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OLIVETTO No topo da sede da agência, a mais premiada do País, com verbas de R$ 107 mi em 2003

 

 

O primeiro sutiã a gente nunca esquece?. O bordão, criado em 1987 para uma campanha de televisão das lingeries Valisère, é a mais conhecida frase da história da propaganda no Brasil. No Google, a busca por ?o primeiro… a gente nunca esquece? remete a 106 mil respostas. Um levantamento informal feito em jornais e revistas indica que mais de 3 mil títulos e declarações de políticos e celebridades surfaram na onda deste achado. Ele tem um pai: Washington Olivetto, o primeiro popstar da publicidade no País. A paternidade, como num tardio exame de DNA, acaba de ser corrigida na página 208 do livro ?Na Toca dos Leões?, biografia da agência W/Brasil e de seus sócios fundadores, Olivetto, Javier Llussá Ciuret e Gabriel Zellmeister, que chega esta semana às livrarias (R$ 44,90, Editora Planeta). Como a primeira revelação a gente nunca esquece, cabe detalhá-la. A idéia de buscar a emoção de uma menina ao usar seu primeiro sutiã, sim, foi do publicitário, mas o roteiro do filme que chegou a ser escolhido como o melhor do mundo (pela Nippon Television, do Japão), descobre-se agora, foi de duas mulheres: Camila Franco e Rose Ferraz, redatoras que trabalhavam com Olivetto naquele tempo.

 

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Esta é uma entre dezenas de curiosidades do livro com a assinatura do escritor mineiro Fernando Morais, velho amigo de Olivetto, autor de clássicos da biografia como ?Olga? e ?Chatô?. São 383 páginas que retratam as disputas e polêmicas que marcaram a empresa desde sua fundação, em 1986, no bairro de Higienópolis, em São Paulo, onde ainda está instalada, na trilha de memoráveis campanhas, além de detalhes inéditos a respeito do seqüestro, em 2001, que o levou a ficar 54 dias no cativeiro. Um cálculo feito por Morais indica que, apenas em 2001, a agência produziu anúncios suficientes para encher 621 páginas inteiras de revistas e 195 páginas de jornal, 48 spots para rádio e 101 filmes para TV. As novidades pululam, mas o volume deve ser atravessado como um guia para entender como nascem e crescem as agências de publicidade, personagens cruciais das relações econômicas de hoje.

 

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“É um livro a respeito de pessoas, e não de anúncios” Fernando Morais, biógrafo da W/Brasil, de Olga Benário e Assis Chateaubriand

 

?Não é um livro de publicitário?, adverte Fernando Morais. O que é, então? Trata-se de uma minuciosa reportagem que ajuda a entender como o Golden Boy da publicidade, a alcunha de Olivetto, transformou criatividade em dinheiro. Em 2003, a W/Brasil movimentou verbas de mídia de R$ 107 milhões, o que a põe no 18º lugar entre as maiores agências do Brasil, de acordo com o ranking do Ibope Monitor. É uma posição ancorada, em boa parte, no magnetismo de Olivetto ? apesar da vitoriosa parceria com os sócios e funcionários da casa.

O publicitário teve uma ascensão relâmpago. Começou a trabalhar aos 18 anos e, aos 20, ganhou um dos mais reputados prêmios da propaganda: o cobiçado Leão de Ouro oferecido pelo Festival Internacional de Cannes. Em 1971, ano do prêmio, ele batia ponto na Lince Publicidade e o trabalho selecionado era apenas o primeiro filme de sua carreira (feito para a marca Deca, de produtos sanitários). Mas foi na DPZ de Roberto Dualibi, Francesc Petit e José Zaragoza, para onde se mudou em 1973, que Olivetto consolidou seu nome, fazendo dupla com o diretor de arte Petit. A respeito daquele período, Nizan Guanaes afirma no livro: ?Não se pode falar da DPZ sem falar de Washington Olivetto. O W era, na realidade, a quarta letra da DPZ. O Washington está para a propaganda como o João Gilberto está para a música brasileira.? Olivetto só deixaria a empresa 16 anos depois, para o vôo solo, quando tornou-se sócio da multinacional suíça GGK (sem pôr um tostão no negócio e ainda receber um gordo pró-labore) e fundou a W/GGK, para onde levou os dois amigos e futuros sócios quando a agência se tornou independente dos suíços.

As trajetórias de Gabriel Zellmeister e Javier Llussá, ressalve-se, renderiam roteiros de Holywood. Zellmeister é filho de imigrantes judeus fugidos da Alemanha nazista e, ainda na infância, perdeu o pai num acidente de carro e o irmão numa das guerras de Israel com os árabes. Llussá chegou ao Brasil ainda criança, fugindo da Guerra Civil Espanhola. De operário, passou a dono da fábrica de sorvetes Gelato, que deteve 30% do mercado nacional. Profissionais de alto calibre, mas reservados, encontraram em Olivetto ? sempre ?louco por um brilhareco?, como ele assume no livro – o sócio ideal para o papel de protagonista da história. Passados 19 anos, a agência da trinca ostenta hoje mais de 900 prêmios. Representam o reconhecimento a campanhas e personagens que marcaram o cotidiano dos brasileiros. Olivetto e sua agência foram responsáveis por alguns dos grandes momentos da publicidade (acompanhe, nos quadros abaixo, alguns instantes especiais narrados por Morais e selecionados por DINHEIRO). Nos reclames, a W/Brasil chegou a pôr o recatado empresário Antonio Ermírio de Moraes numa propaganda da Fiat. Contratou Bill Gates como garoto-propaganda e levou Paulo Maluf à TV para anunciar os calçados Vulcabrás. Até mesmo um cachorrinho da raça Dachshund ganhou notoriedade ao estrelar campanhas dos amortecedores Cofap. E aquele tipo de cão, é claro, passou a ser conhecido como ?aquele da Cofap?.

A criatividade, neste campo, é crucial, mas não é tudo. A W/Brasil inovou também em gestão e tecnologia. E criou muito polêmica, num passado recente, ao renunciar a clientes com verbas inferiores a US$ 2 milhões ? dispensando empresas como a Valisère, hoje de volta ao portfólio. Polêmicas, traições e segredos são o trunfo da obra de Morais. Foi, porém, a determinação de manter o princípio jornalístico do texto, para evitar a acusação de chapa-branca, que gerou reações de Olivetto ao livro. ?Ele me disse que sentiu desconforto com algumas declarações de antigos desafetos e ao descobrir novos dados sobre seu seqüestro, em 2001?, diz o escritor. Morais decidiu reservar as últimas 80 páginas ao drama pessoal vivido pelo publicitário no cativeiro, nas quais dá informações exclusivas apuradas com esmero (leia abaixo o trecho que mais incomodou Olivetto, ao descobrir que era vigiado 24 horas por dia). Ao saber do incômodo do publicitário à biografia, revelado por notas na imprensa, um amigo foi ao telefone: ?Olivetto, isso é marketing. Aposto que esse livro só tem elogios a você!? A resposta foi rápida, bem ao conhecido estilo pouco modesto do homem que virou marca: ?Se fosse para elogiar, eu faria muito melhor.?

TRECHOS DE “NA TOCA DOS LEÕES”

? o Garoto Bombril

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?A primeira campanha encomendada pela Bombril à nova agência não era para lã de aço, (…) mas para novos detergentes lava-louças (…) Tanto Washington quanto (Francesc) Petit tinham consciência de que (…) para falar com a nova mulher brasileira, tinha de ser alguém delicado, tímido e bem-humorado. Mas alguém que se dirigisse à consumidora com um respeitoso ?minha senhora?, como se fazia antigamente. (…) Tanto Petit quanto Washington se convenceram, ao verem os testes, que o Garoto acabara de nascer e já tinha nome: Carlos Moreno.?

? O pequeno Bill Gates
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?A glória viria em 2000 quando os telespectadores do horário nobre depararam com o bilionário americano Bill Gates (…) fazendo propaganda para o Unibanco (…) O homem mais rico do mundo tinha concedido cinco minutos. (…) Quando ele pôs os pés no estúdio os brasileiros gelaram: sem saber que o dono da Microsoft mede 1m78, eles haviam montado o estúdio para alguém de mais de 1m90 (…) Gates percebeu o desconforto da equipe e tomou a iniciativa: ?N

o problem, guys. Will there be a phone directory here, no?? (…) Mas para que ele queria uma lista? (…) para sentar em cima. Bastava empilhar alguns daqueles calhamaços sobre o assento da cadeira e pronto (..).?

? Democracia corintiana
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?A agitada atmosfera política que se respirava nas universidades, sindicatos e partidos acabaria chegando ao Corinthians. Do primeiro debate público sobre o movimento de renovação do clube (…) participaram Adilson, Washington e o atacante Sócrates, tendo como mediador o jornalista Juca Kfouri. Quando terminava o pingue-pongue entre platéia e mesa, Juca agradeceu a presença de todos: ?Estamos tendo o privilégio de ver nascer a democracia corintiana.? Washington ouviu aquilo, pegou um pedacinho de papel, escreveu ?Democracia Corintiana? e enfiou-o no bolso. Acabava de ser batizada a revolução que ia virar o Timão de ponta-cabeça.?

 

? Vinicius no Chevrolet
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?O poeta se animou com o convite para participar do anúncio e por telefone contou a Washington a razão do entusiasmo: ?Minha primeira trepada foi no banco de trás de um Chevrolet de meu pai?. Acertados os detalhes (como cachê, Vinicius pediu um Chevette zero km para Gesse, sua mulher na época), Was

 

hington não teve coragem de se oferecer como ghost-writer ao autor de Garota de Ipanema (…) Vinicius sugeria que o anúncio fosse intitulado ?Perdi minha virgindade num Chevrolet?, mas deixava uma alternativa: ?Se a GM achar a palavra virgindade pesada, use pureza.? A GM achou. Saiu ?pureza?.?

? Parceria com Petit
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??Fazíamos um trabalho muito bom, sempre com um lado inteligente de que tanto Washington quanto eu gostávamos?, lembra Petit. ?Fizemos, sem dúvida nenhuma, a melhor dupla que já teve nesse país. Foi muito legal.? Se alguém pedir a Petit um exemplo de bom anúncio criado por Washington ele vai escolher um comercial feito para a Olivetti: ?O comercial mostra uma moça linda, escrevendo uma carta, uma mensagem de Natal, e só no fim é que se descobre que o texto é de autoria de Fernando Pessoa?.?

 

? O terror do seqüestro
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?No teto havia uma entrada de ar e na parede ao lado da porta, perto do chão, um pequeno buraco de dez centímetros de diâmetro por onde o ar era sugado para fora, mantendo a circulação no interior do cativeiro. Ao lado da porta de entrada Washington viu um pequeno olho mágico, semelhante à lente de uma mini-câmera: era o visor através do qual ele passaria a ser vigiado 24 horas por dia. Só depois de libertado é que Washington soube que um segundo olho atrás mágico, instalado na parede oposta à porta de entrada, estava ali apenas para aterrorizá-lo ainda mais, já que não levava a nenhuma câmera ou monitor.?