar quanto de vender imóveis, sejam residenciais, comerciais ou de lazer. Há 32 anos nesse mercado, Amaral desenvolveu algumas técnicas para descobrir boas oportunidades de negócios. Uma delas é usar helicóptero para encontrar os imóveis requisitados pelos seus clientes. ?Lá de cima consigo avaliar melhor a localização, o tamanho do terreno e até alguns aspectos da construção?, revela. Nem mesmo um acidente aéreo nos anos 70 o fez desistir dos vôos periódicos. A alternativa seria encarar o trânsito caótico de São Paulo. Quando tem de usar o carro, prefere rodar à noite e nos finais de semana, quando há pouco movimento. ?Meu tempo vale muito dinheiro e o trânsito é meu maior inimigo?, afirma Amaral. Sua regra número um: sigilo absoluto a respeito dos nomes dos proprietários.

DICAS DE MESTRE
Para comprar
? Procure casas mais caras do que pode pagar, pois o preço tende
a cair na negociação
? Visite o imóvel acompanhado de um arquiteto ou engenheiro

Para vender
? Não anuncie nem coloque placas na porta. Isso desvaloriza o patrimônio
? Garantir exclusividade a um corretor diminui a chance de venda

 

Colaborou: Thais Antonelli